Depressão pós-traição-Ballone, GJ - Depressão pós-traição, in. PsiqWeb, Psiquiatria Geral, disponível na Internet em http://www.psiqweb.med.br/, 2011
A traição conjugal tem sido uma das vivências mais importantes para a reação depressiva.
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Entre as vivencias capazes de desencadear reações depressivas
o conhecimento da traição é uma das mais fortes. Geralmente a pessoa
traída ou deixada pela outra se mobiliza fortemente pela frustração da
perda, pela constatação da mentira, pela deslealdade e, não menos, pelo
vexame e constrangimento social e familiar.
O sentimento mais imediato que a infidelidade provoca, no entanto, é
uma mistura de mágoa, contrariedade, ira, arrependimento, ânsia de
vingança ou revanche. Em geral, nessa fase de enorme frustração os
sentimentos não são bem definidos, alternando-se de um para outro, da
mágoa para a raiva, do arrependimento para a vingança, da sensação de
impotência para o desespero da reconquista. “Fiquei sem chão...”, “... meu mundo acabou”, são as expressões mais ouvidas nessas circunstâncias.
A descoberta da infidelidade pode ser uma das mais sofríveis e
devastadoras vivências. A constatação da deslealdade no relacionamento
causa um sofrimento proporcional à solidez da convicção prévia de que a
posse da pessoa era garantida. Nessas situações, mais importante que a
idéia do contacto físico da pessoa infiel com a outra é o sentimento de
decepção. Isso pode produzir um desencanto muitas vezes definitivo. Pode
até existir uma espécie de perdão... mas a desilusão, desapontamento e
decepção ficam.
Depois do estressante choque inicial a pessoa deverá passar para a
fase de adaptação. Essa fase, embora seja diferentemente vivenciada de
pessoa a pessoa, costuma ser bastante demorada. Do estresse inicial a
pessoa passa a apresentar um quadro francamente depressivo. Trata-se de
uma reação depressiva, diferente dos casos de depressão maior, de natureza biológica e constitucional.
No caso da depressão pós-traição a origem da depressão é vivencial, portanto, uma Reação Depressiva.
A sintomatologia é geralmente típica, como desinteresse, desânimo,
perda de prazer com as coisas, apatia, tristeza, irritabilidade. Pode
haver alteração do sono, do apetite e do peso.
A base da infidelidade é essencialmente multifatorial, mas um dos
fatores muito comum é o entorpecimento do relacionamento, comumente
referido como “desgaste da relação”. Sem dúvida, a
disponibilidade plena, a constância e a acomodação são os determinantes
importantes do entorpecimento da relação. Junto com isso, a crença de
que a outra pessoa “deve” suportar as adversidades geradas pelo sentimento da posse é um dos determinantes finais.
Mais uma grande responsável pela avassaladora decepção da pessoa traída é outra crença irremovível e natural no ser humano; a reciprocidade automática.
As pessoas costumam fazer para as outras aquilo que desejam para si
mesmas, como uma espécie de barganha obrigatória. A certeza de
reciprocidade é tão forte que acaba turvando a razão para outras
possibilidades, como por exemplo, os sentimentos íntimos da outra
pessoa, sua satisfação sobre o relacionamento, suas necessidades básicas
de afeição...
De fato a fórmula para um bom relacionamento não é uma receita
mágica, nem nova e nem misteriosa. Ela é muitíssimo conhecida e
universalmente propalada aos quatro cantos: o amor é uma construção
diária e precisa de cuidados constantes. Caso falte tal zelo, com o
tempo a atração e os sentimentos podem ser cobertos pelo pó do
dia-a-dia, tirando o brilho de todo relacionamento.
Assim, muitas vezes a vontade de viver ou reviver o sentimento
eloqüente do amor, juntamente com o propósito de resgatar uma
sexualidade prazerosa e esmaecida no cotidiano, acabam empurrando a
busca de tais necessidades em outra pessoa. O termo “necessidade” usado aqui é absolutamente preciso nesse contexto, e não são apenas essas duas carências, do amor e da sexualidade.
Existem outras necessidades mais pessoais ou mesmo universais para a
manutenção de um relacionamento sadio. Sentir-se uma pessoa admirada,
gostada, desejada, atraente e interessante são estímulos que falam muito
alto. A terceira outra pessoa pode ter muitas chances de conquistar se
agir assim.
Um dos grandes riscos de perder a relação é quando a pessoa nutre
sentimentos de ser ssempre e plenamente suficiente ao outro, quando
aposta que seus defeitos não são significativos ou, pior, que eles devem
ser afetuosamente suportados pelo outro em nome do amor. Essas pessoas,
quando traídas ou deixadas, promovem uma verdadeira revolução em suas
vidas e na maneira de ser, provando assim que a falta ou a
insignificância dos defeitos era uma fraude. Talvez, se tivessem
procedido as correções dos defeitos “que não tinham” antes da separação esta nem teria ocorrido.
O desgaste
A frustração, que é o sentimento causado por um desejo não plenamente satisfeito, é que motiva a Reação Depressiva. Essa dinâmica frustração-depressão
não é exclusiva dos casos de traição, evidentemente, e atualmente é a
justificativa mais aceita para a crescente incidência de quadros
depressivos. Seres humanos estão cada vez mais frustrados.
Pode haver também uma relação entre o cotidiano social atribulado e o
desgaste das relações interpessoais conjugais. De fato o cotidiano é,
sobretudo, ávido por nosso ser. Ele, o cotidiano, se apossa da pessoa
submetendo-a à tirania de “ter que”; ter que ir ao banco, ter
que comprar isso e aquilo, ter que responder e-mails, cumprir
compromissos, enfim, sempre se tem que fazer alguma coisa que acaba
distanciando uma pessoa da outra. Por sinal, devido a disponibilidade
total da outra pessoa, acredita-se erradamente que ela pode esperar
quando não se tem mais nada que fazer.
Neste panorama, é claro que se o casal não estiver atento a infindável sucessão de “ter que”
o cotidiano sugará toda energia necessária ao bom relacionamento. A
crueldade do cotidiano entorpece a pessoa impedindo-a de perceber a
outra como alguém que tem sentimentos, desejos, necessidades, sonhos,
sensibilidades.
As preocupações e temas das conversas giram quase exclusivamente em
torno do trabalho, da casa, empregada, filhos, problemas financeiros e
de saúde, dos parentes. Tudo isso parece não existir em relação à
terceira pessoa do fatídico triângulo.
No desgaste da relação muitas coisas verdadeiramente interessantes
não são ditas, as frustrações se transformam em cobranças, em irritação,
em desaforos dissimulados e o silêncio é capaz de machucar. O
relacionamento passa a ser aquela mesmice morna, e mesmo que seja
politicamente educado ele será sentimentalmente gelado.
Essa chatice do cotidiano de forma alguma é obrigatória, inexorável.
Ela aparece quando o dia-a-dia é mal gerenciado, quando as pessoas se
acomodam, se acovardam, amarelam, e piora muito quando há
desencantamento, desinteresse. Sem dúvida aqui se aplica o que a
psiquiatria recomenda para a existência saudável: a pessoa deve estar sempre inconformada e sempre adaptada.
Isso significa que por não estar conformada ela estará planejando algo
para seu amanhã ser melhor que o hoje. O fato de estar adaptada faz com
que ela não adoeça por causa do inconformismo.
Assim sendo, a pessoa não deve se conformar com as crises de mau
humor, com as irritações, grosserias, desleixos, descasos, negligências.
Caso a pessoa se conforme e desanime estará colaborando para o preparo
do fértil terreno da infidelidade.
A traição
A
traição pode ser conseqüência de tudo o que foi dito antes. De nada
adianta a pessoa ficar espantada, surpresa, abismada com a traição,
embora ocorra isso tudo fisiologica e inevitavelmente. A infidelidade
aparece naturalmente como conseqüência da perpetuação do erro e da
desesperança.
Para as pessoas que sempre citam comparações esdrúxulas dizendo que apenas o ser humano trai e não os animais, é
bom saber que, de fato, trair é uma condição humana por excelência.
Evitar isso implica na pessoa procurar entender o mais rápido possível
que está tendo um relacionamento com “uma pessoa humana”, portanto, com
alguém capaz de sentir, aspirar, desejar, se magoar e se comportar,
inclusive capaz de trair, como qualquer humano.
De qualquer forma é bom saber que a traição está longe de ser uma
fraqueza. Nem tampouco é um ato de coragem. Antes disso, é uma
conseqüência, uma atitude fortuita e muitas vezes desesperada de sentir a
vida, principalmente quando esta parece estar se esvaindo pelos vãos
dos dedos e não é mais encontrada junto da pessoa amada.
Em geral a traição reflete um verdadeiro descompasso afetivo entre o
casal. Além dos desgastes cotidianos do relacionamento, vistos acima, o
descompasso surge também quando um dos dois dirige quase toda a sua
energia para alguma coisa externa ao relacionamento, proporcionando ao
outro o sentimento de estar sendo deixado de lado. Isso é comum no homem
que se envolve demais com o trabalho ou na mulher com preferência
exclusiva aos filhos. Por outro lado, se os dois têm interesses na mesma
direção e na mesma intensidade, além de minimizar as possibilidades de
problemas, pode até solidificar mais a relação.
Autoestima baixa... o estopim
A
autoestima é o reflexo da valoração afetiva que a pessoa faz de si
mesma. Isso quer dizer que as oscilações do afeto, para mais ou para
menos, acabam fazendo a pessoa se sentir muito bem ou muito mal consigo
mesma. Às vezes o relacionamento não proporciona boa autoestima e, ao
contrário, pode até contribuir para a piora da mesma. Motivações
subterrâneas podem proporcionar atitudes pejorativas dissimuladas ou
falsamente amistosas, enfim, o resultado final desse comportamento
depreciativo é baixar a autoestima.
O ego da pessoa com baixa autoestima pode ter necessidades do se
afirmar “sobre o outro" ou, igualmente ruim, pode estimular a pessoa a
testar sua capacidade de sedução sobre outras pessoas. Surge uma
necessidade em se convencer ser desejável. O comportamento para testar
tais necessidades favorece a vulnerabilidade à traição.
Enfim, todas essas questões da intimidade emocional podem estimular a
aspiração de arranjar uma outra pessoa capaz de atender todos os
anseios, carências e necessidades. A opção de estar disponível para
outra pessoa pode nascer, crescer e assumir proporções perigosas quando
existe um desagradável sentimento de desvantagem existencial, quando a
pessoa experimenta a carência de se sentir admirada e a carência de
motivos para admirar, quando se sente preterida, deixada de lado,
excessivamente criticada e reprimida.
A necessidade de viver novos relacionamentos é forte quando a relação
atual não preenche as necessidades. Por conta da relação direta entre
autoestima baixa e vulnerabilidade à traição, um dos focos do tratamento
é no sentido de melhorar o estado afetivo. A abordagem terapêutica de
pacientes que procuram ajuda por viverem grandes conflitos
intrapsíquicos sobre a traição visa melhorar a autoestima.
Os melhores resultados são obtidos com a associação da
farmacoterapia, a base de antidepressivos, com a psicoterapia,
notadamente de natureza comportamental cognitiva. De certa forma, a
mesma abordagem terapêutica deve sesr dispensada à pessoa que pensa em
trair, que traiu ou que foi traída, pois, em todas elas a autoestima
pode estar absurdamente baixa.
Perfil das vítimas
Uma
conclusão interessante que se pode chegar durante a terapia de algumas
pessoas envolvidas pela traição é que quem traiu pode ser tão vítima
quanto quem foi traído. Talvez, se a pessoa que traiu fosse atendida em
suas necessidades afetivas básicas, nada teria acontecido.
Não há regras gerais nem generalizações, pois cada caso é um caso. Em
geral poucas pessoas se consideram simplesmente traidores. A maioria
reclama das faltas no relacionamento que levaram à busca de outras
formas de satisfação. Verdade ou não, e isso nem é tão importante, as
relações duradouras acabam proporcionando cobranças de um lado e apatia
do outro.
O cansaço crônico de algumas convivências duradouras e negligenciadas
favorece a idéia de que uma relação nova possa restabelecer a alegria
para a vida, uma autoestima mais sadia e o resgate do prazer. A pessoa
insatisfeita que procura situações mais agradáveis se depara algumas
vezes com a sensação de culpa, embora seja capaz de detectar as
necessidades internas que a levaram ao comportamento fugidio da relação.
A pessoa insatisfeita sabe o que está buscando e o que quer preencher
e, muitas vezes, a outra pessoa também sabe disso, embora faça de conta
que não sabe.
Se as condições que criam e mantém a frustração do relacionamento
continuam pode, de fato, acontecer a infidelidade. Assim, as pessoas
infiéis arriscam sem saber o que virá pela frente e muitas vezes agem
por impulso, não considerando os abalos que essa infidelidade pode
provocar no relacionamento e na vida do outro. Algumas vezes a traição é
um acontecimento automático que simplesmente vai acontecendo ao sabor
do tempo. Outras vezes é uma atitude racionalmente considerada e cujas
conseqüências foram consideradas preferíveis. Outras vezes ainda,
trata-se de um entorpecimento afetivo que distancia pessoas da
realidade, impulsionando-a por certa euforia de ter a possibilidade de
mudança de vida.
Geralmente é muito difícil acreditar em quem diz que “não sabia, não percebia nada”
e que a traição foi, de fato, totalmente uma surpresa. A postura de
inocência e de não percepção do que estava acontecendo não isenta o
traído de participação no evento, muito pelo contrário. Esse "eu não sabia de nada" pode
representar total falta de cuidado para com o relacionamento, falta de
interesse e atenção com o que se passa entre duas pessoas que dizem se
amar.
Talvez a pessoa traída estivesse tão inebriada por crenças sobre a
natureza pétrea de seu relacionamento que não seria capaz de ver o que
se passava em sua volta. Com incômoda freqüência vemos o traído como um
homem voltado para o trabalho, para o dinheiro ou para seu papel social
e, no caso da mulher, uma pessoa concentrada em sua vida pessoal,
doméstica e dos filhos. Homens e mulheres deixados, seja por traição ou
não, demoram a se adaptar ao ocorrido e geralmente não se conformam
nunca mais, embora reconheçam, depois de algum tempo, terem perdoado.
Essas pessoas costumam ficar revendo sistematicamente o passado em busca
de onde foi que erraram, do que poderia ter sido feito e não foi.
Algumas pessoas, como foi dito, se dizem perplexas por terem sido
pegas de surpresa, acreditando que estava tudo muito bem, que não havia
motivos para a separação ou traição, que não mereciam essa situação,
entretanto, quando desejam uma reaproximação ou reconquista, quase
sempre prometem as mesmas mudanças que antes teriam sido bastante
necessárias... Ora, se sabem o que é necessário mudar para
reconquistarem a pessoa amada, é porque sabem que isso tudo poderia ter
sido mudado antes. Em outras palavras, prometer mudanças significa que
as coisas não estavam tão bem assim e que não houve um acontecimento
totalmente inesperado.
O universo psíquico humano sempre recorreu ao auto-engano para alívio
dos grandes conflitos e complexos. Nessas situações de separação também
se recorre ao auto-engano, na maioria das vezes inconscientemente. Deve
ser enfatizado, mais uma vez, que as pessoas deixadas e que se sentem “perplexas por terem sido pegas de surpresa”,
na realidade talvez não tenham observado bem os indícios do que estava
para acontecer, tal como uma espécie de negação de fatos que não se quer
ver.
Parece que a falsa convicção de um relacionamento que se manteria
para todo o sempre entorpece a sensibilidade para com o outro.
Sexualmente considera-se que, em geral, a mulher tem atração pelo homem
que ama e este, por sua vez, ama a mulher que nele desperta atração. Por
isso, em geral, os homens temem que sua mulher faça sexo com outro
homem e as mulheres temem o envolvimento afetivo, ou seja, que seu homem
se apaixone por outra.
Nos casos onde a pessoa traída tem fortes traços obsessivos, ou seja,
tem tendência à preocupações excessivas, ruminação ansiosa de idéias,
vocação ao perfeccionismo, tendência ao planejamento obsessivo de tudo
na vida, logo, dificuldade em lidar com o plano B, que é motivada por
competitividade acentuada... nesses casos a traição pode desenvolver um
indelével e perene sentimento de mágoa e vingança.
O mito do relacionamento indissolúvel
Ao
se juntar pelo amor o casal estabelece, silenciosa e inconscientemente,
uma espécie de pacto ou trato que será a base para o futuro da vida a
dois. Geralmente esse trato inconsciente é o resultado de uma negociação
prévia e silenciosa desde os tempos de namoro, a qual vai se
cristalizando na medida em que as situações vão surgindo. Assim, o
namoro é a oportunidade para os parceiros expressarem as cláusulas desse
trato; suas expectativas, seus limites, seus valores, para
estabelecerem o que esperam do outro e o que não toleram dele.
Algumas vezes existem devaneios neste pacto, como por exemplo, o famoso "até que a morte os separe". Faltou acrescentar o termo igualmente fantasiado, "incondicionalmente". Aí sim o devaneio fica quase um delírio: "até que a morte os separe, incondicionalmente". Ora,
exceto as mães em relação aos seus filhos, os seres humanos não aceitam
absolutamente nada que tenha caráter incondicional.
É assim que, com honestidade, a pessoa deveria trazer para si a culpa
por suas próprias expectativas em relação ao outro. Não se sabe como
nem porquê um ser humano enamorado começa a imaginar que o outro deva
adivinhar exatamente o que é importante para ele. Não se sabe como nem
porquê esse mesmo ser humano constrói sua expectativa de felicidade
exclusivamente dependente da pessoa com quem escolheu compartilhar a
vida.
Geralmente a pessoa traída atribui a responsabilidade da traição ao
traidor, obviamente, enquanto o traidor quase sempre atribui a
responsabilidade pelo seu ato ao seu par, que vinha negligenciando o
relacionamento há tempos.
Algumas vezes o ato da pessoa que trai dividir a responsabilidade da traição com a pessoa traída é uma espécie de projeção
da responsabilidade. Melhor dizendo, isso não deixa de ser uma espécie
de autoengano. É o mesmo autoengano a que todos estamos sujeitos,
inconsciente ou hipocritamente, que é buscar fora de nós as
responsabilidades que deveriam ser nossas, em outras palavras, é
atribuir aos outros as responsabilidades que são nossas.
A desagradável sensação de ter sido vítima da ousadia da outra
pessoa, seja na traição ou separação, sempre convoca reflexões. Assim
como o relacionamento se inicia invariavelmente com a participação e
responsabilidade de duas pessoas, também a separação terá a participação
invariável dessas mesmas duas pessoas.
Abordagem e tratamento
A
idéia da co-participação do casal, ou da co-responsabilidade na
qualidade do relacionamento é uma idéia interessante e deve ser melhor
explorada nas terapias que fazem parte do tratamento dessa Reação Depressiva à
traição. Assim, a infidelidade deve ser abordada obrigatoriamente como
um problema do casal e não apenas daquele que traiu ou apenas de quem
sofreu a traição.
Se o casal procura ajuda porque está passando por um período
turbulento, ou seja, antes da infidelidade propriamente dita acontecer, a
atenção deve ser dirigida para a quase certa quebra do pacto que
existia entre o casal. Essa quebra do contrato pode dever-se a uma ou
ambas pessoas. Nesses casos uma pessoa ou as duas sentiram suas
expectativas frustradas, sentiram-se traídas no projeto amoroso,
independente da traição literal já ter acontecido ou não.
Não se pretende tratar a traição ou a separação, obviamente, pois
nada disso é doença. A psiquiatria e a psicologia são convocadas a
tratar as conseqüências emocionais desses episódios na vida do casal.
Algumas vezes, dependendo da intensidade do quadro depressivo decorrente
dessa vivencia traumática, será necessário o uso de antidepressivos,
porém, sempre em conjunto com a psicoterapia.
O fato da depressão ser de origem externa, nesses casos chamada de Depressão Reativa, não isenta o uso de antidepressivos, pois o sofrimento e a gravidade são tão significativos quanto da chamada Depressão Maior,
de origem biológica. Enquanto a medicação antidepressiva melhora o
ajustamento afetivo à vivência causadora, diminuindo assim a reação
vivencial depressiva, o tratamento psicoterápico deve discutir a
situação atual e as perspectivas futuras.
Aos casais que optam continuar o relacionamento a superação da
traição é a meta da terapia. O foco não deve se restringir apenas ao
perdão, uma vez que nem sempre a maior parcela da culpa é de quem traiu.
Superar a vivência significa ir além do perdão, significa virar a
página, e definitivamente. As lições decorrentes dessa vivência
traumática devem permanecer e cristalizar ainda mais o relacionamento.
Algumas pessoas insistem em dizer não terem feito absolutamente nada
que justificasse a traição ou separação da qual foram vítimas. Porém,
deve fazer parte do ficcioso “manual de abordagem terapêutica para traídos e traidores”
que nem sempre apenas as más atitudes resultam em desarmonias e
descontentamentos conjugais. As não-atitudes, a não-participação, a
apatia, descaso, desinteresse e até o silêncio também são formas de
agressão.
As pessoas podem ser sempre melhores para seus pares, diminuindo
assim as chances de perda do encantamento, ou seja, do relacionamento. E
tanto as pessoas podem ser melhores que aquelas deixadas produzem
grandes transformações em suas vidas depois do fim da relação: perdem o
peso excessivo, deixam de fumar, entram em academias, fazem
lipoaspiração, lifting, clareamento dos dentes, mudança de hábitos,
procuram tratar o ronco noturno, o mau humor. Embora tudo isso faça
parte do aresenal usado para melhorar a autoestima da pessoa que se
sente deixada ou traída, mostra também que tudo isso poderia ter sido
feito antes e ter melhorado o relacionamento agonizante.
Ballone, GJ - Depressão pós-traição, in. PsiqWeb, Psiquiatria Geral, disponível na Internet em http://www.psiqweb.med.br/, 2011
A relação conjugal diante da infidelidade: a perspectiva do homem infiel
I Mestrando em Psicologia Clínica (Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS/RS)
RESUMO
A infidelidade está presente em parte significativa dos relacionamentos amorosos e sempre causa algum impacto aos envolvidos. É considerada responsabilidade do traidor e o fim do relacionamento pelo seu caráter negativo e transgressor. Por isso, o objetivo desta investigação é compreender a percepção e os sentimentos que homens infiéis têm de sua relação oficial e as motivações para a traição. Trata-se de uma pesquisa qualitativa com delineamento descritivo. Participaram do estudo cinco homens heterossexuais que estiveram em união estável e foram infiéis durante este relacionamento. Utilizou-se uma entrevista semiestruturada para coletar os dados que foram submetidos posteriormente ao método de análise de conteúdo. Os resultados apontam que a infidelidade envolve questões individuais, como personalidade, crenças e transgeracionalidade e, conjugais, como os padrões de interação. Ela não encerra aquilo de que é porta-voz na relação, pois sua complexidade exige uma revisão do passado e do presente conjugal.
Palavras-chave: Infidelidade, Casamento, Relações conjugais, Dinâmica de casal.
ABSTRACT
Infidelity is present in significant part of love relationships, and it always causes some sort of impact on the people involved. The person who cheats is considered responsible for the end of the relationship, because of the negative and transgressor feature of the act. Therefore, the objective of this investigation is to comprehend unfaithful men’s perceptions and feelings concerning their official relationships, and possible motivations for cheating. It is a qualitative research with a descriptive study design. The participants were five heterosexual men who had stable relationships during which they had been unfaithful. Data collection used a semi-structured interview, posteriorly submitted to content analysis method. Results indicate that infidelity involves individual issues, such as personality, beliefs, and transgenerationality, as well as conjugal issues, such as interaction patterns. Infidelity does not put an end to what it unravels from the relationship, since its complexity demands a review of the conjugal past and present.
Keywords: Infidelity, Marriage, Marital relationships, Couple dynamics.
Introdução
A percepção de que as relações amorosas são líquidas, efêmeras, com validade preestabelecida, entre outras conotações que indicam sua brevidade e finitude, tornaram-se comuns (Falcke, Diehl & Wagner, 2002; Wagner & Mosmann, 2011). Nesse sentido, algumas pesquisas (Carpenedo & Koller, 2004; Duarte & Rocha-Coutinho, 2011; Féres-Carneiro, Ziviani & Magalhães, 2011; Ribeiro, 2010; Zordan & Strey, 2011; Zordan, Wagner, & Mosmann, 2012) apontam os impactos das transformações sociais e culturais, com ênfase na vigência do comportamento individualista, das mudanças no papel da mulher, entre outros fatores que contribuem para o enfraquecimento dos laços que mantém os parceiros unidos. Por outro lado, Féres-Carneiro (2003) afirma que as dissoluções conjugais não significam uma desvalorização do casamento. O fim da relação marital reflete também o nível de exigência dos cônjuges, esperando que ela cumpra com um papel importante em suas vidas e, consequentemente, proporcione satisfação.
De acordo com o panorama que os autores anteriormente citados apresentam acerca da conjugalidade, é possível compreender que qualquer relação amorosa exigirá, por si só, maturidade e investimento constante dos parceiros. Então, o que acontece quando em uma relação existe o agravante da infidelidade de um ou ambos os cônjuges? Será a frustração, diante das limitações da relação, motivo para que os parceiros não consigam permanecer em um relacionamento exclusivo? Segundo Mendonça (2009), a infidelidade ocorre dentro de muitos relacionamentos sem causar espanto para os envolvidos, devido aos indicativos de que o casamento já apresentava problemas. Para a autora, o modelo sistêmico percebe a infidelidade como um sintoma da relação conjugal e norma da cultura ocidental vigente machista, corroborando Goldenberg (2011) em sua compreensão de que a infidelidade não significa uma falha individual.
Quanto ao aspecto cultural, nota-se que normas bastante arraigadas socialmente fazem com que as pessoas construam para si mesmas uma constante insatisfação e carência por não conseguirem conciliar amor e sexo e, logo, sentem-se impossibilitadas de ter a verdadeira entrega com a vivência amorosa da intimidade e da cumplicidade (Gomes, 2009). Essa dissociação entre o sentimento e o desejo sexual estará associada a esses preceitos sociais, culminando por vezes na busca de sexo com outra pessoa que não o cônjuge? A esse respeito, Mendonça (2009) refere que uma compreensão antropológica da infidelidade mostra que o homem em união estável dissocia a mulher do lar, mãe de seus filhos, da mulher para fins do prazer sexual.
A infidelidade emerge como o principal motivo da dissolução conjugal (Zordan & Strey, 2011) e está entre os principais problemas enfrentados pelos casais na atualidade, principalmente, pelo número expressivo de pessoas que declaram ter sido infiéis em algum momento do seu relacionamento (Almeida, 2012; Goldenberg, 2006). Além disso, as pessoas julgam a infidelidade um comportamento negativo, considerando-a prejudicial aos relacionamentos conjugais (Viegas & Moreira, 2013). Essa percepção pode estar relacionada à concepção que se dá para o ato de trair e aos significados sociais que a infidelidade possui e que provocam sofrimento, principalmente, à pessoa traída.
A literatura aponta conceitos de infidelidade que variam, mas são homogêneos quanto à violação do contrato conjugal. A traição pode ser o envolvimento sexual ou emocional com uma pessoa, que não o parceiro oficial, sem que este saiba e consinta acerca do ocorrido (Glass, 2002), a “quebra da confiança e rompimento do acordo conjugal sobre a exclusividade sexual no relacionamento monogâmico” (Zampieri, 2004, p. 155), o rompimento de um contrato afetivo implícito ou explícito entre os parceiros, durante o casamento ou o namoro (Leal, 2005) e, ainda, o descumprimento de um acordo conjugal, que estava sustentado no amor, na estima e no respeito mútuo entre os parceiros conjugais (Pittman, 1994). Existe também a menção a dois principais tipos de infidelidade: a sexual, que acontece através do contato sexual expresso pelo beijo, toque íntimo, sexo oral ou quando se mantém qualquer carícia sexual, e a infidelidade emocional, que pressupõe a existência de uma conexão que se inicia através do flerte, de uma aproximação mais íntima, da troca de confidências e que evolui para um processo de apaixonamento por aquele ou aquela que poderá ser um amante (Ahrndt, 2005).
Ademais, a infidelidade é considerada um ato contra o casamento. Diante de uma traição se rompem os acordos conjugais, específicos para cada casal, variáveis segundo questões como cultura e condição social e que simbolizam alianças formadas para efetivar gradativamente o equilíbrio do casamento. É avaliada como um comportamento atípico, sinaliza problemas, é perigosa, pode destruir relacionamentos e, comumente, alimenta-se de segredos que serão ameaçados pela sua exposição (Pittman, 1994).
Por outro lado, o comportamento infiel representa um equívoco que poderá ser ressignificado a fim de que os parceiros permaneçam na relação (Pasini, 2010). Quando um casal se depara com um caso extraconjugal deverá ter consciência que conviver com a indecisão sobre permanecer ou não na relação provocará ainda mais sofrimento, e de que existirão duas possibilidades: separar-se ou perdoar. Se a segunda opção for escolhida será preciso ser tolerante ao tempo que a pessoa traída necessitará para superar a infidelidade. E, se o esforço conjugal para resgatar a relação for maior que a crise, haverá oportunidade para redefinir o contrato conjugal e estabelecer uma relação satisfatória com felicidade e intimidade (Almeida, 2007). No entanto, Rogozinski, Motta e Lobo (2010) salientam que um caso extraconjugal gera sentimentos de raiva, abandono e vitimização àquele que foi traído. Segundo os autores, nas situações de infidelidade, o nível de agressividade entre o casal é muito alto, a comunicação entre eles fica prejudicada e há um desequilíbrio no comportamento dos mesmos, que desafia até mesmo os profissionais mais experientes.
De acordo com Goldenberg (2011), é mais comum encontrar pessoas que já tiveram uma relação extraconjugal que pessoas fiéis e que, apesar da incidência de casos de infidelidade, tal fenômeno é considerado um problema grave e incabível até mesmo para aqueles que traem. Homens e mulheres têm sido significativamente infiéis, no entanto, mesmo que pareça paradoxal, a fidelidade prevalece como valor importantíssimo para todas as pessoas e, talvez isso ocorra exatamente por ela ser menos frequente e mais difícil de manter.
Nesse sentido, uma pesquisa realizada em 2005 na cidade de Salvador investigou a infidelidade sob a ótica de cinco psicoterapeutas de casal femininas sistêmicas com mais de quinze anos de experiência clínica. Os resultados apontam que a infidelidade se origina principalmente pelo vazio emocional sentido dentro do relacionamento oficial. Pode ser uma forma de os parceiros fugirem do estresse e de situações conjugais desagradáveis e não para buscar novas aventuras sexuais ou por desvios biológicos de ser monogâmico. O estudo aponta, ainda, que o cultivo de uma relação em que existe tolerância e flexibilidade, ao contrário da dependência emocional que causa insegurança e necessidade de investimento excessivo de um dos parceiros, são fatores protetores para uma relação permeada pela fidelidade. Esta última ocorrerá, essencialmente, quando a satisfação que os cônjuges sentem em alguma área do relacionamento, sexual, afetiva ou pessoal, supera o desejo de se aventurar intimamente fora do casamento (Leal, 2005).
No entanto, compreender os motivos que levaram um membro da relação a trair é uma empreitada complexa. Há contextos em que se analisa a responsabilidade que ambos os cônjuges possuem sobre o acontecimento, considerando que contribuem conjuntamente para a satisfação ou a insatisfação conjugal e a qualidade do relacionamento (Braz, Dessen & Silva, 2005). Além disso, a compreensão dos cônjuges sobre a relação se pauta, geralmente, nas influências familiares e sociais que tiveram na vida e que perpassam pelas questões religiosas e culturais de um povo (Prado, 2009; Viegas & Moreira, 2013). Por isso, é necessário que a infidelidade seja contextualizada à cultura de determinado grupo social e às experiências familiares de cada indivíduo para que a análise do fenômeno esteja congruente ao que se viveu naquele ambiente social e, como aponta Bucher-Maluschke (2008), à história e às memórias que aqueles indivíduos reproduzem como missão para manter vivos os conteúdos de determinado grupo familiar.
Percebe-se, também, que há diferenças na percepção que homens e mulheres têm da infidelidade. Para o sexo feminino o homem infiel é taxado sempre negativamente, diferente da percepção masculina sobre a mulher que trai (Tokumaru, et al. 2010). Tais diferenças, são apontadas também em uma investigação etnográfica que durou quatro meses e foi realizada através de entrevistas e observação participante em um clube de shows para mulheres no Rio de Janeiro. Os resultados revelaram que a mulher infiel omite ou justifica a traição devido ao sofrimento e as represálias das quais será alvo, enquanto o homem, mesmo na posição de infiel, é percebido socialmente de forma diferente. Além disso, os valores sociais rumam para situações cada vez mais complexas. Ao passo que a fidelidade ainda é supervalorizada entre todas as pessoas, almeja-se ter uma vida moderna, com independência, privacidade e novidades. De modo geral, a infidelidade ainda predomina entre os homens, talvez porque preceitos normativos tornam o fato mais aceitável entre o público masculino, já que a mulher é vista como fonte de prazer e o homem de dominação (Arent, 2009).
Uma pesquisa com 45 casais heterossexuais realizada em 2012 na cidade de São Paulo objetivou verificar se há relação entre o ciúme e a infidelidade, considerados os fenômenos mais conflituosos para o casamento. Os resultados apontam que a infidelidade de um dos parceiros está relacionada à infidelidade do outro, indicando um funcionamento muito semelhante entre os cônjuges e que, algumas vezes, a traição cometida por um pode ser explícita ou estar latente para o outro. Além disso, identificou-se uma relação direta entre o ciúme e a infidelidade, sendo o primeiro, positivo à relação quando em quantidade adequada e prejudicial quando em excesso, configurando uma profecia autorrealizadora da infidelidade. Por fim, percebe-se que para as participantes mulheres a infidelidade está associada à insatisfação com o parceiro e à busca por experiências emocionais, enquanto para os homens trata-se mais da saciação sexual (Almeida, 2012). A esse respeito, outros autores indicam que percepções que antes eram culturalmente associadas apenas a um dos sexos, atualmente transitam reciprocamente entre homens e mulheres (Gonçalves, 2010, Viegas & Moreira, 2013).
A infidelidade acontece cada vez com mais frequência (Pasini, 2010) acarreta polêmicas e desmorona o ideal de casamento perfeito, pois provoca tristeza, desapontamento e baixa autoestima aos envolvidos (Horta & Daspett, 2010). Além disso, pode ser um indicativo de que o sentimento que uniu os parceiros inicialmente não perdurou ao longo do tempo (Mendonça, 2009), ou se desgastou a ponto de a insatisfação conjugal prevalecer sobre o prazer de estar junto (Souza, Santos & Almeida, 2009). Por outro lado, a infidelidade nem sempre será negativa e indicará a ruptura do relacionamento (Pittman, 1994), servindo como um momento de crescimento e uma oportunidade criativa, mesmo com toda gama de sofrimento e de mudanças que provoca na vida dos parceiros (Pasini, 2010).
De acordo com Sattler (2010) um caso extraconjugal causa muita dor em ambos os cônjuges, o traído e o autor da traição. Porém, o manejo da situação exigirá do profissional de psicologia acolhimento, conhecimento acerca do contexto de infidelidade e uma avaliação sem moralismos ou preconceitos. Nesse sentido, será possível tratar a infidelidade e, se for o desejo dos atendidos, trabalhar na perspectiva de se continuar a relação. Prado (2009) corrobora essa perspectiva referindo que a infidelidade proporciona estabilidade para os casamentos, pois os relacionamentos extraconjugais evitam, muitas vezes, o divórcio. Podem funcionar como um fator de equilíbrio homeostático para os sistemas conjugais e/ou desencadear uma crise que oferecerá oportunidade para a mudança e o crescimento dos cônjuges.
Nesta perspectiva, o resultado de um estudo realizado na cidade de Belo Horizonte em 2010 com 864 pessoas heterossexuais, revelou que 51% dos homens e 27% das mulheres já foram infiéis ao cônjuge em algum momento e que o principal motivo apontado para o ato foi insatisfação com o relacionamento (Gonçalves, 2010). Apesar de o estudo apresentar apenas porcentagens gerais, é importante considerar que os resultados corroboram outras pesquisas (Arent, 2009; Goldenberg, 2006; Goldenberg, 2011; Neuman, 2010) que apontam a predominância da infidelidade entre os homens e a insatisfação conjugal como principal fator que leva à traição. Por outro lado, os dados podem sugerir questões de desejabilidade social através das quais se aceita melhor a infidelidade masculina e que homens historicamente traem mais que as mulheres, inclusive para provar sua virilidade entre o grupo de iguais.
Uma pesquisa norte-americana com duzentos homens heterossexuais confirma os resultados do estudo de Gonçalves (2010) quanto à infidelidade estar relacionada à insatisfação no casamento. A investigação analisou os principais fatores ligados com indicaram que 88% dos maridos acreditam que a infidelidade acontece devido a alguma insatisfação significativa no relacionamento conjugal. Além disso, o principal motivo para que ocorra uma relação extraconjugal, referido por 48% dos homens, é a insatisfação emocional com o casamento, sendo que 54% dessa insatisfação é representada por falta de reconhecimento, atenção, proximidade e cuidado por parte das esposas. A pesquisa apontou também que todos os maridos infiéis referiram amar suas esposas, arrepender-se de ter traído e não desejar repetir a infidelidade (Neuman, 2010).
Em outra perspectiva, Musleh (2010) refere que o surgimento de um terceiro membro na relação vivida até então a dois, configura a recontratação dos limites da relação conjugal, mudando a estrutura familiar tradicional e que, apesar das crises e conflitos, o desfecho pode ser a efetivação de um triângulo amoroso para suprir necessidades das três pessoas envolvidas. Além disso, Goldenberg (2011) declara que, conforme as pessoas envelhecem, aumenta o número de mulheres sozinhas, enquanto uma quantidade menor de homens, quase sempre casados, divide-se entre aquelas que buscam um marido.
Finalmente, percebe-se que autores (Almeida, 2007; Mendonça, 2009) e resultados de pesquisas (Gonçalves, 2010; Leal, 2005; Neuman, 2010; Souza, et al. 2009) apontam que a motivação principal para que ocorra a infidelidade são os sentimentos de insatisfação com a relação. Tais emoções refletem a inabilidade dos cônjuges em gerenciar os problemas que, com o passar do tempo, aumentam e desgastam cada vez mais a relação e os parceiros. Porém, a literatura não alude à repercussão da infidelidade na experiência íntima da pessoa que traiu.
Nota-se, também, a utilização predominante de métodos quantitativos para investigar a infidelidade obtendo-se resultados que levam a identificação, generalização e frequência com que o fenômeno ocorre. Percebe-se, inclusive, que os homens prevalecem sendo mais infiéis que as mulheres (Goldenberg, 2006; Goldenberg, 2011; Gonçalves, 2010; Neuman, 2010) e que a traição está entre os principais motivos da dissolução conjugal (Zordan & Strey, 2011). No entanto, compreender as razões que levam os homens a trair implica em ir além das respostas objetivas e analisar a percepção, os sentimentos e a reverberação do fenômeno na experiência pessoal desses indivíduos. Além disso, Neuman (2010) refere que para entender melhor porque alguns homens são infiéis em seus relacionamentos é necessário investigar em profundidade os próprios homens e ir além das medidas. Por esses motivos, o objetivo desta investigação é compreender a percepção e os sentimentos que homens infiéis têm de sua relação oficial e as motivações para a traição.
Método
Delineamento: trata-se de uma pesquisa qualitativa com delineamento descritivo. Adotou-se este, com o intuito de analisar a experiência e os significados que os participantes têm internalizado acerca do fenômeno estudado. Este delineamento possibilitará também priorizar o conteúdo emergente durante as entrevistas devido à flexibilidade possível neste método de investigação, considerando inclusive a implicação do pesquisador na análise dos dados (Turato, 2008). Por ser uma pesquisa com delineamento descritivo, indicará as categorias temáticas que emergiram das entrevistas, contextualizando-as através das falas dos participantes. Apresentar-se-á a interpretação dos relatos e os significados expressos nestes conteúdos e, ainda, a relação entre os resultados da análise, o fenômeno investigado e o contexto mais amplo de estudo sobre o tema (Cervo & Bervian, 2006).
Participantes: participaram do estudo cinco homens heterossexuais, caracterizados a seguir: E1, 23 anos de idade, vivendo em união estável há cinco anos e dois meses. O participante trabalha na área da saúde e está cursando o ensino superior. E1 referiu na entrevista que a traição aconteceu após o quarto ou quinto mês de relacionamento; E2, 30 anos de idade, vivendo em união estável há 13 anos. O respondente trabalha na área da segurança e possui ensino médio completo. Durante a entrevista referiu que a traição aconteceu no primeiro ano do atual relacionamento; E3, 29 anos de idade, solteiro, trabalha na área da saúde e possui ensino superior completo. E3 referiu na entrevista que a traição aconteceu por volta do oitavo mês de uma união estável que durou 12 meses; E4, 34 anos de idade, solteiro, trabalha na área de vendas e possui ensino médio completo. O respondente referiu que a traição aconteceu nos primeiros meses de uma relação que durou três anos e meio; E5, 35 anos de idade, vivendo em união estável há cinco anos. O participante trabalha na área da segurança e possui ensino superior incompleto. Referiu que o episódio de infidelidade aconteceu por volta do quinto ano da relação conjugal anterior que durou 11 anos.
Ressalta-se que os critérios de inclusão foram de que os participantes deveriam ser maiores de 18 anos, ter vivido em união estável pelo período mínimo de um ano e ter tido pelo menos um relacionamento extraconjugal durante a relação oficial. Não foram critérios os participantes permanecerem na relação onde houve a traição, o tempo que durou o caso extraconjugal ou questões como estado civil atual, escolaridade, profissão, ter ou não filhos.
Instrumentos: utilizou-se como instrumento de coleta de dados uma entrevista semiestruturada, formulada a partir dos principais pressupostos teóricos encontrados na literatura revisada associados à infidelidade. As questões norteadoras foram: a) Como era a relação conjugal oficial? b) Como era a vida profissional de cada um? c) Que atividades eram feitas socialmente enquanto casal? d) Como era a relação de cada parceiro com as famílias de origem? e) Que motivos levaram à traição? f) O que pensam sobre a infidelidade que aconteceu?
Procedimentos de coleta de dados: os participantes foram selecionados pelo critério de conveniência, sendo indicados por pessoas conhecidas dos pesquisadores. Após a indicação, foram contatados por telefone, informados dos objetivos do estudo e convidados a participar da pesquisa. Diante do aceite as entrevistas foram agendadas segundo a disponibilidade de cada participante e ocorreram em uma sala de atendimento da Clínica Escola de Psicologia à qual os pesquisadores estão vinculados. As entrevistas foram gravadas em áudio e tiveram duração aproximada de 40 minutos.
Procedimentos éticos: esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob o protocolo de número 27/11. Os participantes receberam uma cópia do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido que se leu a fim de reforçar questões como sigilo, preservação da identidade dos participantes e garantia de que os resultados do estudo seriam usados apenas para fins de pesquisa. Informou-se os participantes que a entrevista seria gravada em áudio e que após a análise das transcrições os arquivos seriam deletados. Por fim, avisou-se que eles poderiam desistir de participar da pesquisa sem nenhum prejuízo, sobre o risco de se sentirem mobilizados pelo conteúdo das entrevistas e sobre a contribuição que estariam dando à pesquisa científica sobre o tema.
Análise dos dados: as entrevistas foram transcritas com fidedignidade e os dados analisados à luz da perspectiva teórica sistêmica pelo método de análise de conteúdo proposto por Bauer (2008). Este método de análise compreende as seguintes etapas: a) Pré-análise: compreende a leitura flutuante do material, de modo que os pesquisadores conheçam os documentos e o texto, deixando-se invadir por impressões e orientações; b) Exploração do material: nesta etapa ocorre à administração sistemática das decisões tomadas, quer se trate de procedimentos aplicados manualmente ou não. Esta fase costuma caracterizar-se por ser longa e fastidiosa, porém consiste essencialmente de operações de codificação, desconto ou enumeração, em função de regras previamente formuladas; c) Tratamento dos resultados, inferência e interpretação: os resultados brutos são tratados de maneira a serem significativos e válidos, constituindo categorias temáticas para discussão.
Resultados e discussão
As informações coletadas nas entrevistas permitiram formular três categorias temáticas de análise: a) No começo era diferente: eu era fiel; b) Aspectos transgeracionais da infidelidade e c) Infidelidade masculina?
No começo era diferente: eu era fiel
Nesta primeira categoria se percebe que o entrosamento dos parceiros é diferente no começo da relação amorosa. Tal percepção corrobora Almeida, Rodrigues e Silva (2008), sobre a conjugalidade iniciar de maneira satisfatória, quando o prazer e investimento que envolve os cônjuges anulam a possibilidade de uma traição acontecer. Nessa fase do enamoramento e da paixão geralmente o casal não faz o movimento de mensurar o quão as diferenças existentes entre eles poderão ou não interferir no relacionamento em longo prazo, elas simplesmente não são consideradas importantes.
E1: No começo a relação era tranquila. Não tinha ciúme, não tinha briga, não tinha nada; E2: naquela época os dois estão mais flexíveis, os dois estão a fim da mesma coisa, então eles abrem mão das próprias coisas pra contentar o outro; E5: O início da relação foi perfeito dentro daquilo que nós esperávamos.
As sensações presentes na fase inicial da relação, enquanto predomina a paixão, o desejo de estar junto e o encantamento pelas qualidades do parceiro, podem interferir na percepção das diferenças, limitações, gostos e costumes do outro. A atração faz com que as pessoas não percebam as diferenças existentes, ignoram-se as frustrações, as angústias, o medo, a insegurança, entre a infidelidade masculina. Os resultados outros sentimentos, que são minimizados pelo prazer de estar junto (Matarazzo, 2008; Mendonça, 2009). No entanto, após a fase inicial do relacionamento, o casal deparar-se-á com outra realidade que começa na partilha de um mesmo espaço, das tarefas domésticas, contas, problemas com vizinhos e com as famílias de origem de cada um, entre outras coisas que vão desgastando a relação e transformando a percepção inicial que se tinha da vida a dois (Wagner & Mosmann, 2011). Dessa forma, percebe-se que mesmo quando o início da relação foi assertivo, os casais têm dificuldade de superar satisfatoriamente os percalços naturais da conjugalidade optando, muitas vezes, por caminhos mais curtos como a separação (Zordan & Strey, 2011) ou o envolvimento com uma terceira pessoa, que passa a habitar a relação dual.
Além disso, percebe-se que a maior parte dos entrevistados tem internalizado crenças distorcidas acerca das relações amorosas. Tal maneira de conceber a conjugalidade corrobora o que Falcke, Diehl e Wagner (2002) apontam sobre a crença que os casais têm de que precisam manter um sentimento duradouro e intenso, sentir-se plenamente satisfeitos e em comunhão de ideias sob todos os aspectos da conjugalidade, como a parceria/amizade, o sexo, as afinidades, os projetos em comum, as decisões que precisam ser tomadas a dois, a criação dos filhos, entre outras questões.
E1: Naquela época, se eu falasse pra ela, vamos em tal lugar, e ela dizia não eu ficava bravo, ou eu ia sozinho ou ficava os dois em casa e brigava, não se falava porque eu não conseguia aceitar as diferenças entendeu. E isso me levou a procurar o que eu não tinha em casa, eu procurava fora, entendeu. Queria uma guria que fosse companheira que eu dissesse, vamo em tal lugar, vamo! E3: Vira rotina, você ver todo dia, todo dia, todo dia, dava um ano e eu já não tinha tesão, já tinha feito tudo que tinha que fazer; E4: os dois estão juntos, tem aquela troca de carinho assim, mas é que na infidelidade assim quando a gente sai, essas trocas de carinho são mais intensas. E5: eu não queria que se apagasse aquela chama desse primeiro relacionamento, eu não queria que apagasse aquela chama de paixão, de desejo, de vontade, só que ela deixou de ter um pouco de atenção comigo.
A dificuldade dos participantes em lidar com a frustração pode estar relacionada às expectativas excessivas que eles têm em torno de uma conjugalidade ideal, nutrem sentimentos desconectados da realidade conjugal que, uma vez não saciados, tornam-se fatores que motivam à infidelidade. Além disso, o envolvimento dos entrevistados em relacionamentos extraconjugais pode ter sido também uma fuga da rotina. O risco que se corre nessas situações e de o caso ficar mais intenso e se configurar em uma ilusão romântica (Pasini, 2010), geralmente como consequência da necessidade do indivíduo suprir as suas expectativas frustradas relacionadas à sua relação conjugal que, pelo fator humano, não haveria como ser perfeita.
Percebe-se que os participantes demonstram dificuldades para gerenciar os momentos distintos do curso de uma relação conjugal. As consequências dessa dificuldade geram decepção, desilusão, distanciamento e carência afetiva, culminando numa gama de emoções confusas e no surgimento de lacunas que podem ter oportunizado a traição que cometeram. Os participantes referem situações como: E3: Não fiquei com ela, acabou não dando certo, eu me decepcionei, não era o que eu imaginava; E4: Por carência, bastante carência afetiva; E5: ela foi se apagando, ela já não se preocupava mais em estar sempre maquiada, ela não se preocupava mais em botar uma roupa mais sexy sabe. Todas as vezes que eu cometi o ato da traição foi por carência e solidão.
Através do relato dos entrevistados nota-se que o desinvestimento conjugal, em algumas situações, culminou em distanciamento afetivo e sexual. Nesse momento os parceiros ficam expostos e vulneráveis à investida de outras pessoas e surgem possibilidades para o novo, o diferente, que atrai, faz ressurgir sensações adormecidas, gera expectativa e engrandece a estima. Tal fato ameniza o descontentamento conjugal, desvia a atenção dos parceiros e impede um possível enfrentamento e resolução das dificuldades do casal. No entanto, o nível de expectativas elevado em torno da conjugalidade, o desinvestimento e as divergências entre os cônjuges foram considerados, nesta primeira categoria, como precipitadores da infidelidade. Porém, os aspectos transgeracionais e a clareza quanto à responsabilidade partilhada dentro de uma relação (Braz, Dessen & Silva, 2005), também são fatores fundamentais à compreensão do fenômeno investigado
Aspectos transgeracionais da infidelidade
Os aspectos transgeracionais da infidelidade apontam para repetições familiares através do comportamento de trair, para crenças machistas e patriarcais que legitimam a traição masculina e para a necessidade maior de sexo por parte do homem, fatores que contribuem para que aconteçam relações extraconjugais. Tais fatores corroboram a literatura sobre o tema (Arent, 2009; Bucher-Maluschke, 2008; Gonçalves, 2010; Prado, 2009; Tokumaru, et al. 2010) e instigam à reflexão sobre o que os homens pensam e sentem, e sobre como avaliam e percebem o comportamento masculino de trair, compreendendo-se efetivamente como é vivida a experiência masculina da infidelidade.
Os dados coletados nas entrevistas apontam que nas famílias dos participantes existiram infidelidades, geralmente associadas a algum membro da família vinculado ao participante. E2: pela parte do meu pai existe infidelidade até hoje na verdade; E4: do meu irmão mais velho, e quando eu era pequeno eu pensava que queria ser igual a ele; E5: na família dela teve, o pai dela teve uma amante por muitos anos e, inclusive, saiu de casa logo que nós nos unimos ele abandonou a casa dela e da mãe dela, pra se juntar com essa outra pessoa.
Percebe-se, pelos relatos dos participantes, que existe uma estrutura transgeracional moldando o funcionamento do indivíduo para o comportamento de ser infiel, seja através de delegações, lealdades ou segredos. Muitas vezes, de forma inconsciente, o sujeito repete o mesmo padrão de funcionamento familiar no seu relacionamento amoroso. Nesse sentido, mesmo quando um dos entrevistados demonstrou reprovar o comportamento transgressor de um dos membros de sua família de origem, a forma de resolução de conflito apreendida se repetiu sob nova configuração, como evidencia a fala de E3: Por isso que assim, durante muito tempo na minha vida eu fui fiel. Por causa da referência que eu tenho da minha casa, porque eu não vivo com meu pai, eu vivi a minha vida inteira com a minha mãe e as minhas duas irmãs. Então não foi um exemplo pra mim a traição de meu pai. Ele é cara muito tranquilo comigo, um cara muito descarado, só que quando tá casado continua descarado e trai a vontade e eu não.
Por isso, nas gerações em que se percebem as transmissões, as heranças poderão ser aceitas ou rejeitadas. Cada membro do novo casal possuirá uma memória familiar vinculada ao que foi vivenciado e transmitido na sua família de origem. Esse funcionamento poderá ser reproduzido para os filhos que terão a missão de manter vivos esses conteúdos familiares para outras gerações mesmo que ocorram transformações (Bucher-Maluschke, 2008). Por outro lado, os dados do estudo demonstraram que também é possível que as experiências e heranças familiares sejam ressignificadas, atingindo-se um equilíbrio entre a tendência à repetição e o desejo de construir uma trajetória diferente da vivida junto à família de origem.
Além disso, emergiram da análise dos dados, outros fatores transmitidos transgeracionalmente. Entre eles os aspectos sociais e as crenças que legitimam a traição masculina. Tais fatores constituem um contexto, predominantemente, machista e patriarcal que consolida a personalidade de meninos e meninas que, quando adultos, reproduzem em seus relacionamentos íntimos esse padrão de funcionamento, como revelam os seguintes entrevistados: E3: os caras mais velhos me falavam que a infidelidade masculina é diferente da feminina. Que na masculina o cara é infiel e sabe separar as coisas; E4: é muito pouco os homens que não traem, definitivamente dos homens que eu conheço assim, são muito poucos que não conseguem trair.
Outro elemento presente nas análises refere-se à necessidade sexual masculina, fator que pode contribuir para que o homem seja infiel. Para dois participantes a necessidade masculina de sexo é mais acentuada que a feminina e, por isso, sempre chegará um momento em que a parceira, segundo a percepção masculina, não dará conta de suprir as necessidades que o homem tem de sexo. Os entrevistados fazem alusão ao aspecto sexual referindo E3: Porque ele tem necessidade, não só amorosa, mas tem necessidades sexuais que a partir de um tempo, você não aguenta velho, você tem que ter uma, não ter uma amante, mas tem que dar um pulinho aqui, outro ali. O homem tem necessidades sexuais que uma mulher só não consegue satisfazer; E5: ela começou a deixar de ter um pouco de desejo, ela espontaneamente não me procurava, mas quando eu procurava tudo bem, foi espaçando cada vez mais a nossa vida sexual.
Os participantes expressam uma carência de sexo que pode estar associada com a necessidade masculina de transparecer virilidade, superação e potência principalmente no âmbito sexual. Esse discurso com conotação machista participa da constituição da identidade do menino que internalizará este legado e o reproduz, muitas vezes, a custa de sofrimento psíquico, para se afirmar frente aos seus. Esse resultado corrobora os estudos de Goldenberg (2006) sobre, os principais motivos pelos quais se comete a traição, estarem relacionados à própria natureza masculina, questões como atração, desejo, vontade, excitação e dificuldade de manter o controle frente às oportunidades.
Infidelidade masculina?
A infidelidade acontece por uma série de questões que envolvem o par marital e eventos esperados e inesperados do ciclo vital conjugal. Entre tais questões está a inabilidade em equilibrar a vida a dois e manter a individualidade, os desencontros e distanciamentos devido à falta de diálogo e comunicação assertiva, a responsabilidade partilhada dos conflitos conjugais e as oportunidades existentes nos ambientes profissionais, acadêmicos e sociais. Tais fatos, identificados neste estudo e confirmados pela literatura (Braz, Dessen & Silva, 2005; Féres-Carneiro, Ziviani & Magalhães, 2011; Pasini, 2010; Zordan & Strey, 2011; Zordan, Wagner, & Mosmann, 2012), podem ter desgastado a relação dos participantes, provocado sentimentos destrutivos que foram internalizados ao longo do tempo e contribuído para a ocorrência da infidelidade.
Um fator salientado pelos entrevistados que culminou em infidelidade foi a dificuldade de vivenciar a conjugalidade e manter a individualidade. Percebe-se que os participantes encerraram uma trajetória individual, cultivada até o momento em que se encontraram, e passaram a viver a união de forma fusionada. Com o passar do tempo, depois do período da paixão, passaram a sentir-se sufocados, desejando mais individualidade e liberdade, aspectos que podem estar associados à traição que cometeram: E3: a gente ia jantar assim com os amigos. Dificilmente fazíamos alguma coisa um sem o outro, não tinha nada; E4: no começo a gente até tinha mais vida social; E5: não tinha muito a individualidade; E1: Naquela época, se eu falasse pra ela, vamos em tal lugar, e ela dizia não eu ficava bravo, ou eu ia sozinho ou ficava os dois em casa e brigava.
Outro dado relevante refere-se às oportunidades proporcionadas por ambiente favorável, que também podem ter instigado o comportamento infiel. Os entrevistados mencionam o assédio que sofreram das mulheres no contexto onde estavam. E5: bate à carência, um pouco de desilusão, as pessoas também sentem aquela tua fragilidade e é nesse momento que a aproximação muda de uma amizade pra uma infidelidade; E1: era só eu de guri na sala, era só mulher e eu de homem, sempre tinha aquele assédio, aquela coisa, e eu não sabia controlar, se elas me assediavam eu ia; E4: é a confusão dos sentimentos, porque todo mundo entra na mente das pessoas onde tem lacunas. Segundo os relatos, a percepção de terceiros de que há algo no relacionamento oficial do homem que não vai bem se configura em uma oportunidade para trair. Além disso, as facilidades no ambiente de trabalho, no meio acadêmico, em festas e outros espaços sociais podem ter contribuído à infidelidade dos respondentes.
A traição, segundo Pasini (2010), inicia normalmente nos ambientes de trabalho, diante de oportunidades oriundas das relações diárias. Os dados desta pesquisa demonstraram que apesar de o momento também fazer o homem infiel, a traição só se concretizará se a relação oficial estiver em crise, corroborando outras pesquisas (Gonçalves, 2010; Leal, 2005; Neuman, 2010; Souza, Santos & Almeida, 2009) que apontam que a insatisfação conjugal está entre os principais motivos da infidelidade. Nesse sentido, um relacionamento em que o projeto de vida conjugal está edificado de maneira sólida, pautado na escolha mútua, no desejo compartilhado e no qual prevalecem os sentimentos de amor, não haverá oportunidades para a entrada de uma terceira pessoa e para a ocorrência de aventuras efêmeras (Mendonça, 2009). Não se trata de uma tarefa fácil, é preciso perseverar frente aos desafios da vida conjugal (Gomes, 2009) e não desviar o foco pela simples existência de ocasião propícia ao comportamento de trair.
Todos os participantes referiram categoricamente que compreendem a infidelidade como uma questão negativa, que destrói a relação e gera sentimentos de arrependimento e culpa que perduram por muito tempo, confirmando os pressupostos teóricos de alguns autores (Horta & Daspett, 2010; Pittman, 1994; Viegas & Moreira, 2013). Segundo os respondentes a experiência provoca sentimentos ruins, mas também serve para que se tenha clareza de que a opção de trair não foi a melhor para que a relação conjugal voltasse a ser satisfatória. Quando questionados sobre como se sentiam e o que pensavam sobre a traição cometida, alguns participantes relataram: E1: A traição não valeu a pena. A infidelidade que eu tive não me acrescentou em nada; E2: Na maior parte do tempo eu me arrependo. Eu penso naquilo que eu fiz antes lá e bate um profundo arrependimento; E4: No dia que eu traí ela eu pensei em mudar.
Percebe-se, através dos relatos, que as consequências da traição repercutiram intensamente nos envolvidos que se questionaram sobre os motivos da infidelidade e tentaram gerenciar o sentimento de arrependimento e o desejo de mudar o comportamento transgressor. Na mesma direção em que a literatura aponta (Almeida, 2007; Pasini, 2010) a reverberação da infidelidade na experiência pessoal dos participantes gerou reflexões e, mesmo para aqueles que não permaneceram na relação onde houve a traição, foi possível perceber transformações na percepção que tinham do fenômeno em questão.
Considerações finais
O objetivo deste artigo foi compreender a percepção e os sentimentos que homens infiéis têm de sua relação oficial e as motivações para a traição. Considera-se, a partir da análise realizada, que a infidelidade masculina está imersa num universo relacional que subjetiva homens e mulheres no ciclo de desenvolvimento familiar. Tal subjetivação ocorre de forma imperceptível, pois faz parte de um cotidiano cultural permeado por crenças que retroalimentam sentimentos, atitudes e verbalizações que se repetem de geração em geração. Cabe ressaltar que a infidelidade não se encerra em si mesma, para compreendê-la é necessário investigar todo o percurso conjugal que a antecedeu, inclusive, a vida dos cônjuges envolvidos no que diz respeito às crenças internalizadas que influenciam a forma como os parceiros se relacionam.
Ademais, a infidelidade é um acontecimento que desafia a conjugalidade e possibilita, muitas vezes, reconhecer que determinada relação já cumpriu com aquilo que deveria na vida dos parceiros. No começo da relação, ser fiel apresenta-se como uma tarefa natural para os cônjuges que se sentem envolvidos com o que caracteriza o início de um novo projeto de vida. No entanto, com a convivência conjugal, os aspectos transgeracionais apreendidos e internalizados são facilmente repetidos na tentativa de resolução de conflitos, angústias e desejos não satisfeitos. Por isso, a complexidade que envolve a infidelidade conjugal exige uma análise criteriosa dos padrões relacionais vivenciados pela díade no relacionamento atual, assim como a relação com suas famílias de origem. Tal análise poderá propiciar ao casal e ao indivíduo o entendimento sobre os condicionantes da história de vida que interferem no comportamento e na percepção de mundo de ambos.
Nesta perspectiva, compreender-se e, sobretudo, aceitar-se, permite ao sujeito viver com mais leveza e tranquilidade, com a possibilidade de reavaliar atitudes, comportamentos e sentimentos. Além disso, a postura acolhedora, a empatia e o conhecimento sobre a infidelidade são fundamentais aos terapeutas de casal e família. A avaliação e intervenção desses profissionais podem interferir no desfecho de um atendimento envolvendo questões de traição. Nesse sentido, a reflexão adequada no contexto terapêutico pode contribuir a resolução do conflito e, consequentemente, à qualidade de vida pessoal, conjugal e familiar dos atendidos e das futuras gerações que se desenvolverão em um contexto social reflexivo e funcional.
Finalmente, o tema proposto se configura numa problemática que contempla aspectos multifatoriais para seu entendimento. Nesse sentido, este estudo esteve limitado à compreensão de um fenômeno complexo na perspectiva restrita de homens de determinado grupo social e cultural. Além disso, a presente pesquisa não apresenta resultados inovadores no que se refere a temática da infidelidade, porém, aponta a necessidade de se desenvolver outras pesquisas. Recomenda-se que estudos futuros priorizem o método qualitativo e, através de grupos focais e diferentes métodos de análise, investiguem especificidades próprias de algumas culturas, realidades sociais, características de personalidade dos sujeitos e padrões relacionais do par conjugal, contribuindo ao conhecimento científico sobre a infidelidade e fornecendo subsídios para o trabalho com casais e famílias.
Referências
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Endereço para correspondência
Crístofer Batista da Costa
E-mail: cristoferbatistadacosta@gmail.com
Crístofer Batista da Costa
E-mail: cristoferbatistadacosta@gmail.com
Cláudia Mara Bosetto Cenci
E-mail: claudia.cenci@imed.edu.br
E-mail: claudia.cenci@imed.edu.br
Enviado em: 04/02/2014
1ª revisão em: 26/05/2014
Aceito em: 16/06/2014
1ª revisão em: 26/05/2014
Aceito em: 16/06/2014
ENTENDENDO A INFIDELIDADE FEMININA
Freud explica, nós ensinamos!
Entendendo a infidelidade feminina
Matéria
retirada do portal Ciência e Vida no dia 03/02/2014 às 12:51:
http://psiquecienciaevida.uol.com.br/ESPS/Edicoes/88/artigo290642-1.asp
por: Roberta Medeiros
As
transformações sociais ocorridas nas últimas décadas abriram uma brecha
para que algumas mulheres, sobretudo as que pertencem às gerações mais
jovens, começassem a tomar para si o “direito” de trair por desejo
Segundo o dicionário Aurélio Buarque de Hollanda,
traição é também perfídia, deslealdade, infidelidade no amor; é
enganar, atraiçoar, denunciar, delatar, ser infiel. Em outras palavras, é
o descumprimento de um acordo sem que o outro tenha conhecimento disso.
E por mais condenável que a traição seja aos nossos olhos, não há quem
nunca tenha cometido esse deslize em algum momento da vida. Ou, na
melhor das hipóteses, acalentamos secretamente o desejo de trair.
Você já
foi infiel? Já desejou ser infiel? Ou manteve uma relação com um homem
casado? A pergunta foi respondida por um grupo de 166 mulheres da classe
média carioca, e elas responderam em uníssono: a maioria disse que sim.
A pesquisa feita pela antropóloga Olívia von der Weid ainda revelou
outros dados, mostra que as mulheres encaram o adultério de diferentes
formas, variando de acordo com a condição afetiva de cada uma delas.
Abaixo dos 30 anos, por exemplo, a infidelidade é superior à média, e
chega a 60% nas mulheres com até 20 anos.
Tudo
indica que algumas mudanças começam a se delinear no horizonte. Parece
que as transformações sociais ocorridas nas últimas décadas abriram uma
brecha para que algumas mulheres, sobretudo as que pertencem às gerações
mais jovens, começassem a tomar para si o “direito” de trair por desejo
e não somente por retaliação, como normalmente elas justificavam a
infidelidade. Há quem afirme que tais transformações permitiram uma
virada feminina, contrariando inclusive algumas doutrinas que tratavam
de explicar a traição sob o prisma das ciências naturais.
Ciência explica?
De acordo com algumas teses inspiradas na teoria do evolucionista britânico Charles Darwin (1809-1882) acerca da seleção natural, a natureza teria determinado que as mulheres fossem mais seletivas, fiéis e zelosas com a prole, enquanto os homens menos rigorosos e mais inclinados a buscar várias parceiras, tendo um mecanismo capaz de rastrear os odores sexuais, além de energia para combater possíveis rivais e fertilizar o maior número possível. Em outras palavras, os homens estariam preparados biologicamente para trair; e as mulheres, para serem dedicadas.
Tais
ideias têm sido sustentadas por muita gente, sobretudo por biólogos, na
tentativa de explicar a evolução da raça humana. Segundo essa abordagem,
nosso comportamento sexual seria guiado por certos mecanismos
biológicos envolvidos com o desejo sexual, e eles estariam programados
para trabalhar a favor da manutenção da espécie. É estranho falar dessa
maneira, porque somos mais do que aves ou chimpanzés, mas essa teoria
ainda é explorada – e o campo de estudo da Psicologia Evolutiva chama
esses mecanismos envolvidos na reprodução e cuidados com a prole de
investimento parental.
Por esse
prisma, fica mais fácil de entender porque dizem que a traição é
encarada de formas distintas entre os sexos. Para a mulher, a
infidelidade no campo afetivo seria mais ameaçadora do que no campo
sexual, já que ela busca um parceiro constante para dividir cuidados com
os filhos. “Um homem produz um número milionário de espermatozóides e
não está sujeito a ciclos biológicos, se não os descarrega sofre as
consequências; uma mulher responde a ciclos e nasce com um número certo
de óvulos que conduzem sua vida e que se impõem a ela. A fidelidade
única e verdadeira é a da natureza”, argumenta o psicanalista Osmar
Oliveira.
Por outro
lado, há estudos recentes que endossam as bases biológicas para a
infidelidade feminina. Neste sentido, a traição seria resultado de uma
programação genética e biológica. O pesquisador Tim Spector, da Unidade
de Pesquisa de Gêmeos do St.Thomas Hospital, concluiu que algumas
mulheres estariam programadas geneticamente para serem infiéis. A
notícia, claro, foi recebida não sem uma boa dose de controvérsia por
quem é do meio científico.
Ao
acompanhar o desenvolvimento de duas duplas de irmãs gêmeas, Spector
constatou que se uma delas tivesse se mostrado infiel, a probabilidade
da irmã também apresentar esse tipo de comportamento era de 55%. O
pesquisador diz ter observado que as chances de que um dos dois irmãos
sejam ou não infiéis é bem maior quando eles são univitelinos. “Seria
burrice negar que a infidelidade não é definida nos genes, assim como os
outros traços de personalidade. Entre as mulheres casadas, apenas 23%
traem seus parceiros”, argumenta. Será?
De alguma
maneira, a explicação para certos comportamentos cada vez mais é
sustentada por uma abordagem biológica. No ano passado, um estudo da
Universidade de Emory, nos Estados Unidos, deu o primeiro passo no
sentido de decifrar fenômenos sociais como a fidelidade e a traição
segundo diferenças genéticas. Os pesquisadores notaram que em sua
colônia de arganazes-do-campo, um tipo de roedor semelhante ao esquilo,
alguns animais ficavam mais tempo com sua prole que outros. Ao rastrear a
origem, eles concluíram que os fiéis e os infiéis tinham uma variação
no comprimento da região do DNA que controla um certo gene.
Os
pesquisadores chegaram à conclusão de que os animais com segmentos de
DNA mais longos possuíam mais receptores de vasopressina, um hormônio
que regula o comportamento social em diversas espécies. Animais com
segmentos longos tiveram níveis mais elevados de receptores do hormônio
presentes nas áreas do cérebro que comandam o comportamento social e o
cuidado familiar. Estes animais se aproximariam de outros mais
rapidamente e gastariam mais tempo na alimentação dos filhotes.
Claro,
esses resultados devem ser vistos com cautela. Afinal, nem é preciso
dizer, humanos são de longe mais complexos do que roedores, sendo
impossível traçar um paralelo entre eles. Entretanto, os autores
defendem que há certos indícios que nos levam à hipótese de que os
atributos genéticos indiquem a predisposição de uma pessoa à fidelidade
ou à traição. Sabe-se, por exemplo, que há receptores da vasopressina em
humanos e, da mesma maneira, o hormônio está mais presente em algumas
regiões do cérebro do que em outras.
É verdade
que essa explicação genética para a traição está longe de ser
esclarecida. Seria particularmente difícil prever o comportamento de um
indivíduo a partir de sua herança genética. O motivo? É bastante
simples: “A cultura provavelmente compensaria qualquer efeito genético”,
ressalta Larry J. Young, um dos responsáveis pelo estudo da Emory, que
pretende descobrir se o mecanismo encontrado nos roedores também está
presente em seres humanos. “A variabilidade pode esclarecer alguma
diversidade em traços sociais humanos e de personalidade”, diz.
PARA SABER MAIS
Moeda de troca]
A despeito dos valores voláteis do homem pós-moderno, que evita criar vínculos, o psicólogo Antonio Carlos Alves de Araújo acredita que ainda vale a pena pensar no amor a dois. A solução para todos os problemas apontados seria o que o terapeuta de casais chama de equilíbrio energético. Esse equilíbrio passaria pela “conscientização de que um relacionamento ou amizade é algo vital, que requer manutenção ou investimento diário, assim como nossa tarefa de sobreviver”.
Araújo
diz que, em relação à traição, o que deve ser levado em conta é o
caráter da pessoa, o seu desenvolvimento, as chances que ela teve na
vida, o seu histórico afetivo… Isto não é visto por muitas dessas
pesquisas genéticas, que não têm outro direcionamento, senão o de
favorecer a indústria farmacêutica, segundo ele. “O sofrimento não tem
bases genéticas. Aliás, o sofrimento virou um mercado muito concorrido,
ele é muito disputado por diversos segmentos, pelo shopping, pela mídia,
pela religião, pela indústria”, critica.
Cruel consequência
As proposições da biologia nem sempre são bem recebidas por quem trabalha diretamente com as sequelas emocionais deixadas pela traição. A psicóloga Silvana Martani, da Clínica de Endocrinologia da Beneficência Portuguesa, em São Paulo, descarta totalmente a hipótese baseada na genética. Ela acredita que não existem diferenças entre homens e mulheres quando o assunto é traição. “O que existe é tentar desvalorizar a traição e suas consequências quando se divide em sexual e afetiva. A traição é um sofrimento para todos, homens e mulheres, e não tem diferenciação de fato”, conclui.
Quando o
assunto é traição, não há vencedores. No campo social, ela equivale à
demissão. E com uma desvantagem: o traído sequer sabe porquê está sendo
demitido. Assim, o ato de infidelidade impede que as questões que
exasperam o casal sejam expostas a partir do diálogo. “Quem trai obstrui
a comunicação, impede que o outro elabore uma defesa”, afirma o
psicólogo e terapeuta de casais Antonio Carlos Alves de Araújo, para
quem a infidelidade é uma espécie de despotismo, só que no terreno
amoroso.
Araújo é
adepto das teorias de Alfred Adler (1870- 1937). Segundo esse psiquiatra
escocês, o comportamento humano é guiado pela busca de superioridade. O
desejo de poder seria uma forma de compensar a condição de
inferioridade que vivenciamos na infância frente aos adultos. Daí a
vontade de sermos fortes e capazes, como aqueles nos quais nos
espelhamos; e mesmo depois de crescidos, continuamos acalentando tais
ideais de perfeição.
Baseado na
sua experiência clínica, o terapeuta afirma que o desgaste do
relacionamento não é a única justificativa plausível para a traição.
Para ele, o que motiva o comportamento infiel é, na verdade, o
narcisismo e a competição. O ato de trair estaria ligado à necessidade
de estabelecer uma relação de vantagem em relação ao companheiro – seja
para compensar a falta de segurança, afeto e atenção; seja para,
simplesmente, firmar uma relação de poder, por puro capricho narcisista.
A traição seria a vingança pela falta de empenho do outro. A mulher que
trai está punindo o parceiro que não deu atenção a ela. Para o homem, a
traição pode ser vista como uma ambição. “Um paciente meu disse que
trai a mulher três vezes por dia, com três mulheres diferentes. Ele diz
que faz isso porque é ambicioso. E agora busca tratamento porque teme
que a mulher faça o mesmo. A traição, neste caso, está relacionada com
narcisismo; em Psicologia chamamos de estrutura narcisista de caráter. O
ponto central da infidelidade parece ser o desejo de poder”, explica.
Ele
compara o infiel ao banqueiro que planeja uma maneira de “lucrar” no
relacionamento. O homem procura conquistar poder e respeito perante seus
pares, enquanto a mulher aposta na beleza com uma tática de
sobrevivência de sua parte afetiva, tentando evitar o abandono a
qualquer preço. Note que ambos figuram como investidores!
E no concorrido mercado do amor, a beleza ganha peso de “commodity”, normalmente associada ao prestígio e ao status.
Da mesma
maneira que Adler – que defende a tese de que todos os problemas
importantes na vida de uma pessoa são de ordem social -, Araújo descarta
a hipótese de que genética possa explicar a propensão de algumas
pessoas para a infidelidade, como sugerem alguns estudos recentes
desenvolvidos nesse campo. Ao contrário, ele diz que o sofrimento não
tem bases genéticas: o que deveria ser levado em conta é o caráter, o
contexto, o desenvolvimento e a história afetiva de quem trai.
Sinal de caráter
Fala-se que homens e mulheres interpretam a traição de formas diferentes. A mulher estaria mais preocupada com a traição no campo afetivo enquanto o homem no campo sexual. Essa distinção faz sentido? Segundo Antonio Carlos Alves de Araújo faz sentido, sim. “Mas há outras diferenças que eu percebo a partir da minha experiência em terapia de casais. A mulher geralmente tenta perdoar mais que o homem. O homem não costuma relevar, ele nem mesmo vem à terapia por si só. Boa parte dos homens prefere recorrer a detetives a avaliar o que está dando errado no relacionamento”.
Interpretando
esses casos a partir de uma abordagem freudiana, dizemos que o sujeito
que é ciumento a ponto de pagar alguém para vigiar a mulher, na verdade
projeta nela o que há de pior em si. Geralmente, são homens que também
estão traindo.
No
passado, as mulheres justificavam a infidelidade pela traição do marido.
Já as mulheres das novas gerações tomaram para si um direito que até
então era masculino, o de trair por desejo. “Tenho um paciente jovem que
tem uma namorada que faz academia, pratica musculação, toma
anabolizantes e coisas do gênero. É uma mulher masculina, ela deseja um
atributo masculino. O que assistimos atualmente é isso, mulheres
imitando homens, tomando de empréstimo seus piores hábitos”. Para ele,
esse desejo desenfreado por ter diversos parceiros, o desejo de trair, é
reproduzido, quando na verdade deveria ser combatido, controlado. “Mas
as novas gerações se desenvolveram a partir de valores hipernarcisistas,
são pessoas individualistas e altamente competitivas”.
A timidez
também teria uma relação com infidelidade. O papel daquele que
escamoteia o diálogo no relacionamento é destruir os sonhos do outro,
impedir que alguém atinja o clímax com ele, porque se isso acontecer ele
terá um compromisso de retribuir. “Egoísmo, timidez, narcisismo,
competição… esses problemas estão envolvidos com a infidelidade. Posso
dizer que o indivíduo que tem uma postura tímida no relacionamento é um
estelionatário emocional. Ele opta por um relacionamento, mas, ao mesmo
tempo, procura se esconder, evita o diálogo, impede que o casal discuta
seus problemas quando eles surgem, nega-se a compartilhar qualquer
experiência íntima. O que essa pessoa pretende é bloquear a troca
afetiva. Depois ele acaba se queixando da traição. Tenho muitos casos
assim, são homens que preferem lidar com máquinas a conviver com seus
pares. Geralmente, isso acontece porque tiveram privação afetiva em
algum momento da vida”.
Mas diante
do ultranarcisismo e do individualismo do homem pós-moderno, que não
estabelece laços profundos com nada, ainda faz sentido sonhar com o amor
a dois. “Sempre é possível, mas a maioria das pessoas usa a traição
como um contrato inconsciente. Cerca de 80% dos relacionamentos são mal
sucedidos. Todo mundo parece estar infeliz. A igreja e a televisão
mascaram o problema. Mas ainda assim o relacionamento a dois é possível a
despeito do narcisismo, do individualismo, da competição. A solução é o
diálogo. Aliás, o que separa a loucura da normalidade é exatamente
isso, a comunicação. O tímido, por exemplo, não consegue se comunicar,
seu relacionamento se torna algo problemático. Ele evita discutir as
questões que o incomodam e, com isso, retira a chance de defesa do
outro. Por outro lado, existem relações em que a discussão se torna uma
espécie de combustível que alimenta o casal, as partes envolvidas se
viciam no conflito. Mas quando há a ameaça de separação, ela não é
aceita, porque a pessoa não quer parar. A nossa sociedade vive essa
constante drogadição, uma overdose em todos os aspectos”.
Amor que dói
Muitas vezes é o sofrimento que organiza o cotidiano das pessoas. “O depressivo, por exemplo, escraviza as pessoas por meio de sua melancolia, que sempre inspira cuidados e atenção. A postura é cômoda por que assim ele não precisa lidar com suas perdas, sua fragilidade”. O mesmo aconteceria com o ódio. Ao alimentá-lo, a pessoa insatisfeita não precisa trabalhar os conflitos. Esse ódio é quase um delírio, um orgasmo. “O problema é que a cultura não aceita esse ódio, que jamais é assumido. Até que um dia a situação chega ao extremo, como ocorreu com a Suzane Richthofen [a jovem que ajudou a executar os pais]. Isso é muito frequente. A motivação, muitas vezes, não tem qualquer relação com o perfil socioeconômico, o problema é de outra ordem”.
A vingança
retira o foco do que se está passando internamente para o traído. “Se o
perdão está fora de questão, o que eu aconselho é por um fim nessa
relação. Em 10% dos casos de infidelidade, a pessoa traída se vinga ou
então culpa o outro eternamente. Até que um dia ela vai embora, porque
não encontrou um meio de lidar com a situação. Mesmo as mulheres, que
costumam relevar mais, acabam se tornando receosas, e mais tarde
demonstram dificuldade de se envolver novamente. Quando resolvem levar o
relacionamento adiante, ficam completamente diferentes. Ou elas apostam
tudo na vingança, ou se dedicam apenas ao trabalho, investem tudo no
sucesso profissional
RELACIONAMENTO VIRTUAL
PSICOLOGADO/ ARTIGOS
Fonte: https://psicologado.com/abordagens/psicanalise/relacionamento-virtual © Psicologado.com
Resumo: O estudo deste artigo aborda o processo de
comunicação e relacionamentosamorosos no ambiente virtual que hoje faz parte do
cotidiano da sociedade, possibilitando maior interação entre as pessoas, uma
vez que rompeu com o padrão presencial. Nessa pesquisa participaram quatro
usuárias da Internet, que responderam a um questionário sobre suas opiniões e
comportamentos relacionados à afetividade e relacionamento virtual. A amostra
foi composta por mulheres adultas, solteiras, com e sem filhos, com níveis
socioeconômico médio a alto. Para esse estudo, utilizou-se o método qualitativo
onde foram realizadas entrevistas abertas, gravadas e posteriormente
transcritas e analisadas conforme o método de Bardin, onde visou identificar
quais as razões que levam as mulheres a estabelecer relacionamentos afetivos
através de chats, comunidades, sites como Par Perfeito, Facebook, MSN e outros
meios eletrônicos. Verificou-se que as participantes acreditam na possibilidade
de relacionamentos virtuais duradouros, no entanto relataram necessidade de
confiar para depois ter um contato face a face.
Palavras-Chave: Afetividade. Facebook. Internet.
Relacionamento Virtual. Par Perfeito.
1. Introdução
A internet faz parte do cotidiano da sociedade,
possibilitando maior interação entre as pessoas, uma vez que rompeu com o
padrão presencial, no qual era imprescindível a presença dos indivíduos, sendo,
deste modo, utilizada também como forma de difusão dos relacionamentos
afetivos. É justamente por vivermos numa geração em transição entre um modelo
onde a forma de conhecer pessoas era exclusivamente o físico, presencial e real
para uma possibilidade de estabelecimentos de relacionamentos através do espaço
virtual.
Considerando esses aspectos, esta pesquisa terá como
finalidade identificar quais as razões que levam mulheres a estabelecer
relacionamentos afetivos virtuais, via chats, comunidades, sites e outros meios
eletrônicos, em detrimento do modo tradicional onde ocorre o contato
presencial; analisar quais as consequências dos relacionamentos virtuais; além
disso, verificar se a pessoa utiliza identidade real ao entrar em chats, sites
e comunidades nas redes sociais; também avaliar como a socialização e a
segurança/insegurança se manifesta nas usuárias das redes sociais; e analisar
os efeitos que a solidão causa na vida cotidiana das mulheres que buscam os
relacionamentos virtuais;
Dentro desse contexto percebe-se a grande
importância de realizar um estudo científico sobre esse tema para que se
desnudem as formas de comportamentos dessas relações e de como essas mulheres
são afetadas por tais situações. Para que se completem tais análises percebe-se
a importância do tema e dos poucos estudos acerca do assunto, faz-se
imprescindível uma pesquisa para entendermos a procura cada vez maior por esse
tipo de relacionamento.
Resumo: O
estudo deste artigo aborda o processo de comunicação e relacionamentos
amorosos no ambiente virtual que hoje faz parte do cotidiano da
sociedade, possibilitando maior interação entre as pessoas, uma vez que
rompeu com o padrão presencial. Nessa pesquisa participaram quatro
usuárias da Internet, que responderam a um questionário sobre suas
opiniões e comportamentos relacionados à afetividade e relacionamento
virtual. A amostra foi composta por mulheres adultas, solteiras, com e
sem filhos, com níveis socioeconômico médio a alto. Para esse estudo,
utilizou-se o método qualitativo onde foram realizadas entrevistas
abertas, gravadas e posteriormente transcritas e analisadas conforme o
método de Bardin, onde visou identificar quais as razões que levam as
mulheres a estabelecer relacionamentos afetivos através de chats,
comunidades, sites como Par Perfeito, Facebook, MSN e outros meios
eletrônicos. Verificou-se que as participantes acreditam na
possibilidade de relacionamentos virtuais duradouros, no entanto
relataram necessidade de confiar para depois ter um contato face a face.
Palavras-Chave: Afetividade. Facebook. Internet. Relacionamento Virtual. Par Perfeito.].
Resumo: O
estudo deste artigo aborda o processo de comunicação e relacionamentos
amorosos no ambiente virtual que hoje faz parte do cotidiano da
sociedade, possibilitando maior interação entre as pessoas, uma vez que
rompeu com o padrão presencial. Nessa pesquisa participaram quatro
usuárias da Internet, que responderam a um questionário sobre suas
opiniões e comportamentos relacionados à afetividade e relacionamento
virtual. A amostra foi composta por mulheres adultas, solteiras, com e
sem filhos, com níveis socioeconômico médio a alto. Para esse estudo,
utilizou-se o método qualitativo onde foram realizadas entrevistas
abertas, gravadas e posteriormente transcritas e analisadas conforme o
método de Bardin, onde visou identificar quais as razões que levam as
mulheres a estabelecer relacionamentos afetivos através de chats,
comunidades, sites como Par Perfeito, Facebook, MSN e outros meios
eletrônicos. Verificou-se que as participantes acreditam na
possibilidade de relacionamentos virtuais duradouros, no entanto
relataram necessidade de confiar para depois ter um contato face a face.
Palavras-Chave: Afetividade. Facebook. Internet. Relacionamento Virtual. Par Perfeito.].
No que se refere aos relacionamentos virtuais, mesmo estando em um
site em que se busca um relacionamento virtual, metade dos casos (50%)
foram descritos como relacionamentos surgidos por algum interesse
financeiro e nível cultural, e outros (50%) afirmaram que estavam no
site apenas para flertar. Destas (25%) afirmam ter marcado vários
encontros e mantido relações sexuais com parceiros da Internet.
Na maioria dos casos, (75%) relatam que já trouxeram seus parceiros
ocasionais para dentro de suas casas, expressando que se preocupam com
seus filhos, mas, que nunca deixaram que esse fator interferisse no
encontro.
Quanto a problemas com o relacionamento social, a maioria (75%)
respondeu possuir dificuldades de sair em festas noturnas, por serem
tímidas, e achar na internet um meio mais fácil de se relacionar.
Nos sites e nas salas de bate-papo, utilizando-se apenas de um “nick”
(apelido), (25%) das internautas afirmou ter uma identidade falsa
podendo desaparecer a qualquer momento, sem a possibilidade de uma
identificação com a realidade, já (50%) relata que apenas seus nomes e
cidades não são verdadeiros.
Nesta pesquisa todas as participantes afirmam que o que buscam na
internet além da renda mensal, seria por um sólido relacionamento
afetivo.
Por meio da análise de conteúdo das entrevistas foram elaboradas cinco categorias. Quatro categorias a priori e uma a posteriori:
perfil falso. No tema que investigou relacionamento virtual, suas
consequências e principais motivações, foram formadas as seguintes
categorias: motivações; risco e consequências; segurança e insegurança;
solidão e perfil falso.
Na categoria motivações, as entrevistadas expressam
as razões pelas quais elas utilizam a internet, buscando um
relacionamento por questões financeiras, comodidade, estabilidade e
segurança.
Para Prado (2004), ao entrar em sites de encontros onde as pessoas se
cadastram, ele afirma que elas buscam alguém com perfil semelhante ao
seu. Corroborando com o autor percebe-se que os sites de encontros como o
Par Perfeito analisam e cruzam perfis de cada um dos inscritos e unem
uns com os outros por afinidades.
Esse é um exemplo onde as internautas comentam que se dirigem
diretamente àqueles que têm um perfil de afinidade com o seu, os mesmos
interesses ou a mesma visão de mundo através dos tipos de planos, como
por exemplo, o Plano Platinun [5]
que se inscrevem para os pretendentes as observarem. Podem também
escolher as pessoas por idade, sexo, profissão, religião, tipos de lazer
preferido, musicas ou leituras prediletas, ou qualquer outro aspecto
que consideram relevantes. Cada uma reagiu de maneira particular ante
esse evento, conforme sua historia:
Eu acho que todo mundo procura uma coisa séria. [...] têm uns que
me depositam, bah eles ouvem minha historia e tem grana eu acho que eles
vêm minha situação e não vem problema de me ajuda e eles pedem meu
numero da conta eu passo o numero, e eles depositam, eu já ganhei ó o E.
já me deu 4 mil reais, o A. deposita direto pra minha filha que é pra
faculdade dela né , ele deposita 2 mil reais por mês, e é assim...
(PENÉLOPE CHARMOSA, 50).
[...] eu gosto de conversar, de falar,
de viajar, eu não sou muito de festa, eu gosto de trocar idéias, falar
de lugares que conhece e que eu ainda não conheço então pra mim nossa...
[...] eu não tenho acesso a esses lugares assim sozinha então qual é o
único jeito? Assim. Então, to em casa, não estou exposta de certa
maneira e to conhecendo pessoas interessantes. (JULIETA, 42).
Um dos fatores mais salientados nas entrevistas foi o interesse pelo
valor da remuneração dos “futuros” pretendentes, na fala das
entrevistadas é possível observar:
[...] eu vou no site e eu procuro a renda mensal, porque tu coloca
lá o perfil que tu qué, eu coloco assim: homens até 50 anos ai eu vou no
salário que eles ganham, ai eu coloco tudo acima de 20 mil reais
entendeu, 20 mil reais, 30 mil reais, menos que isso não, eu nasci
pobre, chega né. (risos) (PENÉLOPE CHARMOSA, 50).
Existe a
renda mensal. [...] o nível de escolaridade pra mim também é muito
importante, ãh porque não é só, só o como se diz o dinheiro, é a
cultura, como disse tem que ser uma pessoa mais, mais do que eu, por que
se for uma pessoa menos que eu.... tem que se uma pessoa que me
acrescente. Um valor mensal que pra gente, deduz que é uma pessoa que
deu certo né que facilitaria muito a vida se dé, se dé a liga entre um
homem e uma mulher seria mais de 20, 30 mil reais. (JULIETA, 42).
Indo em desencontro com o pensamento de Prado (2006), há um
descompasso entre o que se procura e que se encontra. Há uma procura,
pelo menos, consciente, de relações estáveis, baseadas na confiança, na
fidelidade, no respeito. Partindo desse pensamento, percebe-se que as
participantes procuram um certo tipo de comodismo, segurança e
afetividade também, mas o que está mais evidente é o interesse em
conseguir aproveitar a vida de uma forma diferente, não tendo mais a
responsabilidade de trabalhar, de cumprir com as obrigações diárias, e
sim viver como se fossem adolescentes apaixonadas, curtindo a vida com
viagens, compras, e com uma ótima situação financeira.
Na categoria consequências, todas as participantes
relatam que sabem que existe algum tipo de perigo, até porque não se
pode ter certeza de quem de fato é a pessoa que está do outro lado do
computador, mas que há um processo de investigação para não cair em
armadilhas, e só depois de algum tempo em que adquirem confiança e muita
conversa é que irão se conhecer pessoalmente. As pessoas, ao se
mascararem, encobriram suas próprias identidades por outras que refletem
seu desejo de ser algo fora dos limites sociais, culturais e econômicos
(SAMPAIO, 2002). De acordo com as falas:
[...] uma pessoa que tem problema, ela uma hora ela vai caí uma
hora a máscara cai. Porque tu não vai conhecer uma pessoa na internet se
tu ta na dúvida, tu não vai conversar dois dias e vai se encontra com a
pessoa, não, se leva tempo, uma pessoa quando ela já tem um transtorno
mental ela não espera muito tempo pra se manifestar, eles dizem que eu
tenho sorte, mas não é sorte, eu sei filtrar as informações. (PENÉLOPE
CHARMOSA, 50).
[...] ãh eu acho assim, uma coisa que eu acho
desde o começo é fácil online porque tu vai conhecer a pessoa primeiro
por dentro e tu fala 1,2,3,4,5,6 vezes, é impossível uma pessoa sustentá
uma máscara por tanto tempo sabe, então sem chance dele ta mentindo
(JULIETA, 42).
Nessa fala entende-se que para Sampaio (2002), a internet é uma
aventura, e muita gente está vendo nela, a única alternativa. Realmente,
o encontro amoroso é uma das mais difíceis de conquistar na vida real,
no dia a dia.
Corroborando com a ideia de Sampaio (2002) a internet é extremamente
perigosa, porque é um campo fértil não só para a imaginação e a
fantasia, mas também para a perversão. É uma aventura factível de
enfrentar, desde que se tenha total consciência de que as pessoas vão
usar seus escudos e disfarces. A internet joga as fantasias e interesses
de uma mulher, que às vezes podem ser completamente diferentes do que
aparentar ser.
Na categoria segurança/insegurança, pode se perceber
que as participantes têm consciência de que existe algum tipo de risco,
mas, nunca deixaram de se relacionar apontando que tomam todos os
cuidados necessários antes de conhecer o indivíduo pessoalmente. De
acordo com Prado (2002), elas conversam pela webcam, [6] vêem fotos da família e ligam diretamente na empresa ou no trabalho do indivíduo.
O processo de aproximação amorosa via internet estabelece de modo
invertido em relação à maneira usual através da qual as pessoas
aproximam-se para um relacionamento amoroso, primeiro há longas
conversas, depois se vêem em fotos, mais tarde se escutam por telefone, e
só então podem, ou não, chegar ao encontro pessoal. (PRADO, 2004).
Com base nesse trecho percebe-se que para Prado (2004), cada
entrevistada se revela na medida do que cada uma esconde ou oculta de si
mesma, ou é capaz de perceber no outro diante da tela, e nesse outro, o
seu espelho. O fato é que a comunicação via internet possibilitou o
encontro das entrevistadas que, de outra forma, elas jamais iriam
conhecer seus pretendentes. Essas falas conduzem a um entendimento:
Ah, eu procuro saber da família, eu procuro vê na cam... ééé
normalmente eu antes de encontrar com essa pessoa eu já conheço a
família dela pela cam é eu, eu olho o cara e já me fala o nome completo e
eu já investigo na internet eu jogo no Google, eu, eu analiso tudo,
vejo se é verdade eu ligo na empresa, eu sou precavida entendeu?
(PENÉLOPE CHARMOSA, 50).
Eu conversei 3 meses com esse que eu
to agora e eu pesquisei. Ele me disse que tinha uma profissão e eu fui
procurar e encontrei um mundo de, de coisa, com foto com tudo, com
reportagem, falei pela web, pesquisei a família dele tudo, tudo, tudo.
Só vai no escuro quem qué. E isso é a experiência que faz ser assim. E
assim ó tu fala, falou 3 vezes eu já sei se dá ou não dá, tu já sabe se
ta mentindo. (JULIETA, 42).
Converso muito com ele antes, ãh
procuro vê-lo na webcam, ãh investigo a vida dele, eu procuro sabe de
onde é essa pessoa, como vive essa pessoa pra depois pode conhecer ele
pessoalmente, ah e a família também eu investigo, mas o risco a gente
sempre corre...(MORANGUINHO, 33).
Eu procuro sempre olha todas
as redes sociais dessa pessoa, falo pela cam, procuro conhecer a família
pela cam também, ah eu procuro saber tudo, tudo mesmo [...]
(POCAHONTAS, 22).
Partindo da ideia de Prado (2002) que a forma da qual se conhecem,
tudo pode acabar mal, porém, se na hora do encontro, suas perspectivas
não forem atendidas, talvez a pessoa não seja tão bonita como aparentava
ser na foto, ou não usa roupas muito bacanas, ou tem mau hálito ou
ainda a voz é estridente, irritante ou mesmo de uma “taquara rachada.”
Considerando esse ponto de vista, um relacionamento que parecia ser
perfeito no virtual se torna inviável no âmbito real por aspectos
simples que poderiam ter sido descobertos antes, se o relacionamento
tivesse começado numa festa ao invés de ter dado início numa sala de
bate-papo virtual. Pior ainda, é quando a pessoa não é nada daquilo que
diz ser. É nesse ponto que entra a frase todo cuidado é pouco, pois
existem muitas pessoas inexperientes se envolvendo cada dia mais nesse
mundo virtual.
Na categoria solidão, nota-se que as participantes
encontraram na internet um meio de fuga da realidade, tentando buscar um
divertimento, um consolo, uma forma de aliviar suas carências afetivas,
e esse meio encontrado lhes trouxe uma esperança de poder conhecer,
construir e estabelecer novas amizades e conseqüentemente um
relacionamento amoroso, também pelo fato de sentirem uma maior
facilidade em paquerar virtualmente do que pessoalmente.
A internet é um instrumento excelente para as pessoas saudáveis,
especialmente nas grandes cidades, pois elas trocam correspondências e
cultivam amizades. O grande problema é a dependência que as pessoas
criam sobre o conteúdo existente no computador. São pessoas frustradas,
sozinhas e mal resolvidas amorosamente onde buscam algo novo todo dia
(SAMPAIO, 2002),
Corroborando com a idéia de Sampaio (2002), a internet é nova, mas a
solidão e o desejo de preenchê-la são tão antigos quanto o ser humano.
Enquanto trocam-se e-mails também são compartilhadas mil emoções,
pensamentos, sentimentos e fantasias. Quando existe alguém que as
interessa, não há alegria maior do que ver a caixa postal cheias de
mensagens do pretendente.
[...] tu não tem noção do que é a solidão numa cidade grande, eles
sentem necessidade de ter alguém pra conversar, a maioria dos caras que
eu converso sentem solidão então eles se apegam numa pessoa que dá
carinho. [...] e eu sentia uma solidão uma solidão dentro de casa hãã
pensei que ia morre. (PENÉLOPE CHARMOSA, 50).
Muitas vezes a solidão, muitas vezes em casa sem ãh, uma fuga, uma fuga da realidade. (MORANGUINHO, 33).
Essas falas conduzem a um entendimento que com certeza existe algo
que não mudou para o ser humano nessa vida real: a busca mais ou menos
criativa de saídas diante do apelo à solidão, o preenchimento do que nos
falta.
O que assusta as pessoas trancadas, isoladas e fechadas não é a
internet, é a realidade, o perigo de sair em festas e voltar para casa
de madrugada, o medo de se relacionar com as pessoas reais [...] (SAIÃO,
2003).
Portanto, não é difícil perceber que, o surgimento da internet veio
abrir novas e interessantes possibilidades de comunicação entre as
usuárias, no conforto dos seus quartos ou no seu estabelecimento de
trabalho, elas podem comunicar-se com “segurança”, e se sentindo
solitária a comunicação virtual tornou-se muito mais atrativa.
Na categoria perfil falso, ocorre à construção de
uma realidade de segunda ordem, uma realidade de simulação, que nos
reporta a um mundo fantasioso, que é um mundo simbólico, imaterial, uma
forma inusitada de estabelecer um vínculo social. Neste mundo, as
entrevistadas muitas vezes fogem do seu cotidiano, comunicando-se com um
“outro” sem rosto, sem identidade, que não exige compromisso, bastando
clicar um botão para interromper a comunicação. Também existe o contato
pelo celular onde uma das entrevistadas relata ter mais de oitenta
contatos, todos adquiridos no site Par Perfeito, como se pode observar::
Ah é evidente que não vou pôr meu nome no site né, mas as fotos são
minhas, são fotos atuais, eu não passo meu nome, mas do meu numero de
celular [...] o celular a gente da pra quem a gente qué, então tudo é
real, só meu nome e a cidade que eu moro que não é real, eu não coloco
que eu moro aqui, eu coloco que eu moro em São Paulo, sabe por quê?
Porque é São Paulo que tem gente da grana, do dólar, que tem poderrr..
(PENÉLOPE CHARMOSA, 50).
Ah sim, eu nunca coloco meu nome
verdadeiro, até por segurança né, e a cidade eu coloco Florianópolis,
porque eles mostram mais interesse quando a cidade é maior, é capital
sei lá, mas eu coloco minha idade real porque eu procurava um cara com a
idade mais ou menos igual a minha... (JULIETA, 42).
Essa fala conduz ao entendimento de que o anonimato tem um efeito
desinibidor para as entrevistadas, pois oferece muitas opções para elas
expressarem suas necessidades e emoções. É como se as mesmas pudessem se
apresentar com os mais variados trajes virtuais, com as mais diversas e
interessantes identidades.
Eu nunca entro com o meu nome, nunca entrei como eu mesma. Eu digo
que sou eu, só se eu confiar muuiiitoo na pessoa, e como eu tenho o meu
nome fictício, as pessoas também tem uns nomes bizarros, e tendo nome
bizarro esquece, porque tu sabe que aquele cara ou é casado, tem algum
relacionamento fora ou ta só querendo sacanagem... (MORANGUINHO, 33).
Para Serra (2006), essa possibilidade de anonimato por meio dos fakes, [7]
e a questão da identidade pessoal nas comunicações mediadas por
computador foram pensadas desde o início como uma forma de oposição
entre a autenticidade e a simulação “[...] entre dizer-se o que se é e
ser-se o que se diz, e dizer-se o que se não é e ser-se o que se não
diz.” (SERRA, 2006). Para muitas pessoas, segundo o mesmo autor, a
simulação é a solução para os problemas de identidade. Ainda segundo
Serra (2006), o virtual não é propriamente um espaço e um tempo de
simulação, mas de maior autenticidade conforme permite ao indivíduo a
revelação e libertação de todos os preconceitos e repressões, ocorrendo,
assim, uma libertação das identidades.
Corroborando com a ideia de Serra (2006), as internautas podem
fraudar dados pessoais como estado civil, raça, profissão, idade, tipo
físico. Quanto à personalidade, pode demonstrar no espaço virtual
características diferentes do seu comportamento social real. Dessa
forma, nos relacionamentos a distância por intermédio das redes sociais,
mesmo que possivelmente alguma das entrevistadas esteja triste, pode
simular felicidade somente de aparência, e os demais usuários dessa rede
não têm com
No que se refere aos relacionamentos virtuais, mesmo estando em um
site em que se busca um relacionamento virtual, metade dos casos (50%)
foram descritos como relacionamentos surgidos por algum interesse
financeiro e nível cultural, e outros (50%) afirmaram que estavam no
site apenas para flertar. Destas (25%) afirmam ter marcado vários
encontros e mantido relações sexuais com parceiros da Internet.
Na maioria dos casos, (75%) relatam que já trouxeram seus parceiros
ocasionais para dentro de suas casas, expressando que se preocupam com
seus filhos, mas, que nunca deixaram que esse fator interferisse no
encontro.
Quanto a problemas com o relacionamento social, a maioria (75%)
respondeu possuir dificuldades de sair em festas noturnas, por serem
tímidas, e achar na internet um meio mais fácil de se relacionar.
Nos sites e nas salas de bate-papo, utilizando-se apenas de um “nick”
(apelido), (25%) das internautas afirmou ter uma identidade falsa
podendo desaparecer a qualquer momento, sem a possibilidade de uma
identificação com a realidade, já (50%) relata que apenas seus nomes e
cidades não são verdadeiros.
Nesta pesquisa todas as participantes afirmam que o que buscam na
internet além da renda mensal, seria por um sólido relacionamento
afetivo.
Por meio da análise de conteúdo das entrevistas foram elaboradas cinco categorias. Quatro categorias a priori e uma a posteriori:
perfil falso. No tema que investigou relacionamento virtual, suas
consequências e principais motivações, foram formadas as seguintes
categorias: motivações; risco e consequências; segurança e insegurança;
solidão e perfil falso.
Na categoria motivações, as entrevistadas expressam
as razões pelas quais elas utilizam a internet, buscando um
relacionamento por questões financeiras, comodidade, estabilidade e
segurança.
Para Prado (2004), ao entrar em sites de encontros onde as pessoas se
cadastram, ele afirma que elas buscam alguém com perfil semelhante ao
seu. Corroborando com o autor percebe-se que os sites de encontros como o
Par Perfeito analisam e cruzam perfis de cada um dos inscritos e unem
uns com os outros por afinidades.
Esse é um exemplo onde as internautas comentam que se dirigem
diretamente àqueles que têm um perfil de afinidade com o seu, os mesmos
interesses ou a mesma visão de mundo através dos tipos de planos, como
por exemplo, o Plano Platinun [5]
que se inscrevem para os pretendentes as observarem. Podem também
escolher as pessoas por idade, sexo, profissão, religião, tipos de lazer
preferido, musicas ou leituras prediletas, ou qualquer outro aspecto
que consideram relevantes. Cada uma reagiu de maneira particular ante
esse evento, conforme sua historia:
Eu acho que todo mundo procura uma coisa séria. [...] têm uns que me depositam, bah eles ouvem minha historia e tem grana eu acho que eles vêm minha situação e não vem problema de me ajuda e eles pedem meu numero da conta eu passo o numero, e eles depositam, eu já ganhei ó o E. já me deu 4 mil reais, o A. deposita direto pra minha filha que é pra faculdade dela né , ele deposita 2 mil reais por mês, e é assim... (PENÉLOPE CHARMOSA, 50).[...] eu gosto de conversar, de falar, de viajar, eu não sou muito de festa, eu gosto de trocar idéias, falar de lugares que conhece e que eu ainda não conheço então pra mim nossa... [...] eu não tenho acesso a esses lugares assim sozinha então qual é o único jeito? Assim. Então, to em casa, não estou exposta de certa maneira e to conhecendo pessoas interessantes. (JULIETA, 42).
Um dos fatores mais salientados nas entrevistas foi o interesse pelo
valor da remuneração dos “futuros” pretendentes, na fala das
entrevistadas é possível observar:
[...] eu vou no site e eu procuro a renda mensal, porque tu coloca lá o perfil que tu qué, eu coloco assim: homens até 50 anos ai eu vou no salário que eles ganham, ai eu coloco tudo acima de 20 mil reais entendeu, 20 mil reais, 30 mil reais, menos que isso não, eu nasci pobre, chega né. (risos) (PENÉLOPE CHARMOSA, 50).Existe a renda mensal. [...] o nível de escolaridade pra mim também é muito importante, ãh porque não é só, só o como se diz o dinheiro, é a cultura, como disse tem que ser uma pessoa mais, mais do que eu, por que se for uma pessoa menos que eu.... tem que se uma pessoa que me acrescente. Um valor mensal que pra gente, deduz que é uma pessoa que deu certo né que facilitaria muito a vida se dé, se dé a liga entre um homem e uma mulher seria mais de 20, 30 mil reais. (JULIETA, 42).
Indo em desencontro com o pensamento de Prado (2006), há um
descompasso entre o que se procura e que se encontra. Há uma procura,
pelo menos, consciente, de relações estáveis, baseadas na confiança, na
fidelidade, no respeito. Partindo desse pensamento, percebe-se que as
participantes procuram um certo tipo de comodismo, segurança e
afetividade também, mas o que está mais evidente é o interesse em
conseguir aproveitar a vida de uma forma diferente, não tendo mais a
responsabilidade de trabalhar, de cumprir com as obrigações diárias, e
sim viver como se fossem adolescentes apaixonadas, curtindo a vida com
viagens, compras, e com uma ótima situação financeira.
Na categoria consequências, todas as participantes
relatam que sabem que existe algum tipo de perigo, até porque não se
pode ter certeza de quem de fato é a pessoa que está do outro lado do
computador, mas que há um processo de investigação para não cair em
armadilhas, e só depois de algum tempo em que adquirem confiança e muita
conversa é que irão se conhecer pessoalmente. As pessoas, ao se
mascararem, encobriram suas próprias identidades por outras que refletem
seu desejo de ser algo fora dos limites sociais, culturais e econômicos
(SAMPAIO, 2002). De acordo com as falas:
[...] uma pessoa que tem problema, ela uma hora ela vai caí uma hora a máscara cai. Porque tu não vai conhecer uma pessoa na internet se tu ta na dúvida, tu não vai conversar dois dias e vai se encontra com a pessoa, não, se leva tempo, uma pessoa quando ela já tem um transtorno mental ela não espera muito tempo pra se manifestar, eles dizem que eu tenho sorte, mas não é sorte, eu sei filtrar as informações. (PENÉLOPE CHARMOSA, 50).[...] ãh eu acho assim, uma coisa que eu acho desde o começo é fácil online porque tu vai conhecer a pessoa primeiro por dentro e tu fala 1,2,3,4,5,6 vezes, é impossível uma pessoa sustentá uma máscara por tanto tempo sabe, então sem chance dele ta mentindo (JULIETA, 42).
Nessa fala entende-se que para Sampaio (2002), a internet é uma
aventura, e muita gente está vendo nela, a única alternativa. Realmente,
o encontro amoroso é uma das mais difíceis de conquistar na vida real,
no dia a dia.
Corroborando com a ideia de Sampaio (2002) a internet é extremamente
perigosa, porque é um campo fértil não só para a imaginação e a
fantasia, mas também para a perversão. É uma aventura factível de
enfrentar, desde que se tenha total consciência de que as pessoas vão
usar seus escudos e disfarces. A internet joga as fantasias e interesses
de uma mulher, que às vezes podem ser completamente diferentes do que
aparentar ser.
Na categoria segurança/insegurança, pode se perceber
que as participantes têm consciência de que existe algum tipo de risco,
mas, nunca deixaram de se relacionar apontando que tomam todos os
cuidados necessários antes de conhecer o indivíduo pessoalmente. De
acordo com Prado (2002), elas conversam pela webcam, [6] vêem fotos da família e ligam diretamente na empresa ou no trabalho do indivíduo.
O processo de aproximação amorosa via internet estabelece de modo
invertido em relação à maneira usual através da qual as pessoas
aproximam-se para um relacionamento amoroso, primeiro há longas
conversas, depois se vêem em fotos, mais tarde se escutam por telefone, e
só então podem, ou não, chegar ao encontro pessoal. (PRADO, 2004).
Com base nesse trecho percebe-se que para Prado (2004), cada
entrevistada se revela na medida do que cada uma esconde ou oculta de si
mesma, ou é capaz de perceber no outro diante da tela, e nesse outro, o
seu espelho. O fato é que a comunicação via internet possibilitou o
encontro das entrevistadas que, de outra forma, elas jamais iriam
conhecer seus pretendentes. Essas falas conduzem a um entendimento:
Ah, eu procuro saber da família, eu procuro vê na cam... ééé normalmente eu antes de encontrar com essa pessoa eu já conheço a família dela pela cam é eu, eu olho o cara e já me fala o nome completo e eu já investigo na internet eu jogo no Google, eu, eu analiso tudo, vejo se é verdade eu ligo na empresa, eu sou precavida entendeu? (PENÉLOPE CHARMOSA, 50).Eu conversei 3 meses com esse que eu to agora e eu pesquisei. Ele me disse que tinha uma profissão e eu fui procurar e encontrei um mundo de, de coisa, com foto com tudo, com reportagem, falei pela web, pesquisei a família dele tudo, tudo, tudo. Só vai no escuro quem qué. E isso é a experiência que faz ser assim. E assim ó tu fala, falou 3 vezes eu já sei se dá ou não dá, tu já sabe se ta mentindo. (JULIETA, 42).Converso muito com ele antes, ãh procuro vê-lo na webcam, ãh investigo a vida dele, eu procuro sabe de onde é essa pessoa, como vive essa pessoa pra depois pode conhecer ele pessoalmente, ah e a família também eu investigo, mas o risco a gente sempre corre...(MORANGUINHO, 33).Eu procuro sempre olha todas as redes sociais dessa pessoa, falo pela cam, procuro conhecer a família pela cam também, ah eu procuro saber tudo, tudo mesmo [...] (POCAHONTAS, 22).
Partindo da ideia de Prado (2002) que a forma da qual se conhecem,
tudo pode acabar mal, porém, se na hora do encontro, suas perspectivas
não forem atendidas, talvez a pessoa não seja tão bonita como aparentava
ser na foto, ou não usa roupas muito bacanas, ou tem mau hálito ou
ainda a voz é estridente, irritante ou mesmo de uma “taquara rachada.”
Considerando esse ponto de vista, um relacionamento que parecia ser
perfeito no virtual se torna inviável no âmbito real por aspectos
simples que poderiam ter sido descobertos antes, se o relacionamento
tivesse começado numa festa ao invés de ter dado início numa sala de
bate-papo virtual. Pior ainda, é quando a pessoa não é nada daquilo que
diz ser. É nesse ponto que entra a frase todo cuidado é pouco, pois
existem muitas pessoas inexperientes se envolvendo cada dia mais nesse
mundo virtual.
Na categoria solidão, nota-se que as participantes
encontraram na internet um meio de fuga da realidade, tentando buscar um
divertimento, um consolo, uma forma de aliviar suas carências afetivas,
e esse meio encontrado lhes trouxe uma esperança de poder conhecer,
construir e estabelecer novas amizades e conseqüentemente um
relacionamento amoroso, também pelo fato de sentirem uma maior
facilidade em paquerar virtualmente do que pessoalmente.
A internet é um instrumento excelente para as pessoas saudáveis,
especialmente nas grandes cidades, pois elas trocam correspondências e
cultivam amizades. O grande problema é a dependência que as pessoas
criam sobre o conteúdo existente no computador. São pessoas frustradas,
sozinhas e mal resolvidas amorosamente onde buscam algo novo todo dia
(SAMPAIO, 2002),
Corroborando com a idéia de Sampaio (2002), a internet é nova, mas a
solidão e o desejo de preenchê-la são tão antigos quanto o ser humano.
Enquanto trocam-se e-mails também são compartilhadas mil emoções,
pensamentos, sentimentos e fantasias. Quando existe alguém que as
interessa, não há alegria maior do que ver a caixa postal cheias de
mensagens do pretendente.
[...] tu não tem noção do que é a solidão numa cidade grande, eles sentem necessidade de ter alguém pra conversar, a maioria dos caras que eu converso sentem solidão então eles se apegam numa pessoa que dá carinho. [...] e eu sentia uma solidão uma solidão dentro de casa hãã pensei que ia morre. (PENÉLOPE CHARMOSA, 50).Muitas vezes a solidão, muitas vezes em casa sem ãh, uma fuga, uma fuga da realidade. (MORANGUINHO, 33).
Essas falas conduzem a um entendimento que com certeza existe algo
que não mudou para o ser humano nessa vida real: a busca mais ou menos
criativa de saídas diante do apelo à solidão, o preenchimento do que nos
falta.
O que assusta as pessoas trancadas, isoladas e fechadas não é a
internet, é a realidade, o perigo de sair em festas e voltar para casa
de madrugada, o medo de se relacionar com as pessoas reais [...] (SAIÃO,
2003).
Portanto, não é difícil perceber que, o surgimento da internet veio
abrir novas e interessantes possibilidades de comunicação entre as
usuárias, no conforto dos seus quartos ou no seu estabelecimento de
trabalho, elas podem comunicar-se com “segurança”, e se sentindo
solitária a comunicação virtual tornou-se muito mais atrativa.
Na categoria perfil falso, ocorre à construção de
uma realidade de segunda ordem, uma realidade de simulação, que nos
reporta a um mundo fantasioso, que é um mundo simbólico, imaterial, uma
forma inusitada de estabelecer um vínculo social. Neste mundo, as
entrevistadas muitas vezes fogem do seu cotidiano, comunicando-se com um
“outro” sem rosto, sem identidade, que não exige compromisso, bastando
clicar um botão para interromper a comunicação. Também existe o contato
pelo celular onde uma das entrevistadas relata ter mais de oitenta
contatos, todos adquiridos no site Par Perfeito, como se pode observar::
Ah é evidente que não vou pôr meu nome no site né, mas as fotos são minhas, são fotos atuais, eu não passo meu nome, mas do meu numero de celular [...] o celular a gente da pra quem a gente qué, então tudo é real, só meu nome e a cidade que eu moro que não é real, eu não coloco que eu moro aqui, eu coloco que eu moro em São Paulo, sabe por quê? Porque é São Paulo que tem gente da grana, do dólar, que tem poderrr.. (PENÉLOPE CHARMOSA, 50).Ah sim, eu nunca coloco meu nome verdadeiro, até por segurança né, e a cidade eu coloco Florianópolis, porque eles mostram mais interesse quando a cidade é maior, é capital sei lá, mas eu coloco minha idade real porque eu procurava um cara com a idade mais ou menos igual a minha... (JULIETA, 42).
Essa fala conduz ao entendimento de que o anonimato tem um efeito
desinibidor para as entrevistadas, pois oferece muitas opções para elas
expressarem suas necessidades e emoções. É como se as mesmas pudessem se
apresentar com os mais variados trajes virtuais, com as mais diversas e
interessantes identidades.
Eu nunca entro com o meu nome, nunca entrei como eu mesma. Eu digo que sou eu, só se eu confiar muuiiitoo na pessoa, e como eu tenho o meu nome fictício, as pessoas também tem uns nomes bizarros, e tendo nome bizarro esquece, porque tu sabe que aquele cara ou é casado, tem algum relacionamento fora ou ta só querendo sacanagem... (MORANGUINHO, 33).
Para Serra (2006), essa possibilidade de anonimato por meio dos fakes, [7]
e a questão da identidade pessoal nas comunicações mediadas por
computador foram pensadas desde o início como uma forma de oposição
entre a autenticidade e a simulação “[...] entre dizer-se o que se é e
ser-se o que se diz, e dizer-se o que se não é e ser-se o que se não
diz.” (SERRA, 2006). Para muitas pessoas, segundo o mesmo autor, a
simulação é a solução para os problemas de identidade. Ainda segundo
Serra (2006), o virtual não é propriamente um espaço e um tempo de
simulação, mas de maior autenticidade conforme permite ao indivíduo a
revelação e libertação de todos os preconceitos e repressões, ocorrendo,
assim, uma libertação das identidades.
Corroborando com a ideia de Serra (2006), as internautas podem
fraudar dados pessoais como estado civil, raça, profissão, idade, tipo
físico. Quanto à personalidade, pode demonstrar no espaço virtual
características diferentes do seu comportamento social real. Dessa
forma, nos relacionamentos a distância por intermédio das redes sociais,
mesmo que possivelmente alguma das entrevistadas esteja triste, pode
simular felicidade somente de aparência, e os demais usuários dessa rede
não têm com
Procurou-se com este artigo investigar o relacionamento virtual, suas
principais motivações, suas conseqüências e as novas formas de
interação interpessoais que se tornaram possíveis com o surgimento da
internet.
Arranjar um namorado virtual está se tornando uma situação cada vez
mais comum, mulheres das mais variadas idades se rendem às facilidades
do computador para encontrar sua alma gêmea no outro lado da tela.
Entretanto, da mesma forma como é fácil encontrar uma pessoa bacana
que lhes proporcionem comodidade, estabilidade, segurança e uma boa
situação financeira, também corre-se o risco de cair em certas
armadilhas.
Entende-se que estes fatores como a curiosidade, facilidade em obter
contatos e a rapidez na comunicação atraem e surpreendem as pessoas, na
maior parte das vezes positivamente, aumentando a probabilidade de
tornar-se dependente dessa máquina cada vez mais humana, onde encontram
na internet uma forma de aliviar suas carências afetivas, um consolo, ou
seja, elas expressam suas necessidades e emoções numa fuga da
realidade, uma realidade de simulação, que as reporta a um mundo
fantasioso, um mundo simbólico, imaterial, uma forma inusitada de
estabelecer um vínculo social.
As mulheres que se inserem no “Par Perfeito, MSN e Facebook”, para
buscar relacionamentos amorosos virtuais, fazem de maneira similar a um
relacionamento amoroso não virtual; ou seja, inicialmente buscam
“flertar”, conhecendo o companheiro de maneira mais superficial, e
posteriormente, se essas pessoas despertarem algo mais, tenta-se
conhecê-las no âmbito da realidade. As relações virtuais constituem uma
nova forma de relacionamento que partem da descoberta de afinidades, ao
contrário do enamoramento tradicional em geral que parte do olhar e do
contato físico.
Dessa maneira, a comunicação a distância surgiu para facilitar os
relacionamentos das pessoas, mas jamais uma forma de comunicação
substituirá a outra, em razão de que ambas possuem limitações e
relevâncias para os relacionamentos interpessoais.
Fonte: https://psicologado.com/abordagens/psicanalise/relacionamento-virtual © Psicologado.com
Procurou-se com este artigo investigar o relacionamento virtual, suas
principais motivações, suas conseqüências e as novas formas de
interação interpessoais que se tornaram possíveis com o surgimento da
internet.
Arranjar um namorado virtual está se tornando uma situação cada vez
mais comum, mulheres das mais variadas idades se rendem às facilidades
do computador para encontrar sua alma gêmea no outro lado da tela.
Entretanto, da mesma forma como é fácil encontrar uma pessoa bacana
que lhes proporcionem comodidade, estabilidade, segurança e uma boa
situação financeira, também corre-se o risco de cair em certas
armadilhas.
Entende-se que estes fatores como a curiosidade, facilidade em obter
contatos e a rapidez na comunicação atraem e surpreendem as pessoas, na
maior parte das vezes positivamente, aumentando a probabilidade de
tornar-se dependente dessa máquina cada vez mais humana, onde encontram
na internet uma forma de aliviar suas carências afetivas, um consolo, ou
seja, elas expressam suas necessidades e emoções numa fuga da
realidade, uma realidade de simulação, que as reporta a um mundo
fantasioso, um mundo simbólico, imaterial, uma forma inusitada de
estabelecer um vínculo social.
As mulheres que se inserem no “Par Perfeito, MSN e Facebook”, para
buscar relacionamentos amorosos virtuais, fazem de maneira similar a um
relacionamento amoroso não virtual; ou seja, inicialmente buscam
“flertar”, conhecendo o companheiro de maneira mais superficial, e
posteriormente, se essas pessoas despertarem algo mais, tenta-se
conhecê-las no âmbito da realidade. As relações virtuais constituem uma
nova forma de relacionamento que partem da descoberta de afinidades, ao
contrário do enamoramento tradicional em geral que parte do olhar e do
contato físico.
Dessa maneira, a comunicação a distância surgiu para facilitar os
relacionamentos das pessoas, mas jamais uma forma de comunicação
substituirá a outra, em razão de que ambas possuem limitações e
relevâncias para os relacionamentos interpessoais.
Fonte: https://psicologado.com/abordagens/psicanalise/relacionamento-virtual © Psicologado.com
Segundo Rosa (2001), a internet é entendida como um grupo de
conexões de computadores representado pelo World Wide Web (www) e as
áreas afins, surgiu de maneira abrupta e tomou conta das práticas cotidianas,
gerando perplexidades, inclusive no âmbito jurídico, principalmente vinculadas
à segurança, privacidade, comércio, criminalidade e direito de família
(relacionamentos afetivos virtuais).
A natureza particular da internet é que, pela primeira vez
na história o ser humano, cada leitor ou espectador não tem que contentar-se
com uma participação passiva. Ele, ou ela, pode intervir pessoalmente, agir ou
participar ativamente da criação do conteúdo de um meio de comunicação com o
alcance de milhões de outras pessoas, e tudo isso em tempo real (ROSA, 2001).
Guimarães (2000) ressalta que são muitas as causas que
motivam os relacionamentos virtuais. Uns navegam na internet para atender a uma
necessidade natural de conhecer pessoas, para brincar, para fazer descobertas,
repetindo o que acontecia antigamente nos relacionamentos por carta, que se
iniciavam por uma amizade sem compromisso. Outros usam os relacionamentos
virtuais para vencer a solidão, para vencer o tédio do cotidiano, para
preencher carências afetivas. Enquanto uns buscam relacionamentos virtuais para
fugir da relação pouco gratificantes que vivem na realidade, outros também usam
a sedução exercida no espaço virtual para melhorar a relação com seus parceiros
reais.
Segundo Schelp (2009) o “Orkut, twitter, e Facebook, entre
outros ambientes, não aplacam a solidão”
, pois diminuem o círculo de amigos próximos enquanto contatos virtuais aumentam ostensivamente. Ainda Schelp (2009) diz que a internet tornou-se um vasto ponto de encontro de contatos superficiais.
, pois diminuem o círculo de amigos próximos enquanto contatos virtuais aumentam ostensivamente. Ainda Schelp (2009) diz que a internet tornou-se um vasto ponto de encontro de contatos superficiais.
Cumpre mencionar que há duas formas de comunicação “online”.
A primeira é denominada síncrona, pela qual os usuários estão conectados ao
mesmo tempo e conversam em tempo real, aqui destacam-se as salas de bate-papo
dos “sites” de relacionamentos e programas como o MSN (Messenger); e a segunda
é conhecida como assíncrona, a qual não é realizada em tempo real, sendo
mediada pelo uso de e-mails e dos “sites” de comunidades “online” ou virtuais,
como o Orkut, Facebook, etc., (CAMPOS, 2009).
Com a internet permite-se a interatividade absoluta com a
utilização de vídeo, câmera digital, tela interativa, celulares, entre outros,
possibilitando que as pessoas rompam limites entre o real e o imaginário.
Schelp (2009) relata que na internet é fácil administrar uma
enorme rede de contatos, com pessoas pouco conhecidas, porque estão todos ao
alcance de um clique. A lista de amigos virtuais é uma espécie de agenda de
telefones, com a vantagem de não ser necessário ligar para todos [...].
De acordo com Schelp (2009), em nenhum outro país as redes
sociais on line têm alcance tão grande quanto no Brasil, com uma audiência
mensal de 29 milhões de pessoas.
Segundo Guimarães (2002), o medo da violência fez com que a
socialização ficasse cada vez mais difícil. Dessa forma, para suprir essa
necessidade de contato intelectual, social e afetivo, algumas pessoas, que hoje
são milhões, foram aderindo a essa nova maneira de se comunicar, de fazer novas
amizades: os “chats” de conversação.
Freud (1920/1987) ao definir o ego como sendo a instância
resultante de inúmeras identificações, formada na sua maior parte por aspectos
inconscientes, relativiza a noção de unidade, de coerência deste pólo da
personalidade.
O sonho diurno, ou devaneio, que Freud (1908/1987)
denominou, com tanta propriedade, de fantasia pode ser um conceito de extrema
relevância para pensar as relações virtuais, estabelecidas entre os habitantes
do ciberespaço, nos chats de conversação. Nestas relações não presentificadas
e, portanto, anônimas, a adoção de um pseudônimo ou mesmo a construção de um ou
mais personagens para se comunicar com os outros são frequentes (FREUD, 1987
Apud LANZARIN, 2000).
Já que o homem está cada vez mais em casa, o uso dos “chats”
de conversação permite uma relação de interação com o mundo, não apenas como
troca de ideias, mas também como uma nova forma de conhecer pessoas, o que pode
vir a ampliar o número de relacionamentos pessoais. Os sites de relacionamento
ajudam o “internauta” a resolver questões sexuais e sentimentais. Os bate papos
fazem com que o contato afetivo seja bem facilitado, principalmente para pessoas
inseguras ou com problemas de socialização (DELA COLETA 2008, apud GUIMARÃES,
2002).
A realidade das relações virtuais abrange um amplo aspecto
de possibilidades de relações que vai desde a normalidade à patologia,
dependendo do uso que cada indivíduo faça desta relação, seja um uso narcísico
(que pode ser apenas um prolongamento de seu mundo interno), seja um uso
perverso ou uma forma de se evadir da realidade externa ou interna, conforme a
subjetividade inerente a cada ser humano (GUIMARÃES, 2000).
De acordo com Dela Coleta (2008), o relacionamento virtual
pode, ou não, materializar-se na realidade, concretizando as relações iniciadas
no ciberespaço. Os conflitos, as mentiras, os problemas e as decepções quando
da relação materializada são de caráter subjetivo, dependendo do usuário e da
maneira como ele lida e convive no ciberespaço. O usuário é responsável por
suas ações e atitudes na esfera do virtual e posteriormente na realidade.
Para Abreu (2008), alguns estudiosos concluíram que o transtorno pela internet ou o uso problemático da internet, poderia acometer qualquer pessoa, em qualquer idade, nível socioeconômico e educacional e destaca o Brasil como importante alvo [...]. Essas pessoas apresentariam características peculiares como insegurança, introversão, fantasia acentuada, dispersividade de atenção, baixa tolerância a frustração, baixa auto estima, ansiedade social, impulsividade e dificuldades de estabelecer relacionamentos cara a cara (DELA COLETA, 2008). Petlik Fischer, Maria Alice Fontes
3. Definindo o Relacionamento Virtual
Os relacionamentos virtuais romperam o padrão social dos
relacionamentos presenciais, sendo motivados por muitas causas, frise-se que
algumas pessoas utilizam a internet para atender a necessidade natural de
conhecer pessoas, para fazer descobertas, como um relacionamento que se inicia
por uma amizade sem compromisso; outras navegam na internet para afastar a
solidão, o tédio do dia a dia, preenchendo, desta forma, carências afetivas
(CAMPOS, 2009).
Nos sites de relacionamento, os usuários teriam a disposição,
uma ferramenta que minimizaria as dificuldades próprias de relacionamento
social. Nesse espaço virtual, o internauta poderia escolher temas que viessem a
lhe interessar, como: amizade, sexo virtual, namoro, etc. (DELA COLETA, 2008).
Mais de 60% das pessoas que navegam na internet acabam
procurando por temas sexuais. São imagens, filmes, chats e salas de bate papo
que permitem despertar boa dose de erotismo e, entre esse sexo adicto, são
comuns aqueles que têm condutas masturbatórias diante dos sites eróticos ou
chats que veiculam o chamado sexo virtual (BALLONE e MOURA, 2003).
Schelp (2009) relata que alguns sociólogos, psicólogos e
antropólogos concluíram que essa forma de comunicação e relação não consegue
suprir as necessidades afetivas mais profundas dos indivíduos.
Segundo Ballone e Moura (2003), a internet enfraquece os
protocolos e condicionamentos culturais que habitualmente pesam sobre os
vínculos sociais. Muitas vezes é exatamente isso que deseja o internauta tímido
ou ansioso social. As diferenças individuais e sócio-culturais que alimentam a
fobia e o medo do contato interpessoal direto e real diminuem e recebem
aceitação maior na internet.
Quando um usuário mantém uma relação interpessoal através da
internet, por meio de quaisquer de seus recursos, está participando neste
espaço social através de uma relação que conserva os mesmos objetivos das
relações interpessoais com presença concreta, assim, a internet surge como um
veículo que pode propiciar o estabelecimento de vínculos interpessoais
duradouros e profundos (SALAZAR, 2000 Apud BALLONE e MOURA, 2003).
De acordo com Farah e Fortim (2007) a rede social Facebook é
considerada uma das principais causas de divórcio entre os americanos
atualmente, segundo pesquisa da empresa de antivírus Norton. Na mesma medida,
sites destinados a pessoas interessadas em um relacionamento amoroso ganham
cada vez mais adeptos: cerca de 5% dos recém-casados americanos se conheceram
pelo site de relacionamentos eHarmony, que tem mais de 33 milhões de inscritos
espalhados por 191 países. Pagando um valor mensal, o usuário tem acesso a um
“sistema de compatibilidade” que sugere pretendentes com gostos, valores e
crenças similares aos seus. Em um clique, é possível ver fotografias de uma
pessoa, saber algumas de suas preferências e convidá-la para uma conversa uma
forma de conhecer e flertar que tem se tornado cada vez mais comum. Segundo
pesquisa do Oxford Internet Institute divulgada em 2011, o número de usuários
desse tipo de serviço aumentou 500% em todo o mundo nos últimos dez anos. Entre
os brasileiros solteiros que têm acesso à rede, 65% já visitaram essas páginas.
Muitas pessoas buscam os sites por serem tímidas, por
fantasia, curiosidade ou por terem sofrido alguma decepção e estarem com medo
de se relacionar novamente e para isso não há uma regra. A pessoa por traz do
computador cria uma falsa segurança de que está fora de risco de se decepcionar
com o outro. É uma expectativa fora do real porque todo relacionamento tem
pontos positivos e negativos. O namoro virtual permite o convívio com uma
pessoa sem dividir os problemas e dificuldades de um casal real.
4. As Fases/Estágios do Relacionamento Virtual
Com propriedade Rosa (2001), aborda as 04 estágios/fases
mais verificáveis nos relacionamentos virtuais demonstradas a seguir:
1ª Fase: Chats ou sites de relacionamentos pessoais
A motivação interna vai desde a curiosidade até a ausência
afetivo-sentimental. Nessas ocasiões acontece (via de regra) o primeiro contato
motivado por qualquer razão ou pretexto; um nickname (apelido) que agrada um
nome, um filme, uma música, as motivações são inexplicáveis/aleatórias. Nos
chats após o primeiro contato normalmente se passa para o “reservado” e a
conversa flui naturalmente (ROSA, 2001).
2ª Fase: E-mail, dentre outros
Depois de estabelecido o primeiro contato, passa-se a etapa
um pouco mais pessoal, estabelecida ainda sobre a regra de não ser muito
específico nas informações, no qual as pessoas traçam impressões pessoais sobre
os assuntos, se conhecem melhor, buscam saber mais de si e do outro. Em suma
nessa fase/etapa, busca-se conhecer com as limitações próprias o outro,
demonstrando aquilo que se é ou se quer ser. Em outra face, que nem todos
querem contatos físicos. Muitos querem apenas uma fuga da realidade, sem
necessariamente pretender consumar algo físico-sexual (ROSA, 2001).
3ª Fase: Contato Pessoal
A terceira etapa se constitui na apresentação real, por meio
de encontros. Normalmente isso acontece depois de muita conversa e interação
entre os parceiros virtuais. Entretanto, existem aqueles que entram em chats de
encontros ou de sexo buscando apenas relacionamentos efêmeros, sem querer saber
quem é a pessoa. Com efeito, avançando-se para o contato pessoal desnudando-se
do véu virtual, derrubando-se o Muro Virtual de Berlin, abrem-se as
possibilidades de interação pessoal (ROSA, 2001). O contato pode migrar para um
namoro, amizade ou casamento (BARTHES, 2000 Apud ROSA, 2001).
4ª Fase: Passagem para o Contato Físico
Nessa etapa a distância do virtual e do real é superada e os
amantes se entregam, finalmente, ao seu prazer físico. Buscado, mas não
querido, no paradoxo eterno dos relacionamentos afetivos. (ROSA, 2001).
Barthes, (2000 apud ROSA 2001) descreve com precisão o
encontro: “A figura se refere ao tempo feliz que se seguiu imediatamente ao
primeiro rapto, antes que nascessem as dificuldades do relacionamento amoroso”.
De acordo com Rosa (2001), as características passam a ser
de um adultério ou namoro verificado no contexto diário. Com o seu nascedouro
vinculado a internet. Aqui surgem paixões, decepções, romances duradouros,
encontros efêmeros, toda a gama de possibilidades dos relacionamentos afetivos.
5. Método
A presente pesquisa investigou o relacionamento virtual,
suas principais motivações; consequências; segurança e insegurança; solidão e
perfil falso. Portanto a pesquisa qualitativa mostrou-se mais apropriada para
atender os objetivos deste estudo. “A pesquisa qualitativa responde a
questões muito particulares, [...] trabalha com o universo dos significados,
dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes [...]”
(MINAYO, 2008 p.21).
Participaram da pesquisa quatro mulheres que foram
selecionadas pelos seguintes critérios: mulheres solteiras que fazem uso da
internet, sites de relacionamentos e a visão que cada uma tem do mesmo. As
mulheres selecionadas para colaborar com a pesquisa foram contatadas
pessoalmente e convidadas a participar. As entrevistas foram realizadas
mediante a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, com as
devidas orientações. O sigilo da identidade das participantes foi garantido,
prevenindo quaisquer riscos para as mesmas. As entrevistas foram gravadas em
áudio e posteriormente transcritas, sem qualquer alteração do conteúdo
original. A análise dos dados seguiu todos os procedimentos éticos, onde foi
utilizada a técnica de análise de conteúdo proposta por Bardin (2000). Esta se
define como um conjunto de técnicas de análise das comunicações pretendendo
obter, por processos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das
mensagens.
6. Apresentação e Discussão dos Resultados
Com relação aos dados pessoais das participantes usuárias de
internet, a pesquisa mostra que 100% são solteiras e uma não possui filhos.
Possuem idade entre 20 a 50 anos, essa faixa etária é um indicativo pela busca
de relacionamentos interpessoais mostrando um maior interesse por salas de bate
papos, MSN [1] e sites[2] como Par Perfeito [3] e Facebook[4].
No que se refere aos relacionamentos virtuais, mesmo estando
em um site em que se busca um relacionamento virtual, metade dos casos (50%)
foram descritos como relacionamentos surgidos por algum interesse financeiro e
nível cultural, e outros (50%) afirmaram que estavam no site apenas para
flertar. Destas (25%) afirmam ter marcado vários encontros e mantido relações
sexuais com parceiros da Internet.
Na maioria dos casos, (75%) relatam que já trouxeram seus
parceiros ocasionais para dentro de suas casas, expressando que se preocupam
com seus filhos, mas, que nunca deixaram que esse fator interferisse no
encontro.
Quanto a problemas com o relacionamento social, a maioria
(75%) respondeu possuir dificuldades de sair em festas noturnas, por serem
tímidas, e achar na internet um meio mais fácil de se relacionar.
Nos sites e nas salas de bate-papo, utilizando-se apenas de
um “nick” (apelido), (25%) das internautas afirmou ter uma identidade
falsa podendo desaparecer a qualquer momento, sem a possibilidade de uma
identificação com a realidade, já (50%) relata que apenas seus nomes e cidades
não são verdadeiros.
Nesta pesquisa todas as participantes afirmam que o que
buscam na internet além da renda mensal, seria por um sólido relacionamento
afetivo.
Por meio da análise de conteúdo das entrevistas foram
elaboradas cinco categorias. Quatro categorias a priori e uma a
posteriori: perfil falso. No tema que investigou relacionamento virtual,
suas consequências e principais motivações, foram formadas as seguintes
categorias: motivações; risco e consequências; segurança e insegurança; solidão
e perfil falso.
Na categoria motivações, as entrevistadas expressam
as razões pelas quais elas utilizam a internet, buscando um relacionamento por
questões financeiras, comodidade, estabilidade e segurança.
Para Prado (2004), ao entrar em sites de encontros onde as
pessoas se cadastram, ele afirma que elas buscam alguém com perfil semelhante
ao seu. Corroborando com o autor percebe-se que os sites de encontros como o
Par Perfeito analisam e cruzam perfis de cada um dos inscritos e unem uns com
os outros por afinidades.
Esse é um exemplo onde as internautas comentam que se
dirigem diretamente àqueles que têm um perfil de afinidade com o seu, os mesmos
interesses ou a mesma visão de mundo através dos tipos de planos, como por
exemplo, o Plano Platinun [5] que se inscrevem para os pretendentes as
observarem. Podem também escolher as pessoas por idade, sexo, profissão,
religião, tipos de lazer preferido, musicas ou leituras prediletas, ou qualquer
outro aspecto que consideram relevantes. Cada uma reagiu de maneira particular
ante esse evento, conforme sua historia:
Eu acho que todo mundo procura uma coisa séria. [...] têm
uns que me depositam, bah eles ouvem minha historia e tem grana eu acho que
eles vêm minha situação e não vem problema de me ajuda e eles pedem meu numero
da conta eu passo o numero, e eles depositam, eu já ganhei ó o E. já me deu 4 mil
reais, o A. deposita direto pra minha filha que é pra faculdade dela né , ele
deposita 2 mil reais por mês, e é assim... (PENÉLOPE CHARMOSA, 50).
[...] eu gosto de conversar, de falar, de viajar, eu não sou muito de festa, eu
gosto de trocar idéias, falar de lugares que conhece e que eu ainda não conheço
então pra mim nossa... [...] eu não tenho acesso a esses lugares assim sozinha
então qual é o único jeito? Assim. Então, to em casa, não estou exposta de
certa maneira e to conhecendo pessoas interessantes. (JULIETA, 42). Um dos fatores mais salientados nas entrevistas foi o
interesse pelo valor da remuneração dos “futuros” pretendentes, na fala das
entrevistadas é possível observar:
[...] eu vou no site e eu procuro a renda mensal, porque tu
coloca lá o perfil que tu qué, eu coloco assim: homens até 50 anos ai eu vou no
salário que eles ganham, ai eu coloco tudo acima de 20 mil reais entendeu, 20
mil reais, 30 mil reais, menos que isso não, eu nasci pobre, chega né. (risos)
(PENÉLOPE CHARMOSA, 50).
Existe a renda mensal. [...] o nível de escolaridade pra mim também é muito
importante, ãh porque não é só, só o como se diz o dinheiro, é a cultura, como
disse tem que ser uma pessoa mais, mais do que eu, por que se for uma pessoa
menos que eu.... tem que se uma pessoa que me acrescente. Um valor mensal que
pra gente, deduz que é uma pessoa que deu certo né que facilitaria muito a vida
se dé, se dé a liga entre um homem e uma mulher seria mais de 20, 30 mil reais.
(JULIETA, 42).
Indo em desencontro com o pensamento de Prado (2006), há um
descompasso entre o que se procura e que se encontra. Há uma procura, pelo
menos, consciente, de relações estáveis, baseadas na confiança, na fidelidade,
no respeito. Partindo desse pensamento, percebe-se que as participantes procuram
um certo tipo de comodismo, segurança e afetividade também, mas o que está mais
evidente é o interesse em conseguir aproveitar a vida de uma forma diferente,
não tendo mais a responsabilidade de trabalhar, de cumprir com as obrigações
diárias, e sim viver como se fossem adolescentes apaixonadas, curtindo a vida
com viagens, compras, e com uma ótima situação financeira.
Na categoria consequências, todas as participantes
relatam que sabem que existe algum tipo de perigo, até porque não se pode ter
certeza de quem de fato é a pessoa que está do outro lado do computador, mas
que há um processo de investigação para não cair em armadilhas, e só depois de
algum tempo em que adquirem confiança e muita conversa é que irão se conhecer
pessoalmente. As pessoas, ao se mascararem, encobriram suas próprias
identidades por outras que refletem seu desejo de ser algo fora dos limites
sociais, culturais e econômicos (SAMPAIO, 2002). De acordo com as falas:
[...] uma pessoa que tem problema, ela uma hora ela vai caí
uma hora a máscara cai. Porque tu não vai conhecer uma pessoa na internet se tu
ta na dúvida, tu não vai conversar dois dias e vai se encontra com a pessoa,
não, se leva tempo, uma pessoa quando ela já tem um transtorno mental ela não
espera muito tempo pra se manifestar, eles dizem que eu tenho sorte, mas não é
sorte, eu sei filtrar as informações. (PENÉLOPE CHARMOSA, 50).
[...] ãh eu acho assim, uma coisa que eu acho desde o começo é fácil online
porque tu vai conhecer a pessoa primeiro por dentro e tu fala 1,2,3,4,5,6
vezes, é impossível uma pessoa sustentá uma máscara por tanto tempo sabe, então
sem chance dele ta mentindo (JULIETA, 42).
Nessa fala entende-se que para Sampaio (2002), a internet é
uma aventura, e muita gente está vendo nela, a única alternativa. Realmente, o
encontro amoroso é uma das mais difíceis de conquistar na vida real, no dia a
dia.
Corroborando com a ideia de Sampaio (2002) a internet é
extremamente perigosa, porque é um campo fértil não só para a imaginação e a
fantasia, mas também para a perversão. É uma aventura factível de enfrentar,
desde que se tenha total consciência de que as pessoas vão usar seus escudos e
disfarces. A internet joga as fantasias e interesses de uma mulher, que às
vezes podem ser completamente diferentes do que aparentar ser.
Na categoria segurança/insegurança, pode se perceber
que as participantes têm consciência de que existe algum tipo de risco, mas,
nunca deixaram de se relacionar apontando que tomam todos os cuidados
necessários antes de conhecer o indivíduo pessoalmente. De acordo com Prado
(2002), elas conversam pela webcam, [6] vêem fotos da família e ligam
diretamente na empresa ou no trabalho do indivíduo.
O processo de aproximação amorosa via internet estabelece de
modo invertido em relação à maneira usual através da qual as pessoas
aproximam-se para um relacionamento amoroso, primeiro há longas conversas,
depois se vêem em fotos, mais tarde se escutam por telefone, e só então podem,
ou não, chegar ao encontro pessoal. (PRADO, 2004).
Com base nesse trecho percebe-se que para Prado (2004), cada
entrevistada se revela na medida do que cada uma esconde ou oculta de si mesma,
ou é capaz de perceber no outro diante da tela, e nesse outro, o seu espelho. O
fato é que a comunicação via internet possibilitou o encontro das entrevistadas
que, de outra forma, elas jamais iriam conhecer seus pretendentes. Essas falas
conduzem a um entendimento:
Ah, eu procuro saber da família, eu procuro vê na cam... ééé
normalmente eu antes de encontrar com essa pessoa eu já conheço a família dela
pela cam é eu, eu olho o cara e já me fala o nome completo e eu já investigo na
internet eu jogo no Google, eu, eu analiso tudo, vejo se é verdade eu ligo na
empresa, eu sou precavida entendeu? (PENÉLOPE CHARMOSA, 50).
Eu conversei 3 meses com esse que eu to agora e eu pesquisei. Ele me disse que
tinha uma profissão e eu fui procurar e encontrei um mundo de, de coisa, com
foto com tudo, com reportagem, falei pela web, pesquisei a família dele tudo,
tudo, tudo. Só vai no escuro quem qué. E isso é a experiência que faz ser
assim. E assim ó tu fala, falou 3 vezes eu já sei se dá ou não dá, tu já sabe
se ta mentindo. (JULIETA, 42).
Converso muito com ele antes, ãh procuro vê-lo na webcam, ãh investigo a vida
dele, eu procuro sabe de onde é essa pessoa, como vive essa pessoa pra depois
pode conhecer ele pessoalmente, ah e a família também eu investigo, mas o risco
a gente sempre corre...(MORANGUINHO, 33).
Eu procuro sempre olha todas as redes sociais dessa pessoa, falo pela cam,
procuro conhecer a família pela cam também, ah eu procuro saber tudo, tudo
mesmo [...] (POCAHONTAS, 22).
Partindo da ideia de Prado (2002) que a forma da qual se
conhecem, tudo pode acabar mal, porém, se na hora do encontro, suas
perspectivas não forem atendidas, talvez a pessoa não seja tão bonita como
aparentava ser na foto, ou não usa roupas muito bacanas, ou tem mau hálito ou
ainda a voz é estridente, irritante ou mesmo de uma “taquara rachada.”
Considerando esse ponto de vista, um relacionamento que
parecia ser perfeito no virtual se torna inviável no âmbito real por aspectos
simples que poderiam ter sido descobertos antes, se o relacionamento tivesse
começado numa festa ao invés de ter dado início numa sala de bate-papo virtual.
Pior ainda, é quando a pessoa não é nada daquilo que diz ser. É nesse ponto que
entra a frase todo cuidado é pouco, pois existem muitas pessoas inexperientes
se envolvendo cada dia mais nesse mundo virtual.
Na categoria solidão, nota-se que as participantes
encontraram na internet um meio de fuga da realidade, tentando buscar um
divertimento, um consolo, uma forma de aliviar suas carências afetivas, e esse
meio encontrado lhes trouxe uma esperança de poder conhecer, construir e
estabelecer novas amizades e conseqüentemente um relacionamento amoroso, também
pelo fato de sentirem uma maior facilidade em paquerar virtualmente do que
pessoalmente.
A internet é um instrumento excelente para as pessoas
saudáveis, especialmente nas grandes cidades, pois elas trocam correspondências
e cultivam amizades. O grande problema é a dependência que as pessoas criam
sobre o conteúdo existente no computador. São pessoas frustradas, sozinhas e
mal resolvidas amorosamente onde buscam algo novo todo dia (SAMPAIO, 2002),
Corroborando com a idéia de Sampaio (2002), a internet é
nova, mas a solidão e o desejo de preenchê-la são tão antigos quanto o ser
humano. Enquanto trocam-se e-mails também são compartilhadas mil emoções,
pensamentos, sentimentos e fantasias. Quando existe alguém que as interessa,
não há alegria maior do que ver a caixa postal cheias de mensagens do
pretendente.
[...] tu não tem noção do que é a solidão numa cidade
grande, eles sentem necessidade de ter alguém pra conversar, a maioria dos
caras que eu converso sentem solidão então eles se apegam numa pessoa que dá
carinho. [...] e eu sentia uma solidão uma solidão dentro de casa hãã pensei
que ia morre. (PENÉLOPE CHARMOSA, 50).
Muitas vezes a solidão, muitas vezes em casa sem ãh, uma fuga, uma fuga da
realidade. (MORANGUINHO, 33).
Essas falas conduzem a um entendimento que com certeza
existe algo que não mudou para o ser humano nessa vida real: a busca mais ou
menos criativa de saídas diante do apelo à solidão, o preenchimento do que nos
falta.
O que assusta as pessoas trancadas, isoladas e fechadas não
é a internet, é a realidade, o perigo de sair em festas e voltar para casa de
madrugada, o medo de se relacionar com as pessoas reais [...] (SAIÃO, 2003).
Portanto, não é difícil perceber que, o surgimento da
internet veio abrir novas e interessantes possibilidades de comunicação entre
as usuárias, no conforto dos seus quartos ou no seu estabelecimento de
trabalho, elas podem comunicar-se com “segurança”, e se sentindo solitária a
comunicação virtual tornou-se muito mais atrativa.
Na categoria perfil falso, ocorre à construção de uma
realidade de segunda ordem, uma realidade de simulação, que nos reporta a um
mundo fantasioso, que é um mundo simbólico, imaterial, uma forma inusitada de
estabelecer um vínculo social. Neste mundo, as entrevistadas muitas vezes fogem
do seu cotidiano, comunicando-se com um “outro” sem rosto, sem identidade, que
não exige compromisso, bastando clicar um botão para interromper a comunicação.
Também existe o contato pelo celular onde uma das entrevistadas relata ter mais
de oitenta contatos, todos adquiridos no site Par Perfeito, como se pode
observar::
Ah é evidente que não vou pôr meu nome no site né, mas as
fotos são minhas, são fotos atuais, eu não passo meu nome, mas do meu numero de
celular [...] o celular a gente da pra quem a gente qué, então tudo é real, só
meu nome e a cidade que eu moro que não é real, eu não coloco que eu moro aqui,
eu coloco que eu moro em São Paulo, sabe por quê? Porque é São Paulo que tem
gente da grana, do dólar, que tem poderrr.. (PENÉLOPE CHARMOSA, 50).
Ah sim, eu nunca coloco meu nome verdadeiro, até por segurança né, e a cidade
eu coloco Florianópolis, porque eles mostram mais interesse quando a cidade é
maior, é capital sei lá, mas eu coloco minha idade real porque eu procurava um
cara com a idade mais ou menos igual a minha... (JULIETA, 42).
Essa fala conduz ao entendimento de que o anonimato tem um
efeito desinibidor para as entrevistadas, pois oferece muitas opções para elas
expressarem suas necessidades e emoções. É como se as mesmas pudessem se
apresentar com os mais variados trajes virtuais, com as mais diversas e
interessantes identidades.
Eu nunca entro com o meu nome, nunca entrei como eu mesma.
Eu digo que sou eu, só se eu confiar muuiiitoo na pessoa, e como eu tenho o meu
nome fictício, as pessoas também tem uns nomes bizarros, e tendo nome bizarro
esquece, porque tu sabe que aquele cara ou é casado, tem algum relacionamento
fora ou ta só querendo sacanagem... (MORANGUINHO, 33).
Para Serra (2006), essa possibilidade de anonimato por meio
dos fakes, [7] e a questão da identidade pessoal nas comunicações
mediadas por computador foram pensadas desde o início como uma forma de
oposição entre a autenticidade e a simulação “[...] entre dizer-se o que se é e
ser-se o que se diz, e dizer-se o que se não é e ser-se o que se não diz.”
(SERRA, 2006). Para muitas pessoas, segundo o mesmo autor, a simulação é a
solução para os problemas de identidade. Ainda segundo Serra (2006), o virtual
não é propriamente um espaço e um tempo de simulação, mas de maior
autenticidade conforme permite ao indivíduo a revelação e libertação de todos
os preconceitos e repressões, ocorrendo, assim, uma libertação das identidades.
Corroborando com a ideia de Serra (2006), as internautas
podem fraudar dados pessoais como estado civil, raça, profissão, idade, tipo
físico. Quanto à personalidade, pode demonstrar no espaço virtual
características diferentes do seu comportamento social real. Dessa forma, nos
relacionamentos a distância por intermédio das redes sociais, mesmo que
possivelmente alguma das entrevistadas esteja triste, pode simular felicidade
somente de aparência, e os demais usuários dessa rede não têm como verificar a
realidade.
7. Considerações Finais
Procurou-se com este artigo investigar o relacionamento
virtual, suas principais motivações, suas conseqüências e as novas formas de
interação interpessoais que se tornaram possíveis com o surgimento da internet.
Arranjar um namorado virtual está se tornando uma situação
cada vez mais comum, mulheres das mais variadas idades se rendem às facilidades
do computador para encontrar sua alma gêmea no outro lado da tela.
Entretanto, da mesma forma como é fácil encontrar uma pessoa
bacana que lhes proporcionem comodidade, estabilidade, segurança e uma boa
situação financeira, também corre-se o risco de cair em certas armadilhas.
Entende-se que estes fatores como a curiosidade, facilidade
em obter contatos e a rapidez na comunicação atraem e surpreendem as pessoas, na
maior parte das vezes positivamente, aumentando a probabilidade de tornar-se
dependente dessa máquina cada vez mais humana, onde encontram na internet uma
forma de aliviar suas carências afetivas, um consolo, ou seja, elas expressam
suas necessidades e emoções numa fuga da realidade, uma realidade de simulação,
que as reporta a um mundo fantasioso, um mundo simbólico, imaterial, uma forma
inusitada de estabelecer um vínculo social.
As mulheres que se inserem no “Par Perfeito, MSN e
Facebook”, para buscar relacionamentos amorosos virtuais, fazem de maneira
similar a um relacionamento amoroso não virtual; ou seja, inicialmente buscam
“flertar”, conhecendo o companheiro de maneira mais superficial, e
posteriormente, se essas pessoas despertarem algo mais, tenta-se conhecê-las no
âmbito da realidade. As relações virtuais constituem uma nova forma de
relacionamento que partem da descoberta de afinidades, ao contrário do
enamoramento tradicional em geral que parte do olhar e do contato físico.
Dessa maneira, a comunicação a distância surgiu para
facilitar os relacionamentos das pessoas, mas jamais uma forma de comunicação
substituirá a outra, em razão de que ambas possuem limitações e relevâncias
para os relacionamentos interpessoais
Fonte: https://psicologado.com/abordagens/psicanalise/relacionamento-virtual
© Psicologado.com
REPENSANDO A INFIDELIDADE
Esther Perel: Repensando a infidelidade...uma palestra para quem já amouhttps://pt.tiny.ted.org/.../esther_perel_rethinking_infidelity_a_talk_for_anyone_who_...A infidelidade é a derradeira traição. Mas terá mesmo que ser? A terapeuta Esther Perel, especialista em relações conjugais, examina o porquê de as pessoas
A infidelidade é a derradeira traição. Mas
terá mesmo que ser? A terapeuta Esther Perel, especialista em relações
conjugais, examina o porquê de as pessoas traírem, e revela porque é que
um caso extraconjugal é tão traumático: por ameaçar a nossa segurança
emocional. Ela encontra na infidelidade algo inesperado — uma expressão
de desejo e perda. Uma comunicação obrigatória para quem já traiu ou foi
traído, ou para quem simplesmente quer um novo enquadramento para
compreender relações.
Translated by
Ana Antunes Simão
Reviewed by
Margarida Ferreira
Porque traímos? E porque é que pessoas felizes traem? Quando dizemos
"infidelidade," o que queremos realmente dizer? É uma relação sexual,
uma história de amor, sexo pago, uma conversa online, uma massagem com
final feliz? Porque é que achamos que os homens traem por aborrecimento e
medo de intimidade, mas as mulheres traem devido à solidão e desejo de
intimidade? Será uma traição sempre o fim de uma relação?
Nos últimos 10 anos, viajei pelo mundo todo, e trabalhei
extensivamente com centenas de casais destruídos pela infidelidade. Há
um simples acto de transgressão que consegue destruir a relação, a
felicidade e a até mesmo a identidade de um casal: um caso
extraconjugal. E no entanto, este acto tão comum é muito mal
compreendido. Portanto, esta palestra é para qualquer pessoa que já
tenha amado.
O adultério existe desde que o casamento foi inventado, bem como o
tabu contra o mesmo. Aliás, a infidelidade tem uma tenacidade que o
casamento só pode invejar, a tal ponto, que é o único mandamento que é
repetido na Bíblia duas vezes: uma vez pelo acto, e outra apenas por
pensar nele. (Risos) Portanto, como é que reconciliamos o que é
universalmente proibido, e, no entanto, universalmente praticado?
Ao longo da História, os homens tiveram praticamente uma licença para
trair sem grandes consequências, suportada por inúmeras teorias
biológicas e evolucionistas que justificavam a sua necessidade de
explorar, portanto, a duplicidade de critérios é tão velha quanto o
adultério em si. Mas quem é que sabe o que realmente se passa debaixo
dos lençóis? Porque é que, no que diz respeito a sexo, nos homens há uma
pressão para se gabarem e exagerarem, mas as mulheres são pressionadas a
esconder, minimizar e negar, o que não é surpreendente, tendo em conta
que ainda há nove países onde as mulheres podem ser mortas por
adultério.
A monogamia costumava ser estar com uma só pessoa toda a vida. Hoje,
monogamia é estar com uma pessoa de cada vez. (Risos) (Aplausos)
Muitos aqui já devem ter dito: "Sou monógamo em todas as minhas relações." (Risos)
Nós costumávamos casar, e fazer sexo pela primeira vez. Mas agora,
casamo-nos e deixamos de ter sexo com outras pessoas. O facto é que a
monogamia não tinha nada a ver com amor. Os homens dependiam da
fidelidade das mulheres para saber de quem eram os filhos, e quem
herdaria as vacas, quando morressem.
Agora, todos querem saber qual é a percentagem de traição. Têm-me
perguntado isto desde que cheguei a esta conferência. (Risos) Isto
aplica-se a vocês. Mas a definição de infidelidade continua a
expandir-se: sexo por SMS, ver pornografia, ser activo em aplicações de
encontros. Portanto, por não haver uma definição universal consensual do
que constitui uma infidelidade, a estimativa varia amplamente, de 26% a
75%. Mas para além disso, somos contradições ambulantes. Por isso, 95%
de nós vão dizer que é horrível que o nosso parceiro minta em relação a
ter um caso, mas quase a mesma quantidade dirá que isso seria
exactamente o que fariam se tivessem um. (Risos)
Bem, eu gosto desta definição de caso extraconjugal, ela junta os
três elementos-chave: uma relação secreta, que é o núcleo estrutural de
um caso; uma ligação emocional em maior ou menor grau; e uma alquimia
sexual. E alquimia, aqui, é a palavra-chave, porque o frisson erótico é
tal que o beijo que apenas imaginam dar, pode ser tão poderoso e
encantador quanto horas de relações sexuais. Como Marcel Proust disse, é
a nossa imaginação que é responsável pelo amor, não a outra pessoa.
Portanto, nunca foi tão fácil trair, e nunca foi tão difícil mantê-lo
em segredo. Nunca a infidelidade exerceu um efeito psicológico tão
marcante. Quando o casamento era um empreendimento económico, a
infidelidade ameaçava a nossa segurança económica. Mas agora que o
casamento é um acordo romântico, a infidelidade ameaça a nossa segurança
emocional. Ironicamente, costumávamos virar-nos para o adultério — esse
era o espaço onde procurávamos amor puro. Mas agora que procuramos amor
no casamento, o adultério destrói-o.
Penso que, actualmente, há três formas pelas quais a infidelidade,
hoje, magoa de modo diferente. Temos um ideal romântico, no qual
contamos com uma pessoa para preencher uma lista infindável de
necessidades: para ser o melhor amante, o melhor amigo, o melhor pai ou
mãe, o confidente fiel, o companheiro emocional, o par intelectual. E eu
sou isso: sou a escolhida, sou única, sou indispensável, sou
insubstituível, sou a tal. A infidelidade diz-me que não sou. É a
derradeira traição. A infidelidade quebra a grande ambição do amor. Mas
se ao longo da História, a infidelidade sempre foi dolorosa, hoje é,
frequentemente, traumática, porque ameaça a nossa própria identidade.
O meu paciente, Fernando, vive atormentado e diz: "Pensava que
conhecia a minha vida. "Pensava que sabia quem eras, quem nós éramos
como casal, quem eu era. "Agora, questiono tudo." A infidelidade — uma
quebra de confiança, uma crise de identidade. "Será que consigo voltar a
confiar em ti?" "Será que voltarei a confiar em alguém?"
Isto é o mesmo que me diz a minha paciente Heather, quando me fala da
sua história com o Nick. Casados, dois filhos. O Nick acaba de partir
numa viagem de negócios, e a Heather está a jogar no iPad dele, com os
filhos, quando vê uma mensagem aparecer no ecrã: "Sinto imenso a tua
falta." "Estranho", pensa ela, "acabámos de nos ver". Depois outra
mensagem: "Mal posso esperar para te ter nos meus braços." A Heather
apercebe-se que não são para ela. Ela também me conta que o seu pai teve
casos extraconjugais, mas a mãe dela encontrou um pequeno recibo no
bolso, e uma mancha de batom no colarinho. A Heather começa a procurar e
encontra centenas de mensagens, e fotos que foram trocadas, e desejos
que foram expressos. Detalhes vívidos do caso que o Nick mantinha há
dois anos revelados à sua frente, em tempo real. Isso fez-me pensar:
Casos extraconjugais na era digital são como uma morte por mil golpes.
Mas depois temos outro paradoxo com o qual lidamos nos dias de hoje.
Devido a este ideal romântico, confiamos na fidelidade do nosso
companheiro com um fervor único. No entanto, nunca estivemos mais
inclinados para trair, não por termos, agora, desejos novos, mas por
vivermos numa época em que nos sentimos no direito de ir em busca dos
nossos desejos, porque esta é a cultura em que eu mereço ser feliz. E se
nos costumávamos divorciar porque éramos infelizes, hoje divorciamo-nos
porque podíamos ser mais felizes. E se o divórcio estava embrenhado de
vergonha, hoje, a nova vergonha é escolher ficar quando podemos sair. A
Heather não pode falar com os amigos porque tem medo que eles a
critiquem por ela ainda amar o Nick, e para onde quer que se vire, ela
ouve o mesmo conselho: "Deixa-o. Larga-o de uma vez por todas". Se a
situação fosse inversa, o Nick estaria na mesma posição. Ficar é a nova
vergonha.
Portanto, se nos podemos divorciar, porque é que continuamos a trair?
Bem, a suposição comum é que, se alguém trai, ou há algo de errado com
a relação, ou há algo de errado contigo. Mas milhões de pessoas não
podem ser todas elas casos patológicos. A lógica é a seguinte: Se tens
tudo o que precisas em casa, então não há necessidade de procurar noutro
sítio, assumindo que existe algo como um casamento perfeito para nos
inocular contra estas aventuras. Mas e se a paixão tiver um prazo de
validade? E se houver coisas que até uma boa relação não consegue
proporcionar? Se até as pessoas felizes traem, de que é que se trata?
A maioria das pessoas com quem trabalho não são, de todo, alcovistas
crónicos. São pessoas que são, normalmente, profundamente monógamas nas
suas crenças, pelo menos para o seu parceiro. Mas encontram-se num
conflito entre os seus valores e o seu comportamento. São, normalmente,
pessoas que até foram fiéis durante décadas, mas um dia, pisam o risco
que pensavam nunca vir a pisar, correndo o risco de perder tudo. Mas
para vislumbrar o quê? Casos extraconjugais são um acto de traição, e
uma expressão de desejo e perda. No centro de um caso extraconjugal,
costumamos encontrar um desejo e anseio por uma ligação emocional, por
algo novo, liberdade, autonomia, intensidade sexual, um desejo de
recapturar partes perdidas de nós próprios ou uma tentativa de
restabelecer a vitalidade face à perda e tragédia.
Estou a pensar noutra das minhas pacientes, a Priya, que está num
casamento feliz, ama o marido, e nunca quereria magoá-lo. Mas ela também
me diz que sempre fez o que era esperado dela; boa rapariga, boa
mulher, boa mãe, cuida dos pais, que são imigrantes. A Priya
apaixonou-se pelo jardineiro que removeu a árvore do seu jardim depois
do furacão Sandy. Com o seu camião e as suas tatuagens, ele é o oposto
dela. Mas aos 47 anos, este caso tem a ver com a adolescência que a
Priya nunca teve. A história dela, para mim, realça que quando
procuramos o olhar de outro, não é necessariamente do nosso parceiro que
nos estamos a afastar, mas da pessoa na qual nos tornámos. E não é
tanto estarmos à procura de outra pessoa, mas sim estarmos à procura de
outra versão de nós próprios.
No mundo inteiro, há uma palavra que ouço sempre de quem tem casos
extraconjugais. Elas sentem-se vivas. E elas contam-me, frequentemente,
histórias de perdas recentes — a morte de um dos pais, um amigo que
morreu demasiado cedo, e más notícias do médico. A morte e a mortalidade
vivem, normalmente, na sombra do caso extraconjugal, porque levantam
questões. É só isto? Haverá mais para além disto? Vou passar os próximos
25 anos assim? Será que vou sentir aquilo outra vez? E leva-me a pensar
que, se calhar, são estas questões o que levam as pessoas a passar o
risco, e que alguns casos são uma tentativa de passar a perna à
mortalidade, como que um antídoto para a morte.
Contrariamente ao que possam pensar, ter um caso tem menos a ver com
sexo do que com desejo: desejo de atenção, desejo de nos sentirmos
especiais, desejo de nos sentirmos importantes. A própria estrutura de
um caso, o facto de nunca se poder ter o amante, mantém essa
necessidade. Acaba por ser uma máquina de desejo, porque a incompletude,
a ambiguidade, faz-nos querer o que não podemos ter.
Alguns de vocês devem pensar que casos extraconjugais não acontecem
em relações abertas, mas acontecem. Primeiro que tudo, a conversa sobre
monogamia não é a mesma que a conversa sobre infidelidade. Mas a verdade
é que, mesmo quando temos liberdade para ter outro parceiro sexual,
parece que continuamos a ser atraídos pelo poder do que é proibido, que
se fizermos o que não devíamos, acabamos por sentir que estamos a fazer o
que queremos. Eu também já disse a muitos dos meus pacientes que, se
pudessem trazer para as suas relações um décimo da ousadia, imaginação e
entusiasmo que colocam nas suas aventuras, provavelmente não precisavam
da minha ajuda. (Risos)
Então como é que nos curamos de uma traição? O desejo é profundo. A
traição é profunda. Mas pode ser curada. Alguns casos extraconjugais
são uma sentença de morte para relações que já estavam a morrer. Mas
outros despertam novas possibilidades. A verdade é que a maioria dos
casais que vivenciaram traições continuam juntos. Mas alguns irão apenas
sobreviver, e outros conseguirão transformar essa crise numa
oportunidade. Conseguirão transformá-la numa experiência geradora. Penso
que, principalmente para o parceiro traído, que normalmente dirá:
"Achas que eu não queria mais? "No entanto, não fui eu quem o fez." Mas
agora que a traição está exposta, eles também podem exigir mais, e já
não têm de manter o status quo que podia nem estar a funcionar assim tão
bem para eles.
Reparei que muitos casais, no rescaldo de um caso extraconjugal,
devido à nova desordem que pode levar a uma nova ordem, vão conseguir
conversar de forma honesta e aberta como não faziam há décadas. E
parceiros que estavam sexualmente indiferentes de repente sentem-se tão
vorazes de luxúria, mas não sabem de onde isso vem. Algo sobre o medo da
perda reacende o desejo, e abre caminho para todo um novo tipo de
verdade.
Portanto, quando uma traição é exposta, quais são algumas das coisas
que os casais podem fazer? Sabemos que a cura começa, depois do trauma,
quando o infrator reconhece os seus erros. Então, para o parceiro que
teve o caso, para o Nick, uma coisa é acabar com o caso, mas outra é o
ato essencial de expressar culpa e remorsos por magoar a sua mulher.
Mas a verdade é que reparei que muitas das pessoas que traem podem até
sentir-se muito culpadas por magoarem os seus parceiros, no entanto, não
se sentem culpadas pelo caso extraconjugal em si. Essa distinção é
importante. O Nick, precisa de ser o vigilante da relação. Precisa de
ser, durante uns tempos, o protector dos limites. É da sua
responsabilidade falar, porque, se ele pensar no assunto, pode aliviar a
Heather dessa obsessão, e assegurar que o caso não foi esquecido. Isso
por si só começa a restaurar a confiança.
Mas para a Heather, ou para o parceiro traído, é essencial fazer
coisas que restituam a sua autoestima, rodear-se de amor, amigos e
actividades que lhe devolvam a alegria, o sentido e a identidade. Mas
ainda mais importante, é controlar a curiosidade de procurar detalhes
sórdidos. "Onde estiveste? Onde é que o fizeste? "Com que frequência?
Ela é melhor que eu na cama?" São perguntas que apenas causam mais dor, e
nos mantêm acordados à noite. Em vez disso, mudem para o que chamo
"perguntas de investigação", as que exploram o significado e motivos "O
que é que este caso significou para ti?" "Foste capaz de expressar ou de
experienciar nele "o que já não conseguias comigo?" "O que sentias
quando chegavas a casa?" "O que é que valorizas na nossa relação?"
"Agrada-te que isto tenha acabado?"
Qualquer traição vai redefinir a relação, e cada casal vai determinar
qual vai ser o legado dessa traição. Mas as traições chegaram para
ficar, e não vão desaparecer. Os dilemas do amor e desejo, não produzem
respostas simples de preto e branco, de bom e mau, de vítima e
infractor. A traição numa relação aparece de muitas formas. Há muitas
maneiras de trair um parceiro: com desprezo, negligência, indiferença,
violência. Traição sexual é apenas uma das maneiras de magoar um
parceiro. Por outras palavras, a vítima de um caso nem sempre é a vítima
do casamento.
Agora, vocês já me ouviram, e sei o que devem estar a pensar: Ela tem
um sotaque francês, deve ser a favor de se ter um caso. (Risos) Bem,
estão errados. Não sou francesa. (Risos) (Aplausos) Nem sou a favor de
se ter um caso. Mas, como acho que algo bom pode surgir de um caso
extraconjugal, fazem-me, muitas vezes, esta pergunta estranha: Eu
recomendá-lo-ia? Bem, eu não recomendaria ter um caso extraconjugal tal
como não recomendaria ter cancro. No entanto, sabemos que pessoas que
estiveram doentes muitas vezes contam como a sua doença lhes deu uma
nova perspectiva. A principal pergunta que me têm feito desde que
cheguei a esta conferência e disse que ia falar de infidelidade é: a
favor ou contra? Eu digo: "Sim." (Risos)
Eu vejo casos extraconjugais de uma perspectiva dupla: por um lado,
mágoa e traição, por outro, crescimento e autodescoberta — o que te fez a
ti, e o que significou para mim. Então, quando um casal vem tem comigo
no rescaldo de um caso extraconjugal que foi revelado, costumo
dizer-lhes: Nos tempos que correm, no Ocidente, a maioria de nós vai ter
duas ou três relações ou casamentos, e, para alguns, serão com a mesma
pessoa. O vosso primeiro casamento acabou. Gostariam de criar um
segundo, juntos?
Obrigada.
(Aplausos
A INFIDELIDADE PESQUISA- PENSANDO FAMÍLIAS
A infidelidade está presente em parte significativa dos
relacionamentos amorosos e sempre causa algum impacto aos envolvidos. É
considerada responsabilidade do traidor e o fim do relacionamento pelo seu
caráter negativo e transgressor. Por isso, o objetivo desta investigação é
compreender a percepção e os sentimentos que homens infiéis têm de sua relação oficial
e as motivações para a traição. Trata-se de uma pesquisa qualitativa com
delineamento descritivo. Participaram do estudo cinco homens heterossexuais que
estiveram em união estável e foram infiéis durante este relacionamento.
Utilizou-se uma entrevista semiestruturada para coletar os dados que foram
submetidos posteriormente ao método de análise de conteúdo. Os resultados
apontam que a infidelidade envolve questões individuais, como personalidade,
crenças e transgeracionalidade e, conjugais, como os padrões de interação. Ela
não encerra aquilo de que é porta-voz na relação, pois sua complexidade exige
uma revisão do passado e do presente conjugal.
Palavras-chave: Infidelidade, Casamento, Relações conjugais,
Dinâmica de casal.
Autora: Ligia Oliveira www.terapiacasalefamilia.blogspot.com
David Baucon (2009), terapeuta de casal e pesquisador do
tema Infidelidade, reforça a necessidade de compreensão aos clientes,
quando em Terapia de Casal, trazendo como demanda a traição afetiva, que o
processo terapêutico poderá acontecer dentro de um período mais amplo, vez
que as diversas fases do tratamento precisam ser bem exploradas e
compreendidas.
Segundo Baucon a terapia voltada à compreensão da
infidelidade conjugal pode ser dividida em tres momentos:
1- Fase na qual o casal precisa absorver o impacto da
descoberta. 2- Fase onde se trabalha a elaboração da vivência
traumática: Nesse ciclo o casal vai em busca de sentido para a infidelidade,
estabelecendo novas responsabilidades e propósitos de vida. 3- Fase
da vivência com o casal sobre o significado de levar a vida em frente,
seja pela continuidade da vida conjugal, ou a separação.
Observamos, tanto na teoria quanto na prática clínica, que a
fase da descoberta, caracteriza-se por ser de uma crise intensa, na qual estão
presentes sentimentos e comportamentos que se alternam como: mágoa, raiva,
culpa, surpresa, medo, desejo de vingança...
As emoções são muito fortes como também ambivalentes. Ao
mesmo tempo que se sente raiva, mágoa, pode vir o medo da separação, da
destruição do vínculo afetivo.
Torna-se difícil ao terapeuta caminhar buscando menos
reatividade, defesas, vez que as visões dos cônjuges estão tumultuadas pela
intensa carga afetivo- emocional, pela qual essa primeira fase está
passando.
Prado no seu livro As Múltiplas Faces da Infidelidade
Conjugal (2012), diz o seguinte:
" Em um primeiro momento o terapeuta deve
funcionar como um bombeiro que precisa apagar um incêndio...
Tirar de perto as pessoas que não estão ajudando e trabalhar
para apagar o fogo rapidamente".
É importante que o terapeuta fique atento e administre bem
as sessões, entendendo que muitas delas poderão ser mais longas e
frequentes, por se tratar de um período crítico.
Assim sendo, investe para que as conversas sejam
objetivas e claras como por exemplo: se os parceiro poderão ficar ou não
morando juntos, trabalhar para que o terceiro participante fique fora da
relação afetiva enquanto o processo terapêutico acontecer, serem acordadas
regras de convivência possíveis, objetivando a recriação do clima de confiança
relacional.
Outro fator essencial nessa primeira fase é a compreensão do
desenvolvimento de uma escuta e de um falar respeitoso, atuando o
terapeuta nesse estágio, de forma mais diretiva, fazendo intervenções para que
o casal saia do padrão de falas e atitudes destrutivas, da reatividade e
defensividade.
Poderá haver a necessidade de encaminhamento dos cônjuges,
ou de algum deles, para especialista, quando é avaliada a necessidade de
estratégia medicamentosa.
Existem casos( menos comuns) nos quais o cônjuge infiel não
opta por abandonar a terceira pessoa. Pouquíssimos são os casais que aceitam
essa situação. O terapeuta precisa trabalhar com o parceiro infiel no sentido
de que esse resolva a situação, em um tempo mais breve possível, pois a
situação do segredo será danosa e poderá comprometer a confiança do processo...
Na grande maioria do processo terapêutico, essa
primeira fase da terapia é permeada por ondas de descontrole, que exigem do
profissional postura acolhedora, mas também mais firme, um olhar mais
atento para aprender a administrar atitudes de agressividade,
silêncios, revolta... Após a vivência dos momentos mais conflituosos, quando da
descoberta da infidelidade, e, parte das emoções mais fortes terem sido
exploradas, reconhecidas e compartilhadas, as ações terapêuticas caminham
para um ciclo mais focado na elaboração da situação conjugal.
Nesse período, terapeuta e casal, procuram falar sobre
o contexto conjugal antes da infidelidade acontecer, explorando os
múltiplos fatores e suas interrelações, como ainda reavaliando a compreensão de
cada um acerca da sua contribuição em relação à infidelidade.
É essencial o desenvolvimento de um olhar mais profundo ao
clima relacional, mediante a compreensão de indicadores como conversa
entre os parceiros, intimidade, proximidade afetiva, projetos comuns, vida
individual, companheirismo, respeito...
É necessário a abordagem terapêutica levar os parceiros
a ampliarem o entendimento do sentido da infidelidade, mediante a
compreensão de que a mesma aconteceu na relação. Assim sendo, o
olhar conjugal deverá entender que a infidelidade não é
responsabilidade apenas do parceiro participante.
Dentro dessa ótica, o companheiro magoado
poderá estudar também seus momentos e atitudes que tenham contribuído ao
afastamento conjugal
Em relação ao parceiro infiel, esse deverá falar com clareza
acerca da sua participação, mediante avaliação das suas experiências, valores,
heranças familiares, modelos relacionais.... Esse trajeto poderá trazer à tona,
sentimentos e falas nunca antes revelados tais como: abusos, sentimentos
de abandono, desvalia... os quais poderão auxiliar à leitura do quadro
relacional.
"Quanto ao terceiro parceiro participante, é
importante que o casal tenha uma atitude firme e decidida de procedimento e
estabeleça limites claros em relação a ele, para manter o parceiro afastado...
Quando se mostrar muito insistente pode ser que precise de atitudes mais
drásticas como buscar medidas judiciais, exigir o afastamento, mudar de
bairro..."( Prado, 2012)
Trabalhados os diversos aspectos da infidelidade, a terapia
deverá se encaminhar para a fase do processo de escolha e decisão dos cônjuges:
Se a decisão é separar ou continuar o vínculo conjugal.
Caso a escolha recáia sobre continuarem juntos, deverão
ser conversadas e acordadas as principais mudanças que irão beneficiar o
contexto e vivência da vida a dois.
Sendo a decisão voltada à separação, é função do
terapeuta ajudar aos ex-cônjuges na compreensão
de que também podem andar por esse caminho, de uma forma mais
construtiva.
Lígia Oliveira-
Terapeuta de Casal, Família e Psicanalista.
Autora: Tânia Nogueira
Talvez o desejo de todos parceiros seria o de garantir que o
cônjuge nunca vai traí-lo. Entretanto, a infidelidade é muito comum, mas cada
um de nós (homens e mulheres) acredita que com ele (ela) isto não vai
acontecer.
De modo geral, se pode dizer que infidelidade é a ruptura no
“pacto de confiança mútua” e como tal, gera perplexidade e vem acompanhada de mágoas e ressentimentos. Em nossa cultura, a
fidelidade é valorizada e a infidelidade é vista como falta de respeito e
deslealdade no relacionamento. Entretanto, pode se fazer a seguinte pergunta:
como evitar sentir interesse por outras pessoas fora do ciclo afetivo e sexual,
que envolve o (a) parceiro (a)?
Infidelidade é um tema recorrente em vários blogs, revistas
e pesquisas não científicas, entretanto um levantamento bibliográfico, revela
que são poucas as pesquisas acadêmicas, dissertações e/ou teses sobre este tema
e suas implicações. Algumas destas pesquisas serão apresentadas com o objetivo
de estimular discussões sobre este tema tão polêmico.
Abreu (2006) fala em infidelidades. Essa autora realizou uma
pesquisa sobre as representações femininas e masculinas sobre a
infidelidade. O seu objetivo foi compreender como homens e mulheres
percebem a infidelidade tanto afetiva quanto sexual.
A autora parte do pressuposto que pode haver ou não um
desmoronamento da relação, pois, em alguns casos, a infidelidade aparece como
um jogo estratégico para romper com a monotonia. Ela entrevistou e fez a
análise do discurso de oito mulheres e cinco homens e percebeu que a maior
parte dos casos de infidelidade não significava inabilidade em manter uma
relação, mas a busca de novas emoções. Segundo Abreu, quando não descoberta a
infidelidade, entretanto, pode ser útil na manutenção do relacionamento.
Scabello (2006) pesquisou junto a cinco mulheres traídas, sendo
que uma delas se separou e reconciliou depois com o parceiro. Foram
entrevistados quatro homens, os quais todos se separaram após a descoberta da
traição. O estudo mostrou duas situações: a reconstrução ou a dissolução em
busca de relações prazerosas e o dilaceramento do eu quando se mantem uma
relação em que não há uma ressignificação da imagem de si mesma e da pessoa
amada. O objetivo foi conhecer o significado que homens e mulheres dão à
vivencia de infidelidade e como ressignificam a relação amorosa após os
parceiros serem infiéis.
Scabello (2006) percebeu que as mulheres vivem um misto de
dor e culpa, ficam presas ao ressentimento e desinveste lentamente da figura do
amado, podendo ocorrer manifestações psicossomáticas, sentimentos de menos
valia, impotência, etc. Já os homens desinvestem mais facilmente na figura da
parceira infiel, pois considera questão de honra abandonar a mulher que o
traiu.
Santos (2008) realizou pesquisa com três homens e três
mulheres para verificar a percepção que tinham sobre a infidelidade nas
relações amorosas contemporâneas, investigar os motivos que levavam à traição e
os papeis que homens e mulheres têm na relação amorosa. De modo geral, os dados
apontaram que os homens acreditam que traem mais que as mulheres e estas dizem
que as mulheres traem tanto quanto os homens.
Viegas e Moreira (2013) encontraram resultados semelhantes
aos do senso comum (segundo os próprios autores) de que a infidelidade é
julgada e menos tolerada, tanto quanto maior for o envolvimento e a durabilidade
da relação extra conjugal.
Figueiredo (2013) realizou pesquisa com quatro mulheres
tendo o objetivo de compreender a vivencia das mulheres diante da infidelidade
conjugal e identificar as perdas envolvidas neste processo. A análise mostrou
que se trata de uma vivência que acarreta múltiplas perdas quanto as
expectativas em relação a si mesma, ao relacionamento e ao parceiro, mas pode
ser importante para reflexão, amadurecimento e mudanças Já Costa e Cenci (2014) fizeram um estudo com cinco homens,
heterossexuais e que tinham episódios de infidelidade em seus relacionamentos.
O estudo possibilitou a compreensão de que a infidelidade é um tema complexo e
multifatorial, possui especificidades próprias de algumas culturas, realidades
sociais e características de personalidade dos sujeitos. Zacharais et
al (2011), também, afirmam que a concepção de infidelidade varia de cultura
para cultura.
Os resultados das pesquisas e estudos citados acima não
podem ser generalizados, pois são estudos de casos, entretanto, podem fornecer
importantes contribuições à medida que outros estudos forem sendo realizados,
possibilitando conclusões mais abrangentes. A importância desses estudos está,
também, em gerar reflexão e questionamentos sobre os variados aspectos que
envolvem a relação amorosa e o binômio fidelidade/infidelidade.
Por outro lado, em novembro de 2014, veiculou em diversos
jornais brasileiros a notícia sobre um estudo feito por pesquisadores da
Universidade de Queensland, na Austrália revelando que variações genéticas
podem fazer com que homens e mulheres tenham maior propensão a cometer
adultério.
E, para finalizar, mostra se pertinente citar a seguinte
frase que encerra a reportagem on line em Correio/ O que a Bahia quer
saber: “A infidelidade tem provocado um mistério na comunidade científica, que
busca explicações na biologia evolucionária”.
Referências bibliográficas
ABREU, R. de O. Infidelidades- Representações femininas e
masculinas, 2006. Dissertação (Mestrado Antropologia). Universidade
Federal do Pará, Belém, Pará. Disponível em http://www.ppgcs.ufpa.br/arquivos/dissertacoes/dissertacaoTurma2004-RachelAbreu.pdf.
Acesso em 12 de abril de 2015.
COSTA, C.B.; CENCI, C. M. B. A relação Conjugal diante da
infidelidade: a perspectiva do homem infiel. Pensando fam. Vol.18, no1. Porto
Alegre, jun 2014. Disponível em
pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext… Acesso em 12 de abril de
2015.
FIGUEIREDO, A. C. C. Os lutos da mulher diante da
infidelidade conjugal, 2013. Dissertação (Mestrado em Psicologia Clínica)
Pontifícia Universidade de São Paulo, São Paulo. Disponível em http://www.sapientia.pucsp.br/tde_arquivos/22/TDE-2013-12-12T09:49:54Z-14524/Publico/Ana%20Cristina%20Costa%20Figueiredo.pdf.
Acesso em 12 de abril de 2015.
SANTOS, N. A. Percepções de homens e mulheres sobre a
infidelidade nos relacionamentos contemporâneos, 2008. Trabalho de conclusão de
curso de Psicologia. Universidade do Vale do Itajaí Disponível em http://siaibib01.univali.br/pdf/Natalia%20Alzira%20dos%20Santos.pdf.
Acesso em 12 de abril de 2015
SCABELLO. E. H. Desvendando a dor amorosa da infidelidade
conjugal- Os discursos de homens e mulheres (2006). Dissertação (Mestrado em
Psicologia). Universidade de São Paulo. Ribeirão Preto. São Paulo. Disponível
em www.teses.USP.br/teses/disponíveis/59…/EdilaineHelenaScabello.pd
2006. Acesso em 12 de abril de 2014
VIEGAS, T.; MOREIRA, J. Julgamentos da infidelidade: Um
estudo exploratório de seus determinantes. Estudos de Psicologia 18 (3), julho
setembro, 2013, 411-418. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/epsic/v18n3/01.pdf.
Acesso em 12 de abril de 2015.
ZACHARIAS, D> et al. Um olhar sistêmico sobre a
infidelidade e suas implicações. In: IV Jornada de Pesquisa em Psicologia:
desafios atuais nas práticas da Psicologia, 2011. Disponível em: http://online.unisc.br/acadnet/anais/index.php/jornada_psicologia/article/view/10192.
Acesso em 12 de abril de 2015.
www.correio24horas.com.br/.detalhe/notícia./propensao–a–infidelida…
Da Redação (redacao@correio24horas.com.br)
25/11/2014 20:35:00Atualizado em 25/11/2014 20:38:28
Fonte: artigo publicado na Gazeta Online, 09-03-2014
Especialista em luto e prevenção do suicídio, a psicóloga
Daniela Reis e Silva garante: os casos são bem maiores do que muitos imaginam.
Antes mais comum entre pessoas idosas, ela garante – mesmo sem citar números –
que, no Espírito Santo, a incidência aumentou, nos últimos anos, entre jovens,
na faixa etária entre 18 e 25 anos.
Atendendo a famílias que passaram por esse drama, Daniela
Reis explica que uma pessoa que quer tirar a sua própria vida dá sinais, e que
tanto educadores, na escola, quanto familiares, precisam estar atentos.
A psicóloga deixa claro que trata-se de “mito” o fato de
que quem ameaça se suicidar não cumpre a promessa. Ela defende o fortalecimento
de uma rede multidisciplinar de acompanhamento e de tratamento.
No campo prático, especificamente na Grande Vitória,
defende a implantação de tela ou a grade de proteção no vão central da Terceira
Ponte, para dificultar o acesso ao local, palco de quatro casos de suicídio
somente neste ano. Em entrevista à Rádio CBN, com trechos aqui publicados,
Daniela Reis falou sobre o assunto com a jornalista Fernanda Queiroz.
A senhora defende o uso de qualquer estratégia que possa a vir contribuir para a prevenção de suicídio, inclusive com instalação de grades na Terceira Ponte. Essa medida seria eficaz.
Uma das formas de prevenir o suicídio é justamente reduzir o acesso ao meio. As grades seriam uma barreira física, a exemplo de outros lugares que já adotaram essa medida, como, por exemplo, o Shopping de Brasília, uma faculdade no Rio de Janeiro e algumas construções. No centro de Vitória, um edifício também gradeou suas janelas, impedindo o acesso ao último andar.
E as ocorrências diminuíram?
A senhora defende o uso de qualquer estratégia que possa a vir contribuir para a prevenção de suicídio, inclusive com instalação de grades na Terceira Ponte. Essa medida seria eficaz.
Uma das formas de prevenir o suicídio é justamente reduzir o acesso ao meio. As grades seriam uma barreira física, a exemplo de outros lugares que já adotaram essa medida, como, por exemplo, o Shopping de Brasília, uma faculdade no Rio de Janeiro e algumas construções. No centro de Vitória, um edifício também gradeou suas janelas, impedindo o acesso ao último andar.
E as ocorrências diminuíram?
Sim. A gente precisa atacar todas as frentes possíveis.
Além do acesso aos meios, fornecer tratamento adequado para a população, porque
é comprovado que grande parte das pessoas que tenta se matar, ou que está numa
crise suicida, tem um transtorno psiquiátrico ou faz também uso de álcool e
drogas.
Temos que pensar na saúde mental das pessoas e no acesso
ao tratamento imediato quando a crise é identificada. Nesses momentos as
pessoas estão suspensas do seu estado de consciência habitual, então a gente
precisa eticamente proteger essas pessoas, proteger a vida dessas pessoas, até
que elas possam repensar toda vida, minimizar o sofrimento, encontrar esperança
para poder seguir adiante.
Esse é um tema que é muito difícil de ser tratado, do ponto de vista
jornalístico, porque fala-se que quando se dá divulgação ao ocorrido
estimula-se que o ato seja cometido por outras pessoas. Mas, quando o fato tem
relevância social, precisa ser divulgado. As famílias têm que estar atentas? Há
sinais a serem observados?
O que a gente vê, na prática, é que alguns sinais são conhecidos ao longo do
tempo. Uns, visíveis, outros, não. É preciso uma preparação não só das
famílias, mas dos profissionais da educação, da saúde, para um olhar criterioso
em relação ao comportamento suicida, para que ele seja identificado,
providenciando um tratamento adequado.
Quais são os primeiros sinais?
É difícil, porque eles não aparecem numa ordem cronológica, e nem todas as
pessoas apresentam todos os sinais. Há quem consiga até esconder – em alguns
casos de fato é uma surpresa. Mas, podemos citar a verbalização de muito
sofrimento, de que a pessoa não está aguentando.
Alguns sinais de despedida, de se desfazer de bens,
ameaças veladas, do tipo: “Se você não fizer isso eu vou me matar!”. Não como
uma forma de chantagem, mas como uma expressão do sofrimento. Quadros
depressivos, tristeza, isolamento, em alguns casos a própria agressividade,
podem ser vistos como sinais, mas o que enfatizo é que é um sintoma de um
quadro global, em que você faz a avaliação do risco de uma série de
comportamentos.
Se a pessoa tem acesso aos meios, se a pessoa já
planejou, se ela está só pensando na possibilidade, se já houve alguma
tentativa prévia, tudo isso faz parte dessa avaliação de risco para um suicídio
iminente. O problema é que muitas famílias tentam esconder, sentindo-se
envergonhadas.
Ainda há preconceito de que as pessoas que enfrentam o
suicídio vêm de uma família anormal, disfuncional. Mas, de perto, que família é
normal? Todas enfrentam problemas, e o importante é encontrar a saída para
esses problemas. As pessoas em crise suicida também apresentam uma falta de
esperança, uma visão negativa da vida. São fatores, sinais que contribuem para
a nossa avaliação de risco.
É preciso buscar ajuda.
Sim, buscar ajuda, e mesmo quando essa ajuda aparentemente não é encontrada –
porque existe muita crítica, inclusive ao serviço público, da falta de
atendimento de saúde mental adequado, locais de internação –, quando o risco de
suicídio é eminente, deve-se pedir a internação da pessoa.
Tem que pressionar o poder público para providenciar o
acesso mais adequado a tratamento, inclusive das famílias, que também adoecem.
Ter uma pessoa em crise dentro de casa é muito difícil, porque ocorre uma
modificação da estrutura da rotina familiar muito grande.
Há quem diga que quem ameaça se matar não põe em prática a ameaça.
Não é verdade. Isso é um mito criado socialmente. Às vezes, na emergência,
profissionais de saúde que deveriam acolher a tentativa de uma forma adequada,
chegam a verbalizar isso para a família: “Ah, ela (ou ele) não queria mesmo
morrer...”.
Mas ninguém tem ideia do sofrimento dessa pessoa. Eu
atendo muitas famílias após um suicídio, e uma das coisas que ficam muito
claras é que a pessoa deu sinal, mas, como são sinais isolados, é difícil para
a família perceber. Às vezes a pessoa comenta que tem vontade de se matar, ou
está planejando se matar, fala coisas com o amigo e o amigo não fala com a mãe
ou um outro parente.
Aí, só depois do ocorrido é que as peças desse
quebra-cabeça acabam se juntando. Por isso, é importante divulgar, e aí eu
ressalto a importância do trabalho da mídia. Tudo que é desconhecido, acaba se
tornando mais perigoso.
Como buscar ajuda?
Existe o CVV (Centro de Valorização da Vida), e sei que a rede pública, a
Prefeitura Municipal de Vitória, tem se organizado sobre crise suicida, com
treinamento de alguns profissionais.
Casos de suicídio são mais comuns do que a gente imagina?
Infelizmente, a incidência do suicídio tem aumentado imensamente nos últimos
anos. Antigamente, era maior entre pessoas mais velhas, de terceira idade, mas
tem se tornado umas das principais causas de óbito na população jovem, entre 18
e 25 anos, o que assusta demais. A gente tem inclusive indícios de criança
tentando o suicídio.
Há relação direta com consumo de álcool e outras drogas?
Não existe uma relação direta, porque o suicídio é um fenômeno multifatorial,
envolve uma complexidade de fenômenos: mudanças com a globalização, velocidade
da informação, dificuldade do jovem aprender a esperar, aumento de
impulsividade de maneira geral, aumento no índice de depressão, de ansiedade,
entre outros fatores, incluindo uso de álcool e outras drogas.
Na escola, professores estão preparados para lidar com o problema?
Não. Os profissionais da educação também precisam estar envolvidos para
perceber quando as coisas não estão indo bem, desde a mais tenra idade, mas sem
fazer alarde. É importante a gente possibilitar o cuidado adequado, seja em
caso de algum tipo de ofensa sexual, de violência física, psicológica, que
também são fatores de risco.
Deve-se pensar em prevenção da saúde mental como um todo.
As secretarias de Saúde precisam estar envolvidas nessa questão. O governo do
Estado, prefeituras, também com ações sociais. É responsabilidade de cada um de
nós esse que é considerado um grave problema de saúde pública. Algumas ações no
Brasil já foram tomadas, mas no Espírito Santo ainda estamos engatinhando.
Quem tenta o suicídio uma vez tende a repetir?
Pode ser que em algum momento essa pessoa mude de método, mas uma vez tentado o
suicídio, essa pessoa fica no grupo de risco e pode repetir. Existem várias
pesquisas de que a pessoa pode tentar um ano depois e para o resto da vida estará
no grupo de risco.
Mesmo depois que passa a depressão, que passa a crise, a
situação merece cuidados. Tenho pacientes que, em função de tratamentos
adequados, hoje conseguem dizer que estão livres de riscos, mas o tratamento
demorou 10, 15 anos, utilizando a parte da psiquiatria junto com a
psicoterapia, sem falar no apoio familiar, que faz toda a diferença.
Nem todo mundo demora tanto tempo, e é por isso que cada caso tem que ser
avaliado. Às vezes, a pessoa começa um tratamento psiquiátrico e é observada
uma pequena melhora.
Justamente nessa melhora da medicação é que ela pode ter
mais pragmatismo para tentar contra a própria vida novamente, porque a
depressão deixa a pessoa tão frustrada que ela não consegue fazer nada. E, na
pequena melhora, ela acaba tentando mais uma vez.
E na fase da infância?
Não existe comprovação de que é genético. Uma preocupação das famílias é: “Será
que os filhos vão tentar também, será que isso vai acontecer de novo?”. Não
existe comprovação em relação a isso, e é muito difícil a gente afirmar o que
faz uma criança pensar em acabar com a própria vida.
Teria que conversar com a criança, com a
família, para uma avaliação mais cuidadosa, porque é muito complicado
generalizar todas essas situações. Cada caso é único, cada tentativa é única, e
a gente precisa ter esse olhar criterioso na tentativa de não banalizar essa
situação grave.
CASAMENTO CONTEMPORÂNEO: O DIFÍCIL CONVÍVIO DA INDIVIDUALIDADE COM A CONJUGALIDADE. TEREZINHA FÉRES CARNEIRO
Psicologia: Reflexão e Crítica Print ISSN 0102-7972
Psicol. Reflex. Crit. vol.11 n.2 Porto Alegre 1998
Casamento contemporâneo: o difícil convívio da
individualidade com a conjugalidade
Terezinha Féres-Carneiro2
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Terezinha Féres-Carneiro2
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Resumo
Na discussão sobre casamento contemporâneo várias
questões são desenvolvidas. Ressaltam-se a relevância institucional do
casamento e o papel que ele desempenha para os indivíduos como instrumento de
construção nômica. Descreve-se como o casal contemporâneo é confrontado por
duas forças paradoxais, ou seja, pelas tensões entre individualidade e
conjugalidade. Aborda-se o tema da manifestação da aliança e da sexualidade no
casamento e no recasamento contemporâneo. Discute-se a questão da separação
conjugal e suas conseqüências para os membros do casal e da família.
Descrevem-se as características da família recasada e suas possibilidades de
interação funcional. Enfatiza-se a importância da relação conjugal para o
desenvolvimento emocional dos filhos. E, finalmente, ressalta-se que o
compromisso da terapia de casal não é com a manutenção ou a ruptura do
casamento, mas com a saúde emocional dos membros do casal e da família.
Palavras-chave: casamento, individualidade, conjugalidade, separação,
terapia de casal.
Casamento: a lógica do um e um são três
Costumo dizer que todo fascínio e toda dificuldade de ser
casal, reside no fato de o casal encerrar, ao mesmo tempo, na sua dinâmica,
duas individualidades e uma conjugalidade, ou seja, de o casal conter dois
sujeitos, dois desejos, duas inserções no mundo, duas percepções do mundo, duas
histórias de vida, dois projetos de vida, duas identidades individuais que, na
relação amorosa, convivem com uma conjugalidade, um desejo conjunto, uma
história de vida conjugal, um projeto de vida de casal, uma identidade
conjugal. Como ser dois sendo um? Como ser um sendo dois? Na lógica do
casamento contemporâneo, um e um são três, na expressão de Philippe Caillé
(1991). Para Caillé, cada casal cria seu modelo único de ser casal, que ele
chama de "absoluto do casal", que define a existência conjugal e
determina seus limites. A sua definição de casal, contém portanto os dois
parceiros e seu "modelo único", seu absoluto.
Isto a que Caillé chama de "absoluto do casal" é o
que denomino de "identidade conjugal", e que na literatura sobre
casamento e terapia de casal é designado, de um modo geral, como
conjugalidade.
Casamento: um ato dramático
Berger e Kellner (1970), ao discutirem a relevância
institucional do casamento, ressaltam que, desde Durkheim, é um lugar-comum da
sociologia familiar que o casamento serve como proteção contra a anomia do
indivíduo. Sendo um instrumento de construção nômica, o casamento tem como
função social criar para o indivíduo uma determinada ordem, para que ele possa
experimentar a vida com um certo sentido. Para estes autores, a realidade do
mundo é sustentada através do diálogo com pessoas significativas e o casamento
ocupa um lugar privilegiado entre as relações significativas validadas pelos
adultos na nossa sociedade.
Berger e Kellner (1970) descrevem, então, o casamento como
um ato dramático, no qual dois estranhos, portadores de um passado individual
diferente, se encontram e se redefinem. O drama do ato é internamente
antecipado e socialmente legitimado muito antes de ele acontecer na biografia
dos indivíduos. A reconstrução do mundo no casamento ocorre principalmente
através do discurso. Na conversação conjugal, a realidade subjetiva do mundo é
sustentada pelos parceiros, que confirmam e reconfirmam a realidade objetiva
internalizada por eles. O casal constrói assim, não somente a realidade
presente, mas reconstrói a realidade passada, fabricando uma memória comum que
integra os dois passados individuais.
Casamento: as dimensões de aliança e de sexualidade
Aliança e sexualidade constituem, sem dúvida, duas das mais
importantes dimensões da vida conjugal. Para Levi-Strauss (1968), aliança é uma
das formas de intervenção do grupo sobre bens considerados escassos e
essenciais para sua sobrevivência. Assim, é sempre um sistema de troca que
encontramos na origem das regras do casamento, mesmo daqueles cuja aparente
singularidade poderia justificar interpretações especiais. Levi-Strauss
ressalta que a proibição do incesto não é tanto uma regra que proíba casar com
a mãe, a irmã ou com a filha, mas sobretudo uma regra que obriga a ceder a
outros a mãe, a irmã e a filha. Isto só é feito na esperança de que em outro
lugar, outra pessoa esteja realizando o mesmo "dom". Esta é a base da
reciprocidade, que canaliza para a coesão, forças que poderiam estar
naturalmente destinadas à competição e à desagregação. Assim, a família em
Levi-Strauss é pensada como agente da lei da cultura: organizando-se a partir
da interdição, garante a produção da sociedade humana.
A literatura sobre história da sexualidade aponta para um
fenômeno muito importante e prevalente até o século XVIII no mundo ocidental,
que é a diferença entre o amor no casamento e o amor fora do casamento.
Flandrin (1981) ressalta que o amor esteve presente na literatura ocidental
pelo menos desde o século XII, mas este amor, salvo raras exceções, não é nunca
um amor conjugal. O casamento tem por função - não somente entre os reis e os
príncipes, mas em todos os níveis da sociedade - ligar duas famílias, e
permitir que elas se perpetuem, muito mais do que satisfazer o amor de duas
pessoas. O amor-paixão é essencialmente extra-conjugal. Mas a partir do século
XVIII, este quadro se modifica e as duas formas de amor, tradicionalmente
opostas, são aproximadas. Um novo ideal de casamento vai-se constituindo aos
poucos no Ocidente, em que se impõe aos cônjuges que se amem ou que pareçam se
amar, e que tenham expectativas a respeito do amor. O erotismo extraconjugal
entra no casamento e o amor-paixão é visto como modelo. Hoje ninguém duvida da
dignidade do amor conjugal. A sociedade contemporânea não aceita mais que
alguém possa se casar sem desejo e sem amor.
A relevância do casamento para os indivíduos na sociedade
contemporânea é discutida historicamente por Foucault (1977) que estuda a
articulação do papel da aliança e do papel da sexualidade e suas implicações
institucionais. Foucault formula o conceito de "dispositivos" para
explicar como a aliança e a sexualidade se articulam em aparelhos e
instituições. Para ele, que estuda sobretudo a constituição do modelo burguês
de casamento, a produção da sexualidade está ligada a dispositivos de poder.
Num primeiro momento, a sexualidade fez parte de uma técnica de poder centrada
na aliança, onde ficou estabelecido todo um sistema de casamento, de fixação e
desenvolvimento de parentescos, de transmissão de nomes e bens. Coube a este
dispositivo de aliança ordenar e manter a homeostase do corpo social. Ao mesmo
tempo, se fixou a partir daí, o dispositivo da sexualidade, não mais referido à
lei, mas ao próprio corpo, à qualidade dos prazeres, à própria sexualidade no
seio familiar. Os pais tornam-se, na família, os principais agentes deste
dispositivo, e o sistema de aliança passa então para a ordem da sexualidade. A
função do dispositivo de sexualidade na forma de família permite, segundo
Focault, compreender por que a família , além de manter a homeostase do corpo
social, se tornou lugar obrigatório dos afetos, dos sentimentos, do amor, sendo
também o principal ponto de eclosão da sexualidade.
A partir do atendimento clínico a casais de primeiro
casamento e a casais de casamentos subseqüentes, observei algumas diferenças na
manifestação das dimensões de aliança e de sexualidade nestes dois tipos de
casamento. Com objetivo de investigar, de forma mais sistemática, a
manifestação de tais dimensões, realizei um estudo (Féres-Carneiro, 1987) com
dois grupos não-clínicos, de casais da classe média carioca: 10 casais de
primeiro casamento e 10 casais de casamentos subseqüentes, com idades variando
de 25 a 45 anos, tempo de vida conjugal de 3 a 13 anos e número de filhos
variando de 1 a 4.
Este estudo evidencia algumas diferenças quanto à
manifestação das dimensões de aliança e de sexualidade em casais de primeiro
casamento e em casais recasados. Pudemos ressaltar, em relação a cada um dos
aspectos investigados, as seguintes conclusões: escolha conjugal - no grupo de
primeiro casamento a aliança assume um papel mais significativo do que a
sexualidade, enquanto esta é mais relevante para os recasados; relacionamento
com a família de origem - é freqüente, mais forte e mais valorizado no grupo de
primeiro casamento; relacionamento com os diferentes grupos de amigos - o grupo
de amigos comuns é mais presente e valorizado no primeiro casamento, enquanto
os recasados possuem mais amigos individuais e valorizam que os membros do
casal possam sair às vezes separadamente; renda familiar - as diferenças não
são grandes entre os dois grupos, embora entre os recasados haja mais mulheres
participando da renda familiar, algumas das quais em proporção maior que os
homens; neste grupo os papéis de homem e de mulher aparecem de forma menos
rígida, mesmo assim, a mulher que trabalha fora se sente mais exigida em ambos
os grupos; relacionamento sexual - em ambos os grupos o relacionamento sexual é
considerado muito importante para o casal, mas a sexualidade aparece de forma
mais personalizada e criativa entre os recasados, para os quais são maiores as
demandas e as expectativas em relação à atividade sexual.
Casamento e individualismo: as tensões entre individualidade e
conjugalidade
A constituição e a manutenção do casamento contemporâneo são
muito influenciadas pelos valores do individualismo. Os ideais contemporâneos
de relação conjugal enfatizam mais a autonomia e a satisfação de cada cônjuge
do que os laços de dependência entre eles. Por outro lado, constituir um casal
demanda a criação de uma zona comum de interação, de uma identidade conjugal.
Assim, o casal contemporâneo é confrontado, o tempo todo, por duas forças
paradoxais a que chamei, no título deste artigo de "o difícil convívio da
individualidade com a conjugalidade". Se por um lado, os ideais individualistas
estimulam a autonomia dos cônjuges, enfatizando que o casal deve sustentar o
crescimento e o desenvolvimento de cada um, por outro, surge a necessidade de
vivenciar a conjugalidade, a realidade comum do casal, os desejos e projetos
conjugais.
Singly (1993), ao ressaltar as características
individualistas da família e do casal contemporâneos, enfatiza a importância da
qualidade das relações estabelecidas entre os seus membros. A relação conjugal
vai se manter enquanto for prazeroza e "útil" para os cônjuges.
Valorizar os espaços individuais significa, muitas vezes, fragilizar os espaços
conjugais, assim como fortalecer a conjugalidade demanda, quase sempre, ceder
diante das individualidades.
Singly (1993) afirma que numa sociedade onde o valor de
referência é derivado do "eu", a família é importante, na medida em
que ajuda cada um a constituir-se como indivíduo autônomo. Essa função da
família põe em evidência suas contradições internas: ao mesmo tempo em que os
laços de dependência são necessários, eles são negados. No laço conjugal, assim
como na família, a necessidade de interdependência e a negação desta
necessidade criam tensões internas. É preciso ser "um" em sendo
"dois".
Giddens (1992), ao discutir a transformação da intimidade
nas sociedades ocidentais, ressalta que os ideais do amor romântico,
rela-cionados à liberdade individual e à auto-realização, desligam os
indivíduos das relações sociais e familiares mais amplas, demarcando com mais
clareza a esfera do relacionamento conjugal, que passa a ser assim mais
valorizada e priorizada. Enfatiza que o amor romântico, desde sua origem,
suscita a questão da intimidade e supõe uma comunicação psíquica, um encontro
que tem um caráter reparador. O outro preenche um vazio que o indivíduo, muitas
vezes, sequer reconhece, a relação amorosa se instala, e o indivíduo
fragmentado sente-se inteiro.
Para Giddens (1992), o amor romântico era um amor
tipicamente feminino, pois cabia às mulheres suavizar a natureza rude e
instável do amado, que se mantinha frio e distante até que seu coração fosse
conquistado. Giddens mostra como os homens foram introduzidos, nas
transformações que afetam o casamento e as relações pessoais, pelas mulheres.
Na medida em que, para os homens, o apaixonar-se permaneceu vinculado à idéia
de acesso à mulher, cuja virtude era protegida até o momento em que a união
fosse santificada pelo casamento, o amor romântico era desvinculado da
intimidade e entrava em conflito com as regras da sedução. Os homens ficaram,
assim, especialistas nas técnicas de sedução e conquista e não nas questões de
intimidade.
No casamento contemporâneo, os ideais do amor romântico
tendem a se fragmentar, sobretudo pela pressão da emancipação da mulher e da
autonomia feminina. As categorias de "para sempre e único" do amor
romântico, não prevalecem na conjugalidade contemporânea. Giddens denomina de
"amor confluente" aquele que presume uma igualdade no dar e receber
afeto e se desenvolve a partir da intimidade. Ele conceitua o laço conjugal
como "relacionamento puro" tendo em vista que este só se mantém se
for capaz de proporcionar satisfações a ambos os parceiros.
Simmel (1971) vai apontar para as sérias conseqüências que o
ideal contemporâneo de casamento, onde se deseja o outro por inteiro e pretende-se
penetrar em sua intimidade por completo, pode trazer. Os indivíduos têm que
funcionar como reservatórios inesgotáveis de conteúdos psicológicos latentes e
a satisfação da entrega total pode produzir uma sensação de esvaziamento. Há um
aumento das expectativas, uma extrema idealização do outro e uma superexigência
consigo mesmo, provocando tensão e conflito na relação conjugal, podendo levar
à separação.
Separação conjugal: a dissolução da conjugalidade
O número crescente de separações conjugais na sociedade
contemporânea pode, à primeira vista, parecer um contra-argumento da tese
desenvolvida por Berger e Kellner (1970) à qual me referi anteriormente, de que
o casamento contemporâneo é para os cônjuges a principal área de
auto-realização social e a base dos relacionamentos na esfera privada. Todavia,
na sociedade contemporânea os indivíduos se divorciam não porque o casamento
não é importante, mas porque sua importância é tão grande que os cônjuges não
aceitam que ele não corresponda às suas expectativas. Assim, é justamente a
dificuldade desta exigência que o divórcio reflete e, quase sempre, os
divorciados buscam o recasamento.
Nos Estados Unidos, a literatura recente aponta que a
estimativa de ocorrência de divórcio é de 50% para os que se casam pela
primeira vez, e de 60% para os que se casam pela segunda vez (Gottman, 1974;
Rasmussen e Ferraro, 1991). No Brasil, os últimos números divulgados pelo
Anuário Estatístico Brasileiro editado pelo IBGE em 1996, cujos dados dizem
respeito ao ano de 1994, indicam aproximadamente um divórcio para cada quatro
casamentos.
Na literatura internacional, assim como na literatura
nacional, os estudos sobre separação abordam sobretudo as causas e as
conseqüências do divórcio. Rasmussen e Ferraro (1991) enfatizam que as
pesquisas que estudam o divórcio como um fenômeno independente, e não como um
dano ao casamento, ainda são raras. Estes autores argumentam que o fato de
alguns problemas, como sexo extra-conjugal, excesso de bebida e dificuldades financeiras,
estarem, quase sempre, presentes nos processos de divórcio, não significa que
sejam as causas deste. É importante considerar que o divórcio é um fenômeno
complexo, pluridimensional, que ocorre entre os casais de forma
individual.
Jablonski (1991), em Até que a vida nos separe, livro que
acaba de ser reeditado, aborda a questão do divórcio com originalidade e
bom-humor. Formula o conceito de "fam-ilha", versão contemporânea da
família tradicional, ou seja, uma ilha regida pela ideologia individualista,
onde vigoram concomitantemente demandas paradoxais. A vida a dois é descrita
por ele "quase como impossível", tendo em vista as contradições
presentes no casamento contemporâneo: como conciliar monogamia e
permissividade, permanência e apelo ao novo, vida familiar e realização pessoal
?
Em relação à separação, os dados tanto do judiciário como da
clínica, no Brasil (IBGE, 1996; Féres-Carneiro, 1994,1995), como no exterior
(Rasmussen e Ferraro, 1991; Gottman,1994), indicam que a grande demanda de
separação é feminina. O Anuário Estatístico Brasileiro de 1996 indica que, do
total de separações judiciais não consensuais encerradas em primeira instância,
71% foram requeridas pelas mulheres. Na literatura internacional, tanto nos
Estados Unidos quanto na Europa, encontramos índices semelhantes. Podemos
discutir este dado a partir de uma multiplicidade de considerações. Gostaria,
entretanto, de ressaltar pelo menos uma delas.
Em pesquisa de dissertação de mestrado, Magalhães (1993)
verificou, num grupo de 20 casais da classe média carioca, com idades variando
de 25 a 55 anos, que todas as mulheres por ela entrevistadas, menos uma,
definiram casamento como "relação amorosa", enquanto todos os homens
do grupo, definiram casamento como "constituição de família". Estes
resultados podem explicar, em parte, o fato de a demanda de separação conjugal
apresentar-se como predominantemente feminina. Para as mulheres, quando a
relação conjugal não vai bem, sobretudo na sua vertente amorosa - admiração,
intimidade e relacionamento sexual - a separação conjugal parece inevitável,
tendo em vista que, para elas o casamento é sobretudo "relação de
amor". Para os homens, entretanto, que definem o casamento como
"constituição de família", o fato de a relação amorosa não estar bem
não é suficiente para justificar o fim do casamento. Estes dados são
confirmados também em estudos realizados na clínica com casais (Féres-Carneiro,
1980, 1995).
Caruso (1968), em A separação dos amantes afirma que estudar
a separação amorosa significa estudar a presença da morte na vida. Referindo-se
ao ditado francês partir c’est mourrir un peu ("partir é morrer um
pouco"), ele afirma que na separação há uma sentença de morte recíproca: o
outro morre em vida dentro de mim e eu também morro na consciência do outro.
Ele diferencia a dor vivenciada pelos amantes que se separam subitamente,
daquela que ocorre na separação lenta que se segue ao "distanciamento
mútuo".
Embora o divórcio possa ser, às vezes, a melhor solução para
um casal cujos membros não se consideram capazes de continuar tentando
ultrapassar suas dificuldades, ele é sempre vivenciado como uma situação
extremamente dolorosa e estressante. A separação provoca nos cônjuges
sentimentos de fracasso, impotência e perda, havendo um luto a ser elaborado. O
tempo de elaboração do luto pela separação é quase sempre maior do que aquele
do luto por morte.
São os pais que chegam à decisão de se separarem e, em
geral, os filhos reagem com raiva, medo, tristeza ou culpa. Estes sentimentos
podem se alternar durante semanas ou meses após a separação. O importante, no
processo de divórcio, é deixar os filhos fora do conflito conjugal. Quem se
separa é o par amoroso, o casal conjugal. O casal parental continuará para
sempre com as funções de cuidar, de proteger e de prover as necessidades
materiais e afetivas dos filhos. É muito importante que isto possa ficar claro
para eles. Costumo afirmar que o pior conflito que os filhos podem vivenciar,
na situação de separação dos pais, é o conflito de lealdade exclusiva quando
exigida por um ou por ambos os pais. A capacidade da criança e do adolescente
de lidar com a crise que a separação deflagra vai depender sobretudo da relação
que se estabelece entre os pais e da capacidade destes de distinguir, com
clareza, a função conjugal da função parental, podendo assim transmitir aos
filhos a certeza de que as funções parentais de amor e de cuidado serão sempre
mantidas.
Apesar da dor da perda que toda separação provoca, é
importante ressaltar que os filhos, quase sempre, são mais capazes de enfrentar
a separação dos pais do que estes podem imaginar. Os pais tendem, em geral, a
fragilizar a capacidade dos filhos para lidar com a separação, projetando neles
um mundo que não é vivido por eles. Muitas vezes, entre os colegas de colégio e
os amigos, com os quais aprenderam a respeito da separação dos pais, as
crianças se identificam e encontram apoio e compreensão.
A separação conjugal pode ter efeitos construtivos para os
membros de uma família, sobretudo quando o preço para manter o casamento é a
autodestruição e a destruição do outro. Quer os pais estejam casados ou
separados, o mais importante para o desenvolvimento emocional dos filhos é a
qualidade da relação que se estabelece entre os membros do casal e entre estes
e os filhos.
É sempre importante enfatizar a relevância da relação
conjugal para o desenvolvimento emocional dos filhos. Costumo afirmar que, na
grande maioria dos casos em que crianças apresentam problemas emocionais, é
suficiente tratar os pais para que haja remissão dos sintomas infantis. Em
Féres-Carneiro (1980), investiguei a relação entre problemas apresentados por
crianças e dificuldades existentes nas relações estabelecidas por seus pais.
Esta investigação relata a experiência clínica no tratamento de oito casais,
durante um período de dois anos, cujo tempo de atendimento variou de três meses
a um ano e oito meses. A análise dos dados clínicos mostrou que embora, em
cinco dos oito casos, os pais tenham buscado atendimento para um filho que
apresentava problemas, estes eram uma conseqüência das perturbações e dos
conflitos existentes na relação do casal. Em apenas dois dos oito casos, os
filhos precisaram ser vistos em sessões de avaliação familiar, e em apenas um caso,
um filho precisou ser posteriormente encaminhado para psicoterapia. Destes oito
casos estudados, cinco casais se mantiveram casados e três se separaram.
A separação leva toda a família a reestruturar os padrões de
relacionamento vigentes. Há um período de transição até que se atinja um novo
patamar de organização. Alguns efeitos do divórcio aparecem rapidamente, outros
aumentam durante o primeiro ano para depois irem desaparecendo, e outros ainda
demoram até dois anos para emergir.
Alguns estudos mostram que o desequilíbrio do sistema
familiar na situação de divórcio tende a começar um ano antes da separação e,
geralmente, depois de dois anos para a maioria, e até no máximo seis anos para
todas, as famílias voltam a estabelecer um funcionamento satisfatório para seus
membros.
Mas, os divorciados, como dissemos anteriormente, em geral,
caminham para o recasamento. Os homens mais rapidamente que as mulheres.
Recasamento: a reconstrução da conjugalidade
A tendência de considerar as famílias separadas ou as
famílias recasadas como disfuncionais deve, sem dúvida, ser questionada. Muitas
vezes a literatura enfatiza a dimensão disfuncional, na separação e no
recasamento, e busca as patologias associadas a estas situações. É importante ressaltar
que estes núcleos familiares são tão capazes de promover saúde quanto as
famílias de primeiro casamento. Em Costa, Penso e Féres-Carneiro (1992)
enfatizamos que a competência das famílias não depende do fato de serem
casadas, separadas ou recasadas, mas da qualidade das relações estabelecidas
entre seus membros. Bucher e Rodrigues (1990) discutem as características das
famílias reconstituídas, enfatizando a possibilidade de interação funcional e
ressaltando as questões de linguagem.
A família recasada tem características próprias, e é
importante não tomá-la como a família nuclear recriada. Na família recasada os
limites dos subsistemas familiares são mais permeáveis, a autoridade paterna e
materna é dividida com outros membros da família, assim como os encargos
financeiros. Há uma complexidade maior na constituição familiar: às vezes oito
avós, irmãos, meio-irmãos, filhos da mulher do pai, filhos do marido da mãe. É
preciso muita flexibilidade e originalidade para lidar com tudo isso. E é importante
não interpretar a complexidade das relações que se estabelecem nestas famílias
como disfuncionalidade.
Pesquisas brasileiras realizadas por diversos autores
(Féres-Carneiro, 1987; Woods, 1987; Penso, 1989; Wagner, Falbe, & Meza,
1997) enfatizam a possibilidade de promover saúde das famílias recasadas, não
evidenciando diferenças significativas entre famílias de primeiro casamento e
famílias reconstituídas, em relação a diferentes variáveis relacionadas ao
desenvolvimento emocional da criança e do adolescente e à dinâmica das relações
familiares. Porque querem se separar, porque já estão se separando com um
processo em andamento no judiciário, porque têm medo de se separar, porque não
querem se separar de maneira nenhuma, os casais muitas vezes buscam
terapia.
Terapia de casal: ruptura ou manutenção do casamento ?
O compromisso da terapia é com a promoção da saúde emocional
dos membros do casal e não com a manutenção ou a ruptura do casamento. Em
pesquisa realizada a partir do atendimento, ao longo de três anos, de 16 casais
em terapia, procurei verificar as relações existentes entre a vivência da
individualidade e da conjugalidade, os diferentes tipos de escolha amorosa e a
ruptura ou não do casamento. (Féres-Carneiro, 1995)
O estudo da escolha amorosa, nesta investigação, foi
norteado pelo conceito de colusão, desenvolvido por Willi (1975), e descrito
como um jogo conjunto, não confessado entre os parceiros, que se estabelece em
função de um conflito similar não superado. Os cônjuges se unem por supostos
comuns, quase sempre inconscientes, e com a expectativa de que o parceiro o
liberte de seu conflito. A colusão seria uma matriz interacional, que organiza
a vida amorosa do casal. No jogo colusivo, há uma troca de estratos, de características
latentes ou manifestas da personalidade dos cônjuges. Estes estratos são
facetas de uma mesma temática comum, que se arranja de forma
complementar.
Os tipos de colusão, propostos por Willi (1975), cujos temas
estão relacionados à teoria psicanalítica do desenvolvimento são: colusão
narcísica, oral, sádico-anal e fálico-edípica. Para Willi, estes quatro tipos
de colusão são quatro princípios dinâmicos fundamentais e, como tais, não
formam unidades de patologia. Todo casamento pode, portanto, ser afetado pelos
quatro temas, ou seja, pelo tema do "amor como ser um mesmo" (colusão
narcísica), "amor como preocupar-se um com o outro" (colusão oral),
"amor como pertencer um ao outro" (colusão sádico-anal), e "amor
como afirmação masculina" (colusão fálico-edípica). Mas embora os quatro
temas possam afetar o casamento, o acento do conflito conjugal, quase sempre,
se apresenta sob a forma de um destes tipos de colusão.
As análises daquele estudo não evidenciaram uma relação
significativa entre a separação conjugal e a presença maior ou menor da
dimensão de individualidade na interação, nem tampouco entre separação e os
tipos predominantes de colusão amorosa encontrados. Dos 16 casais estudados,
dez se mantiveram casados e seis se separaram. Os resultados mostraram que a
manutenção ou a ruptura do casamento, ao longo do processo terapêutico, estava
significativamente relacionada com o modo como as dimensões de individualidade
e conjugalidade puderam se transformar, levando o casal a efetuar mudanças no
jogo interacional conjunto, em busca de maiores espaços de crescimento. Foi
possível observar ainda uma maior possibilidade das mulheres de realizarem
mudanças e também uma maior possibilidade destas de romperem o casamento, o que
ocorreu na maioria dos casos em que houve separação conjugal.
Os conflitos conjugais e suas conseqüências, quer para a
dissolução do casal, quer para a manutenção de um equilíbrio insatisfatório,
quer para a possível resolução dos problemas, são estudados por Dicks (1967) a
partir de uma perspectiva psicanalítica. Para ele, há três grandes áreas em que
os membros do casal se relacionam um com o outro. A primeira diz respeito às
expectativas mútuas, conscientes, quanto àquilo que o relacionamento conjugal
deve prover; a segunda refere-se à extensão em que tais expectativas permitem a
integração do casal ao seu meio cultural; e a terceira está relacionada à
ativação inconsciente de relações patogênicas passadas, internalizadas por cada
cônjuge, levando à complementariedade de papéis que se estabelece entre eles.
Para Dicks, os casais estabelecem uma formação de compromisso entre suas
relações objetais inconscientes, que na maior parte das vezes estão em conflito
com seus desejos conscientes e suas expectativas mútuas.
Ao discutir a organização inconsciente do casal, Eiguer
(1984) fala de um mundo compartilhado onde os parceiros intercambiam objetos
inconscientes, e define o vínculo como uma superposição de duas relações de
objeto que têm como modelo de identificação a representação da interação do
casal parental.
Para Lemaire (1988), o casal se constitui em torno das zonas
mal definidas do "eu" de cada cônjuge. Assim, na relação amorosa, os
sujeitos misturam suas fronteiras e, muitas vezes, a terapia de casal é um meio
privilegiado para o tratamento de sujeitos mal individualizados.
Nicolló (1988), ao abordar o "jogo" recíproco que
se estabelece entre os membros do casal, faz alusão aos fenômenos que Winnicott
(1971) define como transicionais. O espaço interno do casal é semelhante ao
espaço transicional, pois nasce do encontro entre os mundos externo e interno
dos parceiros. Trata-se de um espaço misterioso, de oscilação contínua, em que
cada cônjuge é uma "extensão do outro", mas ao mesmo tempo é "diferenciado
do outro".
Uma certa fusionalidade faz parte da vida "normal"
e adulta, como observa Nicolló (1988). O próprio Freud , em "O mal estar
na civilização" (1930), ressalta que no auge da paixão, os limites entre o
ego e o objeto ficam ameaçados de dissolução, os apaixonados regridem ao
narcisismo ilimitado e vivenciam o sentimento oceânico de serem um só. A vida
psíquica deve permitir a presença concomitante da capacidade de viver a fusão e
da capacidade de poder se diferenciar do outro.
Enquanto o apaixonamento produz a ilusão da fusionalidade,
Ruffiot (1981) refere-se ao desapaixonamento como uma repetição da loucura
amorosa no sentido inverso, denominado por ele de "paixão do desamor"
que demanda um intenso trabalho psíquico.
Vilhena (1991) ressalta que a separação, mais do que uma
ferida no narcisismo do sujeito, afeta dolorosamente toda sua objetalidade e
coloca em risco sua própria identidade. Ao referir-se à elaboração do luto de
uma separação conjugal, ela enfatiza a questão da "capacidade de ficar
só" dos sujeitos, distinguindo diferentes formas de solidão. A solidão
pode representar uma possibilidade de ficar consigo mesmo ou uma incapacidade
de tolerar a indiferença do outro, manifestando-se tanto no isolamento
voluntário como na busca compulsiva de companhia.
Para concluir, gostaria de citar um poema de Dolores Duran
encontrado, após sua morte, juntamente com um bilhete solicitando a Carlos Lyra
que compusesse a música. Dolores, com seu talento e sobretudo com sua
sensibilidade aguçada pela capacidade de amar e de sofrer, descreve com beleza
e emoção, amores saudáveis, amores alcóolicos, amores neuróticos – sádicos,
masoquistas, deprimidos – amores perversos. Todos amores.
Amar é sofrer
Tem gente que ama que vive brigando,
E depois que briga acaba voltando.
Tem gente que canta porque está amando,
Quem não tem amor leva a vida esperando,
Uns andam para a frente e nunca se esquecem,
Mas são tão pouquinhos que nem aparecem.
Tem uns que são fracos e dão pra beber,
Outros fazem samba e adoram sofrer.
Tem apaixonado que faz serenata,
Tem amor de raça e amor vira-lata.
Amor com champagne amor com cachaça,
Amor nos iates nos bancos de praça.
Tem homem que briga pela bem amada,
Tem mulher maluca que adora pancada.
Tem quem ama tanto que até enlouquece,
Tem quem dê a vida por quem não merece.
Amores à vista, amores a prazo,
Amor ciumento que só cria caso.
Tem gente que jura sabendo que não é capaz.
Tem gente que escreve até poesia
E rima saudade com hipocrisia.
Tem assunto à beça para a gente falar,
Mas não interessa o negócio é amar.
(Dolores Duran, 1959)
Tem gente que ama que vive brigando,
E depois que briga acaba voltando.
Tem gente que canta porque está amando,
Quem não tem amor leva a vida esperando,
Uns andam para a frente e nunca se esquecem,
Mas são tão pouquinhos que nem aparecem.
Tem uns que são fracos e dão pra beber,
Outros fazem samba e adoram sofrer.
Tem apaixonado que faz serenata,
Tem amor de raça e amor vira-lata.
Amor com champagne amor com cachaça,
Amor nos iates nos bancos de praça.
Tem homem que briga pela bem amada,
Tem mulher maluca que adora pancada.
Tem quem ama tanto que até enlouquece,
Tem quem dê a vida por quem não merece.
Amores à vista, amores a prazo,
Amor ciumento que só cria caso.
Tem gente que jura sabendo que não é capaz.
Tem gente que escreve até poesia
E rima saudade com hipocrisia.
Tem assunto à beça para a gente falar,
Mas não interessa o negócio é amar.
(Dolores Duran, 1959)
Referências
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* Aula Magistral proferida em 25/05/98 por ocasião da posse da autora como Professora Titular da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.
* Endereço para correspondência: Rua Gen. Góes Monteiro, 8, Bl. D, ap. 2403. 22290-080. Rio de Janeiro, R
BREVE HISTÓRICO SOBRE A TERAPIA FAMILIAR
Fonte: http://www.terapiacasalefamilia.blogspot.com
Padrão de comportamento familiar-Abertura /fechamento à mudança;
Heranças familiares e suas influências : Proximidade e diferenciação, sentimento de pertencer à família através dos seus valores e aprendizados, mas também se trabalhar em busca de um sentido de autoria própria: autonomia.
obs- Os ítens acima são frutos da minha prática clínica, podendo, dependendo da singularidade de cada caso, serem complementados, modificados...
Antes de começar os resumos das várias abordagens em Terapia Familiar avalio como importante falar acerca desse meu trabalho.
Sei que é essencial um olhar mais aprofundado acerca desse tema, a todos os profissionais que vivenciam a Terapia Familiar. Todavia, sinto, em algumas situações, a vontade de rever, conceitos, experiências, interações, trocas, avanços, relatos de casos, de forma mais breve, das diversas escolas de Terapia Familiar Sistêmica.
Desenvolver esse olhar mais integrativo e poder, sistemicamente, nos "apropriar" desses conteúdos teóricos e práticos, poderá muito nos auxiliar tanto no nosso ser pessoa, como no nosso fazer profissional.
É dentro desse olhar que desenvolvo esse trabalho.
obs: Os referidos resumos têm como base de estudo o livro (o qual recomendo para aprofundamento) Terapia Familiar, Conceitos e Métodos de Michael P.Nichols e Richard C. Schwartz,7 ed. Porto Alegre: Artmed,2007
Em cada resumo identifico o número do capítulo do referido livro.
TERAPIA FAMILIAR E DE CASAL- Breve histórico
A Terapia Familiar teve seu início na década de 1950. Muitos foram os seus colaboradores, dos quais podemos citar Gregory Bateson e Nathan Ackerman, os quais aparecem como pioneiros nos Estados Unidos.
Já nesse período, a T. F.( Terapia Familiar) tinha a compreensão da família dentro de uma abordagem na qual o grupo familiar era estudado como um grande sistema.
Mais na frente, de 1960 a 1970, mediante o desenvolvimento da T.F. a mesma assumiu várias modalidades de nomes, de acordo com as suas mais diversas escolas, dentre as quais destaco: Sistêmica, Estrutural, Estratégica, Boweniana, Experencial. Esses modelos, juntos, rejeitavam o modelo psicanalítico e se uniram em torno do modelo sistêmico.
Aos poucos, a abertura e o desenvolvimento da T.F. proporcionaram a integração de várias correntes tais como a T.F. Psicanalítica, Cognitivo Comportamental, Narrativa, Focada na Solução, como ainda modelos integrativos.
Muitos são os estudiosos da T.F. dentre os quais podemos citar: Bateson, Ackerman, Salvador Minuchin, Jay Haley, Virgínia Satir, Murray Bowen, Tom Andersen, Monica McGoldrick, Harlene Anderson...
No Brasil podemos ressaltar como grandes nomes da T.F. dentre outros: Marilene Grandesso, Maria José Esteves, Terezinha Féres, Rosa Macedo, Sandra Fedulo, Roberto Faustino( Recife), Rosana Rapizzo, Luiz Carlos Prado...
Antes da T.F. a pessoa era vista como o foco principal do problema, e, o objetivo central terapêutico recaía sobre o "portador" do problema, ou seja o"paciente identificado".
Atualmente, uma dificuldade apresentada por um "filho problemático", faz o processo terapêutico buscar também como alvo de estudo o seu contexto relacional, e suas influências recíprocas, ou seja a circularidade das influências familiares no indivíduo e da pessoa no sistema familiar .
Entendemos que o sistema familiar vivencia interações que vão repercurtir no seu desempenho, tanto no seu ambiente interno como externo. Asim sendo, como já mencionada anteriormente, vemos a compreensão da circularidade como um dos principais pilares da T.F. Estuda-se, atenciosamente, as sequências interacionais dos familiares, para um olhar mais aprofundado acerca dos fatores que estão "segurando"o padrão comportamental familiar.
Sabe-se que todo sistema faz parte de um sistema maior, por esse motivo, a necessidade de se relacionar a família, observando-se sua rede de subsistemas, mediante a leitura de contextos mais amplos, ou seja: indivíduo, grupo, comunidade, sistema de crenças, cultural, político...
A família é compreendida como um sistema aberto, e, dependendo de como "administra" suas relações, poderá "trabalhar" para diante de um desafio, problema, continuar na sua zona de conforto e não propiciar a mudança, ficando na homeostase. Pode também "trabalhar" no favorecimento da mudança buscando condições de superação e novos significados.
É importante ressaltar que a T.F. dos dias atuais, tem seus paradigmas baseados na Ciência Pós Moderna e se apóia nos seguintes conceitos:
Complexidade- Não existe só uma realidade: base no multiverso;há diferentes olhares, múltiplos significados acerca de um mesmo fato.
A T.F procura facilitar a compreensão desses saberes, investindo em uma leitura ampliada da realidade;
A T.F procura facilitar a compreensão desses saberes, investindo em uma leitura ampliada da realidade;
Imprevisibilidade -Compreender que as imprevisibilidades existem, pois muitos fatos não estão sob o nosso controle;
Intersubjetividade- Influências recíprocas entre o observador e a realidade observada: negação da neutralidade.Ou seja, enquanto participante do processo terapêutico, o terapeuta, também, coloca nesse percurso suas vivências.
obs- Aos que quiserem aprofundar o assunto, sugiro a leitura do livro Terapia Familiar Sistêmica- Bases Cibernéticas- Maria José Esteves, 1995.
A Teoria Sistêmica nos ensina a olhar como a vida das pessoas é moldada pelas interações tanto com seus familiares como pelos contextos nos quais estão inseridos.
O contexto familiar é compreendido de forma menos objetiva, mais complexa, na qual se vai em busca dos diversos significados dos membro familiares e da família como um todo.
O terapeuta familiar deverá atuar como um facilitador, ajudando nesse processo de curar feridas e também de mobilizar talentos e recursos.
Para tal é preciso que ao trabalhar no processo terapêutico familiar, o terapeuta possa se aprofundar nos seguintes pontos significativos:
Contexto relacional;
Circularidade dos comportamentos: individual e familiar,emocional,afetivo, cognitivo...
Padrão de comportamento familiar-Abertura /fechamento à mudança;
Estrutura familiar: subsistemas, fronteiras, triângulos,alianças, coalizões, hierarquia, papéis;
Heranças familiares e suas influências : Proximidade e diferenciação, sentimento de pertencer à família através dos seus valores e aprendizados, mas também se trabalhar em busca de um sentido de autoria própria: autonomia.
Esse olhar familiar é transgeracional focando a família de origem e a família nuclear.Muitas vezes, trabalhamos com a compreensão de tres gerações.
Processos dc Comunicação;
Crenças, valores, significados;
Ciclos de vida familiar;
Função do sintoma na familia;
obs- Os ítens acima são frutos da minha prática clínica, podendo, dependendo da singularidade de cada caso, serem complementados, modificados...
O terapeuta familiar sistêmico procura desenvolver uma epistemologia voltada à atenção de como evolui na sua forma de conhecer, atuar, mediante a observação atenta dos seus valores, sua visão de mundo, e a forma através da qual faz a integração desses fatores ao contexto terapêutico.
Seu olhar é, continuadamente, voltado ao contextual, ao relacional, sem esquecer também o valor do fator individual em cada sistema familiar, refletindo o terapeuta, que ao mesmo tempo que é parte integrante do sistema, haverá momentos nos quais precisará desse sistema tomar uma cautelosa distância.
Contextualizando uma visão pós- moderna, sistêmico- si - cibernética, dentro do conceito da Terapia familiar , 1980, ( Maria José Esteves) é importante reforçar os seguintes pontos:
Entender que a família é um sistema aberto e que o terapeuta não estar a serviço de reparar ou consertar a disfunção. Importante o trabalho cooperativo entre família e terapeuta voltando o olhar à família também como recurso e não só dificuldade.
A intersubjetividade do terapeuta deverá ser compreendida e incluída no contexto do sistema: o terapeuta deverá, ao mesmo tempo que faz parte do sistema, dele tomar distância para refletir conteúdos que são seus e das famílias.
Sabendo que não existe apenas uma realidade, o terapeuta precisa estar consciente das suas ideias que tem acerca das patologias, estruturas disfuncionais, seus preconceitos, das suas demandas, para que colocando tudo isso em parênteses, possa estar aberto para visões alternativas.
Essencial que o terapeuta aja como facilitador da autonomia do cliente, vez que ele tem a função de "arquiteto do dialogo", que incentiva condições e facilita a abertura para a criação do espaço dialógico.
O terapeuta deverá compreender que adotar o pensamento circular não significa anular o pensamento linear, que faz parte da sobrevivência de todos nós. Importante é focalizar idéias, sentimentos e ações,compreendendo como esses se entrelaçam e contribuem ao sentido de autoria das famílias, olhando também as condições de interdependência dessas situações.
Fundamental ao terapeuta pós moderno é investir, continuadamente, no exercício de aprender sobre terapia familiar, aprender como fazer terapia familiar e aprender como ser um terapeuta de família.
Contextualizando uma visão pós- moderna, sistêmico- si - cibernética, dentro do conceito da Terapia familiar , 1980, ( Maria José Esteves) é importante reforçar os seguintes pontos:
Entender que a família é um sistema aberto e que o terapeuta não estar a serviço de reparar ou consertar a disfunção. Importante o trabalho cooperativo entre família e terapeuta voltando o olhar à família também como recurso e não só dificuldade.
A intersubjetividade do terapeuta deverá ser compreendida e incluída no contexto do sistema: o terapeuta deverá, ao mesmo tempo que faz parte do sistema, dele tomar distância para refletir conteúdos que são seus e das famílias.
Sabendo que não existe apenas uma realidade, o terapeuta precisa estar consciente das suas ideias que tem acerca das patologias, estruturas disfuncionais, seus preconceitos, das suas demandas, para que colocando tudo isso em parênteses, possa estar aberto para visões alternativas.
Essencial que o terapeuta aja como facilitador da autonomia do cliente, vez que ele tem a função de "arquiteto do dialogo", que incentiva condições e facilita a abertura para a criação do espaço dialógico.
O terapeuta deverá compreender que adotar o pensamento circular não significa anular o pensamento linear, que faz parte da sobrevivência de todos nós. Importante é focalizar idéias, sentimentos e ações,compreendendo como esses se entrelaçam e contribuem ao sentido de autoria das famílias, olhando também as condições de interdependência dessas situações.
Fundamental ao terapeuta pós moderno é investir, continuadamente, no exercício de aprender sobre terapia familiar, aprender como fazer terapia familiar e aprender como ser um terapeuta de família.
Termino esse breve resumo citando Maria José Esteves na sua fala sobre a atuação do terapeuta familiar:
"Trabalhando adequadamente as reações que a família provoca nele, o terapeuta familiar, terá em mãos mais um poderoso fator de mudança da família em si próprio."
Lígia Oliveira - Resumo dos livros acima citados.
Lígia Oliveira- Terapeuta de família/casal e psicanalista, Recife, 2011.
Lígia Oliveira - Resumo dos livros acima citados.
Lígia Oliveira- Terapeuta de família/casal e psicanalista, Recife, 2011.